Músico carioca prepara projeto musical sobre resistência e herança negra

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O músico Wanderson Lemos criou esse instrumento de cordas que lhe acompanha nos shows


O Portal Notícia Preta conversou com o artista carioca Wanderson Lemos sobre a sua trajetória enquanto músico e também sobre o seu mais recente projeto – o ”Minha Resistência é Herança” -, que está sendo elaborado. Confira!

Dentre as grandes parcerias na música, uma é especial e já esteve aqui conversando com o NP: o afro-gaúcho Marcelo Amaro. Juntos, os artistas negros compuseram canções como Preta Desnuda

Wanderson Lemos criou esse instrumento de 11 cordas que lhe acompanha nos shows

Notícia Preta: Toda vez que realizamos uma entrevista com um artista, nós perguntamos sobre a história de vida, a introdução no meio musical. Para você Wanderson, como isso tudo foi acontecendo? E quais foram/são as suas maiores influências musicais?

Wanderson Lemos: Apesar de meu pai ser percussionista e ter uma banda com os irmãos dele e por eu ter crescido assistindo, por estar rodeado por essa influência – banda de swing, de música brasileira – apesar disso, eu comecei a tocar bem e a compor com uns 12 ou 13 anos, mas isso no núcleo escolar, muito mais do que propriamente dentro de casa com a minha família. Com eles eu mais assistia. A minha mãe é uma pessoa que sempre gostou muito de música, mesmo ela não sendo da área ouvia muito mais música do que o meu pai. Era música boa, de qualidade, brasileiras e até norte-americanas. E isso é parte da minha influência. Eu tocava e fazia as composições na escola. Eu estudei em uma escola chamada Piquê Carneiro, em uma região pobre do Rio de Janeiro e, nessa escola eu fiz dois amigos – Edson e Jaime (mais velhos do que eu 5 anos) – que já tocavam a mais tempo do que eu e muito melhor também e eles me influenciaram muito porque eu ficava observando eles tocarem e eu acreditava que também poderia chegar naquele nível. As influências são de vários estilos. Eu gosto de compor em cima de vários estilos porque eu gosto de escutar sons variados, então… eu posso dizer que eu comecei a tocar violão para tocar Tom Jobim e, por incrível que pareça, eu não toco e nem componho Boça Nova, mas na época era o que mais chegava lá em casa. Depois com a descoberta da Black Music e de todos os outros artistas da MPB, eu comecei a ouvir outras coisas e tudo isso me influenciou. A minha paixão foi misturar esses ritmos; o Funk com o Jazz, com o SambaMaracatu. Hoje eu ainda me considero um artista em transformação, mas as minhas influências enquanto compositor advém de: Tom JobimJoão Bosco, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Cartola, Candeia, Zé Keti e até Stevie Wonder.

Notícia Preta: Você lançou o seu próprio selo que é o Crioula Fonográfica. Criou também o seu próprio instrumento (foto acima). Nós gostaríamos de saber um pouco mais sobre as suas criações. o seu selo, como surgiu a ideia, a motivação e como tem sido tocar esse projeto?

Wanderson Lemos: Apesar de receber vários comentários sobre o nome do instrumento, eu não defini o nome. Acho que com o tempo isso vai acontecer, não quis forçar. Mas, o instrumento é a junção de um violão, de sete cordas, com um cavaquinho – totalizando 11 cordas. Sobre o Crioula Fonográfica: ela foi criada da necessidade de se distribuir o trabalho de forma profissional e independente. De se estar nos principais espaços e plataformas do Brasil e outros países. A necessidade de criar algo que a gente tivesse o domínio artístico, sem ninguém ditando o que vai ser cantado ou escrito. Essa vontade de produzir e distribuir de forma independente existia desde 2007 – quando lancei meu CD independente. A Crioula também foi a realização de um sonho, porque eu nunca quis ou tive o sonho de participar de uma gravadora grande. A questão era fazer isso dar certo e daí nós (eu, Aline e Tiago) conseguimos nos juntar com outros parceiros. Hoje, nós produzimos e distribuímos para onde nós quisermos, sem ninguém mandar.

Notícia Preta: Quantos anos de carreira você tem, Wanderson? E qual o trabalho que mais marcou a sua trajetória?

