Mapa revela aumento na aplicação de cotas raciais no serviço público

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De 2000 a 2022, legislações sobre o tema passaram de cinco para mais de 120 em todo o Brasil. Cotas no ensino superior estão sendo revistas este ano. Em 2024, será a vez da revisão das cotas nos concursos

Conhecer a existência de leis de cotas no serviço público no Brasil está ao alcance de quem quiser de maneira prática e acessível. O Mapa de Ações Afirmativas demonstra, de maneira ilustrada e georreferenciada, os modelos vigentes de cotas raciais em concursos públicos no Brasil. Acesse aqui.

No mapa é possível identificar as iniciativas existentes no âmbito nacional, federal, distrital, estadual e municipal, e também conhecer os diversos marcos jurídicos existentes. Ao clicar em seus pontos, é possível visualizar as informações de cada organização e também aplicar filtros por abrangência, público alvo, percentual de vagas reservadas, existência de Comissões de Verificação de Autodeclaração, reserva para cargos comissionados, além de identificar quais leis não estão mais vigentes.

O Mapa faz parte do projeto Ações Afirmativas e Burocracia Pública coordenado por Rebecca Lemos Igreja e Gianmarco Ferreira, e desenvolvido pelo Colégio Latino-Americano de Estudos Mundiais, programa da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais – FLACSO/Brasil, em parceria com o Laboratório de Acesso à Justiça e Desigualdades – LADES, do programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da UnB.

Além do Mapa, o grupo envolvido na pesquisa elaborou o Caderno de Pesquisa Ações Afirmativas e Burocracia Pública – Vinte Anos de Legislação, que sistematiza os achados na pesquisa sobre a política de ações afirmativas no serviço público. Um deles é a expansão das políticas de ação afirmativa para cargos que não são objetos de concurso público.

A pesquisa demonstra que a política se estendeu em sua aplicação para além dos cargos efetivos e que outras formas de contratação passaram a ser também objeto das cotas raciais, como as contratações temporárias, serviços terceirizados e, até mesmo, a contratação de estagiários. Além disso, também houve expansão de sua aplicação em diferentes estados e municípios e distintos poderes. O que podemos afirmar finalmente é que observamos a expansão e a consolidação da política, demonstrando sua importância. Se no início dos anos 2000 eram cerca de cinco leis, hoje são mais de 120”, explica uma das coordenadoras da pesquisa, Rebecca Lemos Igreja.

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O sistema de cotas na educação superior passará por uma revisão neste ano de 2022 com alguns setores defendendo que ela seja extinta. Para Gianmarco Ferreira, também coordenador do projeto, a preocupação é que a política de cotas no serviço público, cujo prazo de vigência expira em 2024, deixe de existir.

“Diferentemente da Lei de Cotas na Educação, a Lei de Cotas no Serviço Público, assim como as várias legislações municipais e estaduais que a tem como modelo, não preveem um período de avaliação, mas, ao contrário, apenas um período fixo de vigência. Assim, decorrido os dez anos de promulgação da lei, caso não sejam alteradas, elas simplesmente deixarão de existir, como ocorreu no Rio de Janeiro, em que a lei estadual perdeu a vigência e  nada foi feito para substituí-la”, alerta. 

Para ele, as contribuições da pesquisa podem ajudar, inclusive, no processo de revisão do sistema de cotas na educação. “As conclusões da pesquisa sobre a expansão e consolidação das cotas no serviço público contribuem para o processo de revisão atual das cotas no Ensino Superior, ao ampliar a análise dos benefícios desse tipo de política”, finaliza.

Saiba mais

A primeira geração de ações afirmativas para cargos públicos, no Brasil, teve início no Ministério do Desenvolvimento Agrário, no ano de 2001, estendendo-se gradualmente para outros ministérios. Esta primeira fase culmina com o Decreto Federal n.o 4.228, de 13.05.2002, que instituiu, no âmbito da Administração Pública Federal, o Programa Nacional de Ações Afirmativas, prevendo metas percentuais de participação para afrodescendentes, mulheres e pessoas portadoras de deficiência no preenchimento de cargos em comissão. No entanto, esta norma – ainda vigente, mas esvaziada – não chegou a ser plenamente aplicada, muito em razão de resistências internas dos órgãos, como já ocorrido com outros projetos voltados para a população negra no âmbito federal. De forma descentralizada, vários Estados e Municípios começam também a editar leis com propostas nesse sentido.
Nova norma visando à aplicação a todo o serviço público somente surgiu anos mais tarde, com a Lei Federal n.o 12.288, de 2010, que aprovou o Estatuto da Igualdade Racial, mas, em relação à reserva de vagas com recorte racial, apenas um artigo acabou disciplinando o tema, sem regulamentar claramente esse direito e com a mera possibilidade de sua adoção no mercado de trabalho. Embora propostas nesse sentido tenham tramitado na Câmara dos Deputados, somente em 2014, a temática foi amplamente tratada na Lei Federal n.o 12.990, de 12.06.2014. Essa norma marcou o início da segunda geração de ações afirmativas raciais para cargos públicos, resultando num crescimento expressivo de nova legislação nos diversos âmbitos da federação brasileira.

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