Musical ‘Leci Brandão – na palma da mão’ estreia no Itaú Cultural em São Paulo

Alberto-Mauricio-09-scaled-e1691164898363.jpg

Nesta quinta-feira (03), o musical ‘Leci Brandão – Na Palma da Mão’ estreiou a temporada em São Paulo no Itaú Cultural. O espetáculo reverencia a vida e a obra da cantora e compositora que lhe dá nome. A história desta mulher à frente de seu tempo e uma das grandes referências da música brasileira, pioneira em momentos diversos de um caminho de quase meio século de carreira, é contada a partir da sua relação com Dona Lecy, sua mãe, que morreu em 2019, aos 96 anos.

A direção é de Luiz Antonio Pilar e o texto é assinado pelo jornalista e escritor Leonardo Bruno. As atrizes e cantoras Tay O’Hanna e Verônica Bonfim interpretam, respectivamente, a filha e a mãe. A entrada é gratuita, com apresentações às 20h na sexta e no sábado, e às 19h no domingo (06).

Os ingressos devem ser reservados pela plataforma INTI (acesso pelo site www.itaucultural.org.br).

Sem linha cronológica, a peça é guiada pelo olhar de Dona Lecy, maior referência da vida de Leci. Segundo o diretor, são reminiscências da artista, interpretadas em cena ora por mãe, ora pela filha, e com olhares ainda maiores voltados à ancestralidade. “A ideia foi construir um espetáculo cujo arcabouço mostrasse toda a tradição familiar e religiosa, o respeito e a educação de uma família preta, que a Leci traz”, resume o diretor.

Tay e Verônica são acompanhadas no palco pelo ator Sérgio Kauffmann. Ele representa diversos personagens masculinos presentes na vida da cantora. Um deles, por exemplo, é o líder comunitário Zé do Caroço, inspiração de uma de suas músicas mais famosas. Outros são Cartola, Antonio Francisco da Silva, pai de Leci, e Flávio Cavalcanti. As canções são interpretadas ao vivo, ao lado dos músicos Matheus Camará (violão, clarinete e agogô), Rodrigo Pirikito (violão, cavaquinho e xequerê) e Thainara Castro e Pedro Ivo (percussão), sob direção musical de Arifan Junior.

O musical ‘Leci Brandão – Na Palma da Mão’ tem apresentações até domingo (06) /Foto: Alberto Mauricio

Grande parte dos 17 números do espetáculo é composta por canções da própria Leci, como A filha da Dona LecyOmbro amigoGente negra e Preferência. A trilha sonora também incorpora momentos do início da carreira da compositora desconhecidos do grande público. Tema do amor de você, de 1964, por exemplo, foi a sua primeira composição. Escrita após uma desilusão amorosa permanecia inédita. Por sua vez, a cantora apresentou Não falo de guerra, nem falo de morte, escrita em 1968, no programa de Flávio Cavalcanti, sua primeira aparição pública. A letra desta música permaneceu, mas a melodia se perdeu. Na montagem do musical, a canção ganhou novo ritmo pelas mãos de Verônica.

A outra parte é formada por músicas significativas na trajetória da artista, como Corra e olhe o céu, de Cartola, e o samba-enredo da Mangueira História pra ninar gente grande, campeão de 2019.

Uma árvore de 2,50m rodeada por pedras é o destaque do cenário do espetáculo, que representa um grande quintal, um terreiro em tons terrosos e verde, com o chão todo coberto de folhas secas de mangueira. Dessas folhas, surgem peças do figurino criados por Rute Alves, como elementos cênicos e usados pelos atores, que não saem de cena durante o espetáculo.

A simbologia do candomblé, também muito presente na vida da artista, é um dos fios condutores da dramaturgia. Filha de Ogum e Iansã na religião africana, Leci passou cinco anos sem gravar desde que se afastou da Polygram, por não aceitar reescrever suas letras. Em uma consulta às entidades no terreiro, ouviu que tudo ficaria bem. Assim, assinou com uma gravadora nacional, gravou um disco com seu nome e estourou. Em agradecimento, todos os seus discos, a partir de então, tem uma saudação a um Orixá.

