Atletas negras brasileiras e Olimpíada

images-4.jpeg

Por Cleide Maria Aparecida Oliveira Pereira*

Os jogos olímpicos tiveram sua origem na Grécia Antiga, por volta de 778 a.c. e homenagear deuses gregos e promover a interação popular era o objetivo das competições.

Rebeca Andrade foi a primeira medalhista olímpica da ginástica artística brasileira – Foto: Reprodução

Nesta época, as mulheres não tinham o direito de assistir aos jogos e a participação feminina como atletas era algo que não passava pelo imaginário do poder romano. Com o passar do tempo, mais precisamente na Era Moderna, nas olimpíadas de Atenas (1896), as mulheres ganharam o direito de assistir as competições. Nessa mesma época, em um ato de protesto, a grega Stamati Revithi, realizou o percurso da maratona fora do estádio no dia seguinte da competição masculina.

Seu ato de bravura trouxe avanço significativo para a participação feminina nos jogos que, a princípio, as medalhas eram exclusivas para homens. Mulheres recebiam apenas certificados de participação. Paulatinamente, as mulheres foram alcançando o direito de participar das competições olímpicas e, somente em 2012, nos jogos de Londres, as mulheres conquistaram o direito de participar em todas as modalidades, porém em número bem inferior comparado à participação masculina.

No Brasil, em todo segmento, seja público ou privado, o esporte, não é diferente. Mulheres, principalmente as negras, embora a população negra represente a maioria, sofrem os mais diversos tipos de preconceito, seja social, racial e de gênero. Comportamento fruto de uma sociedade dominada por uma eltite branca, na qual ainda em pleno século XXI, o patriarcalismo, colonialismo, machismo e sexismo predominam. As atletas negras brasileiras, normalmente são originárias de famílias humildes de recursos escassos para sobrevivência e inimagináveis para arcar com os sonhos das garotas de competir nos campeonatos nacionais e mundiais.

Neste contexto, mulheres negras, cumprindo o histórico de segregação social pela raça e gênero, são expostas a diversos tipos de violências. Muitas vezes, longe de seus familiares, utilizam de meios que estão ao seu alcance, na maioria precária, para seus treinos. A resistência passa a ser sua principal característica para conseguir competir em uma suposta igualdade de condições com as outras atletas. Percebe-se, assim, que em muitas modalidades esportivas, a presença de mulheres negras ainda é pouco representada. Esse fator é fruto do racismo estrutural e institucional que privilegia aqueles cujas condições sociais e raciais, bem como de gênero, se sobressaem. Ou seja, o segmento das pessoas brancas, que cumprem o padrão eurocêntrico.

A eles, a facilidade de patrocínios e, assim, acesso aos mais modernos centros de treinamento, cuidados materiais e subjetivos, saúde física e mental. No quesito patrocínio, neste recorte de gênero e raça, mulheres negras precisam provar e comprovar duplamente que tem capacidade e habilidades, assim como as mulheres brancas (por vezes até mais), para conquistar um patrocinador.

É importante, porém, e muito válido ressaltar o poder de resistência dos atletas brasileiros, principalmente das atletas negras. Na olimpíada atual, que acontece em Tóquio 2020 (2021 devido a pandemia Covid-19), atletas negras brasileiras vêm apresentando um protagonismo acima do esperado, exatamente pelas condições que enfrentam para chegarem lá.

A ginasta Rebeca Andrade (primeira medalha de prata na ginástica artística feminina), por exemplo, ao subir no pódio olímpico, levou com ela a sua história de resistência e superação e de tantas outras atletas negras brasileiras, assim como a potencialidade de sua representação no enfrentamento a todos os percalços a que é acometida por suas condições enquanto atleta, mulher e negra. Um marco histórico para o esporte brasileiro que se fará valer, sobretudo para as jovens negras.

Emocionada, Daiane dos Santos desabafou em rede nacional -Foto: Reprodução TV Globo

Daiane dos Santos, ex-ginasta brasileira, medalha de ouro em campeonatos mundiais (nove), referência neste histórico de atletas negras brasileiras, ao comentar a conquista de Rebeca Andrade, disse: “Agora a gente tem a primeira medalha do Brasil na ginástica artística com uma negra. Isso é muito forte. Isso é muito importante. Até pouco tempo os negros não podiam competir em alguns esportes…”.

Por mais clichê, necessário se faz entender, compreender as mazelas sociais que segregam e excluem a população negra (principalmente as mulheres) dos espaços e acima de tudo, combatê-las com eficiência e eficácia. Reconhecer direitos e igualdade em todos os pólos, é fundamental para o crescimento e evolução humana. O pólo da vez é olímpico.

Cleide Maria Aparecida Oliveira Pereira é advogada e historiadora

Deixe uma resposta

scroll to top