Racismo ambiental: importante observar “as regiões e pessoas mais afetadas pelos extremos climáticos”, diz especialista

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O racismo ambiental está ganhando espaço no debate público, com as fortes chuvas e o calor extremo que assolam o país nos últimos meses. Para entender a situação, o Notícia Preta procurou o doutor em Biotecnologia Vegetal pela Universidade Federal do Rio Janeiro (UFRJ) e University of Ottawa/Canadá, Marco Rocha.

O especialista revela que se impressiona com a surpresa das pessoas quando fala sobre o assunto, e isto o levou a entender que o tema circula pouco fora das bolhas acadêmicas. Ele diz que procura resgatar as experiências cotidianas das pessoas: se há saneamento básico, transporte, acesso ao sistema de saúde, escolas, equipamentos de culturas e coleta de lixo nos territórios onde vivem.

“Qual é a cor da maioria dos moradores de sua comunidade. E como essas regiões são impactadas por extremos climáticos. E a partir das respostas eu explico que a realidade dessas pessoas é atravessada pelo racismo ambiental, uma vez que a exclusão social/racial está posta em uma população majoritariamente negra, pobre e periférica”, disse ele.

Área impactada por fortes chuvas/ Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

O intelectual entende que cada região brasileira possui suas particularidades, mas mesmo assim o racismo ambiental se faz presente em todas elas. Marco explica que como vivemos num país continental, as especificidades culturais e regionais afetam as populações e seus territórios originais de muitas maneiras.

“Se pensarmos nos povos originários que sofrem os impactos diretos do desmatamento, das queimadas, da contaminação dos rios e dos peixes por mercúrio do garimpo ilegal, a violência dos grileiros e dos narcotraficantes, a exclusão étnico-racial em áreas demarcadas é terrível. Nesse caso, o racismo ambiental tem uma ação direta com o extermínio de povos originários e suas culturas”, ressalta.

Ele lembra que ação semelhante acontece com comunidades quilombolas, ribeirinhas e caiçaras e fala sobre apartheid social no ambiente urbano, que segundo ele, limita os espaços da população negra e pobre a territórios precários e insalubres, que se distribuem em encostas ou as margens de rio.

Projeto Político

Para Marcos além da causa e efeito relacionados ao racismo ambiental, há um projeto político que opera historicamente na manutenção das desigualdades que afetam territórios periféricos com maioria da população vulnerável.

“O que inclui, aos fatores que já mencionei, a dificuldade ao acesso a escolas e a saúde. Uma população que não é capaz de compreender a sua realidade por conta da baixa escolaridade e adoecida por conta das condições de precariedade em que vivem, não é capaz de perceber as sutilezas perversas promovidas pelo racismo ambiental”, explicou.

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Agronegócio

Outra particularidade do racismo ambiental para ele é o funcionamento da atividade agropecuária no país. O doutor entende que o Brasil segue tendo a atividade agropecuária como marca de desenvolvimento econômico, baseado em extrativismo predatório, “como sempre foi”, disse.

Ele argumenta que os ciclos de crescimento econômico são baseados em extração dos recursos naturais. “Ciclo do pau-Brasil, da borracha, da cana de açúcar, do café e agora vivemos o ciclo da soja”, exemplificou. Para Marcos , as atividades agrícolas sempre promoveram o racismo ambiental.

“O uso da mão de obra dos escravizados e depois das pessoas em condições análogas a escravidão, longas jornadas de trabalho, todas as condições de precariedade possíveis se encaixam totalmente no que conhecemos hoje como racismo ambiental. Vem sendo assim há 500 anos”, completou.

Reforma Agrária

O biólogo entende que a concentração de terras pra grandes latifundiários acentua as desigualdades não só na produção de alimentos, como também na concentração de renda e relembra que o Brasil produziu “trilhões de toneladas” de alimentos em 2022 e manteve a terrível marca de 30 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar.

“A reforma agrária é a única forma possível para democratizar o acesso a terra, a produção diversificada de alimentos para além das monoculturas, o aumento da agricultura familiar livre de defensivos agrícolas é, claro, o estímulo a agricultura sustentável que prioriza a produção de alimentos mantendo a floresta de pé”, disse ele.

Emissão de Gases Poluentes

O pesquisador informa que que o 1% das população mais rica do planeta é responsável por 16% das emissões de carbono na atmosfera e que os 10% mais ricos emitem mais da metade de todas emissões de carbono.

“O topo da pirâmide econômica detém o poder dos meios de produção como indústrias em vários setores, petrolíferas, mineradoras, farmacêuticas, se locomovem em jatos e aviões particulares, ou seja, esta sob o comando dessa pequena parcela que controla o poder econômico do planeta, as maiores emissões de gases do efeito estufa, responsáveis pelo agravamento da crise climática”, diz Marco.

Progressão Tributária

O cientista diz que um parcela dos mais ricos não paga, ou paga pouquíssimos impostos. Para ele uma das soluções para diminuir as desigualdades e o racismo ambiental é a taxação das grandes fortunas, segundo ele, é o caminho para uma arrecadação de quase 2 trilhões de dólares que podem atenuar ou retardar os efeitos do aquecimento global de fato. Impedindo que os 90% mais pobre da população sofra os impactos diretos da crise climática mundo afora.

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Thayan Mina

Thayan Mina

Thayan Mina, graduando em jornalismo pela UERJ, é músico e sambista.

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