O espetáculo está estruturado dessa forma. A primeira saudação é para Exu, para abrir os caminhos. A todo momento esses Orixás vêm e assim vamos alicerçando a cena”, explica o diretor do espetáculo, que estreou em janeiro, no SESC Copacabana, seguindo em outras temporadas no Rio de Janeiro.

Passos

Para escrever Leci Brandão – Na Palma da Mão, sua estreia na dramaturgia teatral, Leonardo Bruno se inspirou nas pesquisas que fez para o livro Canto de Rainhas (Agir, 2021), nas quais percebeu como a artista era avançada para a época.

Primeira mulher a integrar a Ala de Compositores da Mangueira, e segunda mulher negra a ser eleita para a Assembleia Legislativa de São Paulo, Leci Brandão assumiu a homo afetividade publicamente no fim dos anos 1970, em entrevista ao jornal Lampião da Esquina. Seus cinco primeiros discos, lançados na segunda metade dos anos de 1970, já falam de temáticas discutidas na atualidade, como mulheres, negros, LGBT e desigualdade social, entre outras.

É autora de sucessos atemporais como Papai vadiouIsso é fundo de quintalEssa tal criatura, Ombro amigo e Zé do Caroço, este último regravado por artistas diversos como Seu Jorge, Anitta, Mariana Aydar, Grupo Revelação e a banda de rock Canto Cego. Mas também rompeu com uma gravadora que queria lhe impor repertório. Leci traz em suas letras muito de quem ela é e suas histórias de vida.

A cantora estendeu sua luta política para o plenário e, já radicada em São Paulo, se filiou ao PcdoB, tendo sido eleita deputada estadual em 2010 com 86.298 votos. Atualmente em seu quarto mandato, recebeu 90.496 votos em 2022. Aos 78 anos, segue ativa na música e na vida parlamentar, conclamando o povo para levar na palma da mão a luta pelas causas de todos os marginalizados.

O musical ‘Leci Brandão – Na Palma da Mão’ tem apresentações até domingo (06) /Foto: Alberto Mauricio

Elenco e direção

Luiz Antonio Pilar, direção e adaptação dramatúrgica

Carioca, nascido e criado na Vila Vintém, estudou Teatro na Escola Martins Penna e se formou em artes cênicas, direção teatral, pela UniRio. Dirigiu o longa-metragem de ficção Lima Barreto, ao Terceiro Dia. Ainda no cinema, produziu e dirigiu o documentário Candeia, em memória aos 40 anos da morte do compositor, O Papel e o Mar, selecionado no concurso de apoio à produção da RioFilme, Em Quadro – A História de 4 Negros nas Telas Remoção.

Na TV Globo, dirigiu novelas como Desejo ProibidoSinhá Moça e A Padroeira. Na extinta TV Manchete fez parte da equipe de direção de grandes sucessos como Xica da Silva e Mandacaru. Em A Cor da Cultura, uma parceria com o Canal Futura e a TV Globo, criou os documentários Mojubá, sobre a influência das diversas manifestações da religiosidade de matriz africana, e Heróis De Todo Mundo, 60 filmes biográficos sobre personalidades negras da história do Brasil.

No teatro foi responsável por espetáculos como Os Negros, de Jean Genet; Paparutas, de Lázaro Ramos; Lima Barreto, ao Terceiro Dia, de Luís Alberto de Abreu, e Ataulfo Alves, o Bom Crioulo, de Enéas Carlos Pereira e Edu Salemi.

Leonardo Bruno, autor

Jornalista, escritor e roteirista. É autor dos livros Canto de rainhasZeca Pagodinho — Deixa o samba me levarBeth Carvalho — De pé no chãoExplode, coração — Histórias do SalgueiroCartas para Noel — Histórias da Vila Isabel e Três poetas do samba-enredo, entre outros.

