A reunião contou com a presença de representantes de movimentos civis e do judiciário carioca
Nesta sexta-feira (16), o Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu representantes de movimentos civis e do judiciário do estado do Rio de Janeiro para uma audiência pública que debateu a alta taxa de mortalidade da Polícia Militar (PMRJ) carioca. O objetivo da reunião é coletar informações que darão base para o plano de redução da letalidade policial, bem como auxiliar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) a elaborar procedimentos de fiscalização de atuações da polícia e dos órgãos do Ministério Público Estadual.
A audiência foi convocada pelo ministro Edson Fachin, relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635 (ADPF 635), referendada pelo plenário da casa, onde se restringe ações policiais durante a pandemia de COVID 19 a casos excepcionais e que esses fossem comunicados e acompanhados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.
O ministro iniciou a sessão falando da importância de se fazer cumprir a decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que solicita que o estado do Rio de Janeiro adote política de segurança pública cidadã. “Este plano deve necessariamente contar com a imprescindível participação da sociedade civil, é indispensável que haja a colaboração efetiva dos órgãos públicos de um modo geral e especial do Ministério Público”, diz Fachin.
Ao longo do dia foram ouvidos expositores de diversas áreas de interesse no assunto, sendo os principais os representantes de movimentos sociais que lidam diariamente com a violência policial dentro das comunidades e atendem os cidadãos de forma direta. Entre eles, o grupo Mães da Maré que trouxeram relatos sobre como a violência afetou suas famílias e tirou a vida de seus filhos “Como falar para minha neta quem é o mocinho e o bandido?”, questiona Irone Santiago, cujo filho foi alvejado por um cabo do exército enquanto se dirigia a um jogo de futebol. O rapaz ficou paraplégico e foi amputado.
Bruna da Silva, mãe do menino Marcos Vinícius da Silva, morto aos 14 anos a caminho da escola em operação ilegal da polícia na favela da Maré, conta que a ambulância foi impedida de entrar na comunidade para socorrer seu filho, e ele morreu em seus braços indignado pelo tiro tomado “meu filho não acreditou quando tomou o tiro, ele ficou muito indignado por que nunca pensou que poderia tomar um tiro e tomou do braço que poderia ter protegido e abrigado”, diz.
As mães também apontaram medidas necessárias dentro das favelas para que se aumente a segurança dos moradores, como evitar operações próximas à escolas, a disponibilização de um promotor plantonista para monitorar ação do estado, uso de câmeras dentro e fora da viatura, e acoplada nas roupas e nome fixo nas fardas, pois hoje se usa identificação com velcro de fácil remoção, e ambulâncias de prontidão nas UPAs.
Para o advogado Gilberto Silva, com o debate no STF existe a possibilidade de novos entendimentos para os conceitos de segurança pública, bem como o debate do racismo estrutural e institucional. “Foi assim em relação às cotas raciais e o resultado foi favorável”, afirma.
ADPF das Favelas
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) é um instrumento jurídico que tem como objetivo garantir o cumprimento de direitos fundamentais, combatendo atos abusivos que se opõem às garantias constitucionais. “No caso específico, ela tem por objetivo garantir o direito à vida, a segurança e o direito de ir e vir dos cidadãos que estão tendo seus direitos violados e pagando o preço até com a perda da vida”, explica Gilberto Silva.
A ação foi ajuizada em 2019 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), devido ao aumento da letalidade da polícia militar do Rio de Janeiro. Com base nela o ministro Luiz Edson Fachin determinou que não houvesse ações policiais durante a pandemia de Covid-19, em junho do ano passado. No período de junho a setembro de 2020, houve a maior redução de violência desde 2013, segundo dados do Grupo de Estudos de Novo Ilegalismos (Geni) da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Segundo o Instituto a média mensal de mortes nesse período, logo após a decisão de Fachin, foi de 37,5, alcançando seu número mais baixo em junho, com 18 mortes. Esse foi a primeira redução desde 2013.