Wanderson Nunes: Eu conto a partir do lançamento do meu primeiro CD que ocorreu em 2007, então, eu tenho 12 anos de carreira. O trabalho que mais me marcou também foi o meu primeiro CD (Kurumi Ata) porque quando a sua primeira música toca no rádio você nunca mais esquece. Acaba te motivando e nesse trabalho teve a canção Tereza Crioula que tocou nos principais canais de rádio aqui do Rio de Janeiro. Se isso não tivesse acontecido, talvez eu tivesse demorado mais a perceber que estava no caminho certo.

Notícia Preta: Gostaríamos que você também nos contasse um pouquinho mais sobre os CDs O Poderoso Chefão e a Princesa do Subúrbio (2018) e O Couro Come (2015).

Wanderson Nunes: O Poderoso Chefão e a Princesa do Subúrbio faz uma alusão ao conto infantil e ao filme também – é uma brincadeira nossa. É quase uma continuação do O Couro Come. Tem uma homenagem a Zumbi e Besouro, mas não deixa de ser uma coisa mais pro lado dançante. O Couro Come é um CD do qual me possibilitou fazer mais shows fora do país. Ele tem um repertório muito dançante e até hoje quando vou fazer shows fora, há faixas que eu não posso deixar de tocar, como: Que Preta É Essa?, Só Para te Ver Sambar e até Tereza Crioula.

Notícia Preta: Wanderson, você voltou a poucas semanas da França. Nos conte como foi passar esse tempo fora.

Wanderson Lemos: O país que eu tenho mais intimidade é a França. Eu, quando vou para lá, passo a maior parte do tempo em Paris. Por lá, o negro está em outro patamar; eles participam de diversos espaços de protagonismo. Lá eu participo de vários grupos de ativismo. O meu projeto é muito bem aceito por lá. A nossa maior dificuldade é a língua, mas estamos trabalhando nisso; eu estou compondo músicas em francês e inglês porque, quando cantamos algo sobre representatividade – o que ocorre na maioria dos shows – nós temos que explicar para o público que em sua grande maioria, é de estrangeiros, o significado das canções. Pelo fato de ser uma outra cultura, uma visão diferente acerca do negro, o discurso também tem que ser adaptado.

Notícia Preta: Nós gostaríamos de saber o que você vem planejando para este ano de 2019. O que podemos esperar de novidades de Wanderson Lemos? O que você pode nos contar sobre o seu projeto Minha Resistência é Herança?

Wanderson Lemos: Eu acredito que para 2019, todas as novidades serão baseadas no projeto Minha Resistência é Herança que começou a ser desenvolvido lá na França. Serão ser 2 anos inteiros de homenagens e videoclipes. Após isso, faremos um livro com a breve biografia de cada um. Esse projeto é uma homenagem aos ícones negros da nossa história e é um trabalho todo baseado em pesquisas. A música é utilizada para contar essas histórias. Vai ter homenagem a Conceição EvaristoCarolina Maria de Jesus (Marcelo Amaro & Wanderson Lemos) – que já foi gravada por uma cantora lá da Bahia que é a Didi Assis – e Eu Sou Luíz Gama (Wanderson Lemos), por enquanto. Eu percebi que já vinha fazendo esses temas desde o meu primeiro CD, mesmo sendo fictício, eu colocava personagens negros como protagonistas. Depois de um tempo eu fui percebendo que esses temas se perdiam no meio da necessidade artística comercial. Eu senti, então, a necessidade de fazer um trabalho de homenagens mais destacado para que as pessoas que se gostam desse tipo de música com história e representatividade consigam se identificar. As músicas com cunho social e que falam dessa representatividade negra destacam independente do álbum ser comercial ou não. A minha motivação, além de ter observado que eu já vinha tratando dessa temática em trabalhos anteriores, vem da descoberta desses personagens que fariam toda a diferença se eu os tivesse conhecido na escola porque nós não temos identificação com o que é ensinado. Esses ícones não estão presentes na base da educação brasileira. E eu acredito que, nossos problemas de identificação seriam bem menores se esses ícones estivessem presentes nos materiais didáticos”.

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