Na TV, assinou direção e roteiro da série O samba me criou. No cinema, escreveu o roteiro do filme Andança – As memórias e os encontros de Beth Carvalho. Foi apresentador do programa Roda de Samba Ao Vivo e colunista do jornal Extra, onde escrevia semanalmente sobre as escolas de samba. Atua como pesquisador do Observatório do Carnaval, no Museu Nacional (UFRJ). É jurado do prêmio Estandarte de Ouro, do jornal O Globo, e comentarista de carnaval da TV Globo.

Arifan Júnior, diretor musical

Nascido no Rio de Janeiro, teve a sua iniciação musical tocando cavaquinho no projeto Tocando a Vida, que era realizado na Associação de moradores da Cidade De Deus, cujo professor era o Pretinho Da Serrinha. Participou da Semana da Cultura Brasileira, na Sérvia, e de alguns shows em outros palcos internacionais em Portugal e Suíça.

Acompanhou grandes nomes da MPB. Foi diretor musical do programa Aglomerado, da TVE-Brasil, apresentado por MV Bill e Nega Gisa. Dirigiu musicalmente a série Cinema de Enredo, que estreia em breve na Prime Box Brasil. Recentemente integrou o núcleo de samba Foliões da Gamboa, da novela Todas As Flores. Atualmente integra o grupo Awurê, o projeto Terreiro de Crioulo e o Quintal da Portela.

Tay O’Hanna, atriz

Formada pela Escola de Artes Dramáticas da USP-EAD, cursou escola livre de dança em hip hop na Broadway Center Dance, em Nova Iorque. No cinema, participou de Mulheres Negras – Projeto de mundo, residência artística voltada para 14 jovens da periferia de São Paulo, coordenada pela cineasta Day Rodrigues, com patrocínio do Itaú Cultural.

Entre seus trabalhos mais relevantes estão A felicidade delas, curta-metragem com direção de Carol Rodrigues, que participou de festivais nacionais e internacionais, como o 50º Festival Mix Brasil Cultura da Diversidade (São Paulo), Mostra For Rainbow Forest Festival LGBTQI+ (Fortaleza), 7º Recifest (Recife), Festival de Uppsala Internationella Kortfilmfestival (Suécia), Roze Filmdagen (Holanda), Festival de Cine LGBTQI+ ‘El lugar sin limites’ (Equador), 5º Festival Internacional de curtas de Rappur (Índia), vencendo na categoria de melhor fotografia.

O longa-metragem O homem cordial, com direção de Iberê Carvalho e fotografia de Pablo Baião, do qual participou como atriz, foi premiado em duas categorias na mostra competitiva de Gramado. Em séries para plataformas de streaming, participou das temporadas 2 a 4 de 3%, da Netflix, e da segunda temporada das séries Segunda chamada e As five, da Globoplay.

Entre seus trabalhos mais importantes no teatro destacam-se A vida, com direção de Nelson Baskerville, que participou do MIRADA – Festival Ibero-Americano de Teatro; Gabriela, o musical, de João Falcão; Tchiribim Tchiribom cantando pelo mundo, de Roberto Lage; A mulher do gordo, de Celso Frateschi; Angústia, de Lucienne Guedes; Vão!, de Jorgette Fadel; Os 3 Mundos, de Baskerville, que rendeu a Tay a indicação ao prêmio de melhor atriz coadjuvante na categoria Voto Popular no Prêmio Aplauso Brasil, e Vila Parisi, de Douglas Lima, com o Coletivo 302, grupo de pesquisa na cidade de Cubatão.

