*Marta Celestino, CEO da Ebony English
“O trabalho é a maneira pela qual nos conectamos à sociedade, mas também deve ser um meio de conectar propósito e qualidade de vida”. Essa reflexão de Desmond Tutu ganha ainda mais força quando analisamos as mudanças no ambiente de trabalho trazidas pela pandemia de COVID-19.
Empresas de diferentes setores descobriram os benefícios do trabalho remoto e os compartilharam, revelando impactos positivos como a melhora na saúde física e mental dos colaboradores, o aumento da produtividade e a redução de custos operacionais. Segundo um relatório da McKinsey, 58% das organizações que adotaram o trabalho híbrido relataram ganhos em eficiência e satisfação.
No entanto, com o retorno gradativo ao presencial, surgem debates intensos. Até que ponto a presença física no escritório é essencial? Empresas tentam equilibrar produtividade, colaboração e bem-estar, mas é evidente que a discussão sobre o formato ideal reflete algo maior, como a reconfiguração das relações de poder no ambiente corporativo.
A gestão de equipes remotas exige habilidades específicas, como comunicação clara, integração e alinhamento de expectativas. Para muitos gestores, essa nova realidade traz desafios adicionais, incluindo a sensação de perda de controle e dificuldades em manter o engajamento. Um estudo do MIT aponta que 47% dos líderes relatam problemas para promover networking e desenvolvimento de carreiras em equipes que trabalham remotamente.
Mas será que o retorno ao escritório é uma necessidade operacional ou uma tentativa de preservar estruturas tradicionais de poder? O modelo remoto descentraliza a visibilidade e as oportunidades antes reservadas a quem tinha acesso direto à liderança. Almoços estratégicos, happy hours e outras interações informais, muitas vezes essenciais para promoções, tornam-se menos frequentes, ameaçando dinâmicas que privilegiam poucos.
Enquanto a força de trabalho remota responde de casa a demandas urgentes, gestores podem se beneficiar de um tempo mais livre para cuidar de suas próprias agendas e ascender em suas carreiras. Essa desigualdade estrutural, quase invisível, deve ser problematizada em qualquer discussão sobre a volta ao trabalho presencial.
O trabalho remoto se mostrou uma ferramenta poderosa para a inclusão e a diversidade. Para pessoas negras e moradores de regiões periféricas, ele representa a oportunidade de acessar boas vagas sem o fardo de longos deslocamentos. Em São Paulo, o tempo médio de trajeto diário chega a quase três horas, segundo o IBGE – um custo que afeta desproporcionalmente os mais pobres.
Na Ebony English, os resultados foram transformadores. Durante a pandemia, o modelo remoto possibilitou atender a alunos de diferentes estados, expandindo o acesso ao ensino de inglês e permitindo a contratação de profissionais em regiões antes pouco exploradas.
Essa flexibilidade permitiu renovar metodologias e adotar novas tecnologias, impactando
positivamente tanto alunos quanto colaboradores.
Quando falamos de inclusão, o trabalho remoto vai além. Ele democratiza o acesso a treinamentos, benefícios e experiências que antes pareciam distantes para quem vive longe dos grandes centros urbanos. E mais: oferece a possibilidade de “internacionalização global” – trabalhar para empresas no exterior sem sair de sua cultura e localidade.
O debate sobre o trabalho remoto vai além de escolher entre casa ou escritório, ou à escala 6×1. Ele é um reflexo de como equilibramos eficiência, inovação e qualidade de vida em um mundo que exige mais inclusão e sustentabilidade.
Na Ebony English, aprendemos que flexibilidade é essencial, mas exige planejamento e inovação contínuos. O modelo remoto não é perfeito e traz desafios, como manter a criatividade e o senso de pertencimento, mas oferece uma oportunidade única de reimaginar as relações de trabalho.
É hora de deixar para trás antigas hierarquias e repensar um futuro em que a produtividade e o bem-estar caminhem lado a lado, criando ambientes mais justos e humanos.
*Marta Celestino é Pesquisadora, Yalorixá, Consultora em Inovação e Diversidade, e CEO da Ebony English School