“Um dia sem aula é um dia sem se alimentar bem, sem comer”, diz professora da Maré

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Neste dia 6 de agosto é comemorado o dia nacional dos profissionais da educação. O Notícia Preta entrevistou a pedagoga Viviane Rolemberg que trabalha no projeto Uerê, uma Organização Não Governamental do Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. A metodologia de ensino da instituição foi desenvolvida para “crianças periféricas com traumas e bloqueios devido à violência“.

Viviane, que gosta de ler Bell Hooks, falou sobre os desafios de trabalhar com educação em um cenário crítico e sobre o impacto no desenvolvimento de crianças expostas a violência. De acordo com ela, muitos pais e mães tem a escola como uma rede de apoio, e as interrupções e dias sem aula atrapalham o desenvolvimento dessas crianças. Para ela este cenário vivido por crianças periféricas expostas a traumas, gera “um bloqueio cognitivo”.

“Faz com que elas tenham mais dificuldade para processar todas as informações, gerando trauma e descaso. Sem falar que muitas famílias são afetadas, porque dependem da refeição escolar, um dia sem aula é um dia sem se alimentar bem, sem ter o que comer”, afirmou a especialista.

De acordo com um levantamento da Casa Fluminense, somente em 2023, até o momento, 16 operações policiais foram feitas no Complexo da Maré. Na última operação no início de julho, mais de 7 mil alunos ficaram sem aulas e 20 unidades escolares foram impactadas.

Viviane é nascida e criada na periferia e o que a motivou a ser professora foi o fato de sempre ter gostado de estudar, ler histórias em quadrinhos e brincar de escolinha. Conforme foi crescendo passou a entender a importância do educador na vida de uma criança que, segundo ela, não é só ensinar, é ser referência. É também de alguma forma, contribuir para as mudanças das relações sociais.

“Hoje, como pedagoga formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pós graduanda em Ensino de História da África pelo Colégio Pedro II, acredito que educar seja um dos pilares que me mantenha motivada a estar na profissão e influenciando na vida de alunos”, disse ela.

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“O UERÊ protege contra o abandono, violência ou exploração pelo trabalho”, diz mensagem escrita no muro do projeto – Foto retirada do site oficial: Projeto UERÊ

A pedagoga contou como é lidar com a segurança dos profissionais e das crianças, e como consegue cumprir o objetivo do projeto.

“Fazendo com que as crianças sintam-se seguras no ambiente escolar, com atenção, carinho e cuidado. Os funcionários da Instituição precisam estar preparados para acalmar as crianças em qualquer situação. Eu, como moradora de periferia, já consigo contornar algumas situações e passar um pouco de tranquilidade para eles, principalmente por causa dos métodos que são desenvolvidos no meu ambiente de trabalho, uma pedagogia própria direcionada a crianças com traumas e bloqueios devido à violência, possibilitando as crianças uma educação segura e de qualidade, apesar de todo dano causado por essas operações”. disse Viviane.

A ONG Redes da Maré divulgou relatório mostrando que no ano de 2022, a cada 10 operações na Maré, 6 foram perto de escolas. A professora disse que acredita que a educação e a cultura faz com que eles não sejam as próximas vítimas dentro desse cenário de violência.

“Procuro sempre apresentar coisas novas, incentivar eles a fazerem o que gostam, praticar um esporte ou tocar um instrumento musical, para que eles possam fugir um pouco desse cenário de guerra que vivem diariamente. E principalmente acreditar neles para que não desistam e tenham a educação como algo primordial em suas vidas”, disse Viviane.

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Thayan Mina

Thayan Mina

Thayan Mina, graduando em jornalismo pela UERJ, é músico e sambista.

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