Verônica Bonfim, atriz

Doutora em ciência florestal (UFV-MG) e artista brincante, Verônica é atriz, cantora, compositora e escritora. Tem dois livros infantis publicados, A revolução da Tereza, a rainha quilombola (2022) e A menina Akili e seu tambor falante (2016), seu primeiro livro infantil pelo qual recebeu o prêmio Escritas Pretas 2022. O livro foi adaptado para um espetáculo musical para as crianças e ganhou a premiação da APTR como melhor espetáculo infanto-juvenil de 2021. O musical foi idealizado por ela, que também o  protagoniza e assina o roteiro (texto e músicas) e direção artística e segue em circulação nacional.

Atualmente Verônica está no cinema como a primeira Mamãe Noel negra do audiovisual, na série A liga do Natal, disponível na Globoplay e no YouTube. Seus últimos trabalhos mais relevantes foram: Elza, o musicalVozes Negras, também musical, e a série 3%, disponível na Netflix.

Sergio Kauffmann, ator

Ator, músico, palhaço e professor, é formado pela Casa das Artes Laranjeiras (CAL) e pela Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO). Mestre e doutorando pelo programa de pós-graduação em artes cênicas (PPGAC/UNIRIO), soma mais de 15 anos de atividades no teatro e no audiovisual.

Com o espetáculo Vamos Comprar um Poeta, dirigido por Duda Maia, ganhou o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte, o APCA 2019 para o melhor musical infantil e a premiação do Centro Brasileiro Teatro para a Infância e Juventude (CBTIJ), como melhor coletivo de atores pelo circuito Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Criou, com Alice Cruz, o projeto A Menina Com Um Buraco na Mão, série animada adaptada em 2022 para o teatro, na qual assinou a dramaturgia, direção e as canções originais. O projeto recebeu quatro indicações ao prêmio CBTIJ.

Desde 2011, desenvolve projetos no campo das práticas artísticas comunitárias. Atuou por 10 anos nas prisões do Rio de Janeiro e é criador do projeto Dom Quixote do Anil, coletivo de atores 65+ que existe desde 2015. No último ano integrou o elenco da novela Cara e Coragem, de Cláudia Souto, como o personagem Jarbas.

Ficha Técnica:

Leci Brandão – Na Palma da Mão

Texto e pesquisa: Leonardo Bruno

Adaptação dramatúrgica: Lorena Lima, Luiz Antônio Pilar e Luiza Loroza

Direção: Luiz Antonio Pilar

Direção Musical: Arifan Júnior

Assistente de direção: Lorena Lima

Direção de Movimento: Luiza Loroza

Figurino: Rute Alves

Cenografia: Lorena Lima

Iluminação: Daniela Sanchez

Direção de Produção: Bruno Mariozz

Atriz/Cantora: Verônica Bonfim

Ator/Cantor: Sérgio Kauffmann

Atriz/Cantora: Tay O’Hanna

Violão, clarinete e agogô: Matheus Camará

Cuíca, tantan, surdo, caixa, tamborim, congas e efeitos: Pedro Ivo

Violão, cavaquinho e xequerê: Rodrigo Pirikito

Pandeiro, atabaque, congas, repique de anel, repinique e efeitos: Thainara Castro

Preparador Vocal: Pedro Lima

Assistente Dir. Musical: Rômulo dos Anjos Assistente

Figurino: Diogo Jesus

Assistente Cenografia: Tarso Tabu

Cenotécnico: Vicente Mota

Produção Executiva: Angélica Lessa

Produção: Palavra Z Produções Culturais

Idealização e Realização: Lapilar Produções

SERVIÇO

Musical Leci Brandão – Na Palma da Mão

De 3 a 6 de agosto (quinta-feira a domingo)

Quinta-feira a sábado, às 20h. Domingo e feriados, às 19h.

Duração: 85 minutos

Na Sala Itaú Cultural (Piso Térreo)

Capacidade: 224 lugares

Classificação Indicativa:  12 anos [violência, estigma, preconceito]

Leia também: Espetáculo “Mãe de Santo” estreia no Teatro Ipanema em agosto, com Vilma Melo

Deixe uma resposta

scroll to top