Essa semana, o Instituto Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais, publicou um artigo a respeito da priorização territorial na vacinação da COVID-19. Segundo o Pólis, o planejamento da imunização e as ações de vigilância e controle epidemiológico não podem ignorar as desigualdades da pandemia sobre a população.
O artigo apresenta dados, feitos em análises territoriais da pandemia de coronavírus no município de São Paulo, que mostram quais áreas da cidade registram as maiores taxas de óbitos e hospitalizações por Covid-19 de pessoas com menos de 60 anos, no período de março de 2020 até março de 2021.
“Identificar as regiões das cidades onde o vírus mais circula e onde ele mais faz vítimas constitui uma leitura central no combate à Covid-19, porque aponta quais as áreas mais atingidas pela pandemia e que, portanto, deveriam ser priorizadas em um processo de vacinação. Vale lembrar que a vacinação só tem sentido como estratégia de proteção populacional se ela tiver escala demográfica. Imunizar poucas pessoas de forma esparsa no tempo e no espaço não garante a cobertura vacinal necessária para conter uma pandemia como esta”, diz Instituto Pólis.
Os dados apontam que as áreas à margem da região central da cidade possuem menor índice de vacinação para a primeira dose, sendo 8% a 18% das pessoas vacinadas. Áreas do distrito Jd. Ângela, por exemplo, possuem o GeoSES – índice socioeconômico para estudos em saúde – de -1; esta área tem a segunda menor cobertura vacinal na cidade, com 8,5% e 3,1% nas 1ª e 2ª doses, respectivamente. “A correlação entre cobertura vacinal e índice socioeconômico é alta e confirma como o atual processo de imunização reforça as desigualdades colocadas no território da cidade.”
Analisando as regiões com maior número de óbitos contra COVID-19 e o mapa de vacinados contra o vírus, percebe-se que a cobertura vacinal está desproporcional no território, como as maiores taxas de imunização se concentram justamente nas áreas menos impactadas – com menor concentração de óbitos. O estudo apresenta como explicação para essa desigualdade o fato da população de áreas com maior renda e melhores condições gerais de vida tem um perfil etário mais idoso, fazendo com que a adoção do critério por idade concentre mais doses nessas áreas; assim como o perfil dos trabalhadores da saúde que compõem o primeiro grupo prioritário é composto em sua maioria por pessoas brancas, de maior poder aquisitivos e maior nível de escolaridade.
O estudo ainda diz que o acesso à saúde é menor para a população de menor renda e baixa escolaridade (maior concentração da população negra paulistana). “O menor acesso à saúde se reflete, dentre outras formas, na facilidade (ou dificuldade) de acesso a imunizantes. A não ser que sejam planejadas campanhas especiais ou forças-tarefa dedicadas a grupos específicos, as desigualdades no acesso à saúde tendem a reforçar as desvantagens que afetam a proteção em relação ao novo coronavírus. Ao mesmo tempo, a maioria dos pontos de vacinação criados para o reforço da vacinação (além dos postos tradicionais) na cidade de São Paulo foram Drive Thru, destinados às pessoas motorizadas e em bairros de classe média”, analisa o Instituto.
População Negra e a Subnotificação
Desde os primeiros meses de pandemia, a população negra registra maiores taxas de mortalidade, formando o grupo mais impactado pelos óbitos da Covid-19 na cidade de São Paulo. O estudo também faz uma análise racial quanto a vacinação, segundo ele, os principais focos de mortes por Covid-19 estão nas áreas onde também se concentra a maioria da população negra e onde há maior índice de óbitos pela doença. “O dado racial da população vacinada no Município de São Paulo não permite análises seguras quanto à cobertura vacinal, uma vez que 61% das pessoas que receberam o imunizante não tiveram o campo raça/cor preenchido. Essa subnotificação impede leituras racializadas sobre a imunização na cidade, porém a espacialização da população vacinada mostra que a aplicação de primeira e segunda dose é menor nos bairros onde vive a população negra e a população mais pobre. Essa leitura cruzada confirma que a extensão da imunização é discrepante no território e também muito desigual entre diferentes raças e níveis de rendimento.”
“Conter a transmissão e reduzir as mortes implica uma ação estratégica focada nos grupos mais afetados pela pandemia. Neste sentido, o planejamento da vacinação deveria tomar como prioridade os territórios onde há sobremortalidade da população preta e parda, assim como as áreas que anotam alta concentração de óbitos pela pandemia”, disse o Pólis.
O estudo ainda aponta que 61% das pessoas vacinadas (com 1ª ou 2ª dose) não tiveram sua raça/cor da pele informada. Segundo eles, a espacialização da subnotificação de raça/cor demonstra que a informação tem menor preenchimento, chegando a 93%, em áreas com maior padrão de renda, onde a população é majoritariamente branca; e um maior preenchimento em regiões periféricas. “O direcionamento da vacinação para pessoas de menos de 60 anos, portanto, deveria priorizar (paralelamente aos grupos etários e portadores de comorbidades) regiões como Jd. Ângela, Grajaú, Cidade Ademar (na zona sul), Brasilândia, Cachoeirinha, Tremembé e Vila Medeiros (zona norte), Sapopemba, Itaquera, Vila Curuçá, São Miguel e Jd. Helena (zona leste), República, Pari e Santa Cecília (região central)”, finaliza o estudo.
0 Replies to “Estudo aponta que população negra e periférica é a mais afetada pela má distribuição de vacinas em São Paulo”