Rochelly Rangel, mulher trans, preta e periférica é um exemplo de resistência num país racista, machista, transfóbico e em uma onda conservadora. Ela poderia já não estar mais entre nós, afinal, a média de vida de uma mulher trans no Brasil é de 33 anos – e ela sobreviveu. E das tantas dificuldades na vida, venceu e tem vencido de diversas formas – seja em um reality show de coquetelaria (o Bar Aberto), seja como referência para outras mulheres trans que se inspiram nela. E Rochelly tem mais um motivo para celebrar no dia de hoje: é a primeira mulher trans no Brasil a assinar uma carta de drinks em uma rede multinacional de hotéis: a rede Hilton.
Resistir é um dos verbos que Rochelly mais conhece na vida. Primeiro, resistiu aos padrões binários de uma sociedade que não aceitou enxergá-la da maneira que ela sempre se viu. Resistiu também às duras limitações relacionadas à empregabilidade que mulheres trans sofrem no nosso país. Continua resistindo de diferentes formas ao se levantar contra o racismo, a intolerância religiosa e ao não ficar quieta ao lidar também com a transfobia. Mesmo com tanta dor, Rochelly resiste com elegância, finesse e ousadia. Essa mulher de Guarulhos (SP) exala resistência.
Rochelly também sobreviveu às barbáries que assolam as mulheres trans no Brasil. Elas são estigmatizadas e mortas. Elas muitas vezes não têm acesso ao mercado de trabalho formal, e; quando têm, são desrespeitadas diariamente até que preferem deixar o trabalho formal para não sofrerem violências verbais e algumas vezes físicas. E, a educação ajudou Rochelly nesse reality show da vida real. Foi no projeto TransGarçonne (UFRJ) que sua realidade começou a mudar. Conseguiu seu emprego formal com carteira assinada e depois de um curso profissional, se tornou embaixadora do projeto – sendo referência para outras pessoas trans no Rio de Janeiro Depois, chegou à TV.
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Sim, a própria vida de Rochelly Rangel é um reality show com muita emoção. Ela é personagem para qualquer reality show (claro). No Bar Aberto não foi diferente. Já tendo resistido na vida, sobreviveu e com tantas provas de resistência que a vida lhe impôs, venceu a maior competição de Coquetelaria do Brasil. Foi lá e deu o nome. E agora, começa a alçar vôos como bartender e assina três receitas, que estarão disponíveis no Restaurante Abelardo, no Lobby Bar e no Rooftop Bar (Hilton Barra) e no Clari Bar e no Isabel Lounge (Hilton Copacabana).
Rochelly escolheu homenagear grandes figuras femininas: Oxum, Marsha e Glória Maria. À base de gim, com manga, maracujá, limão, água tônica, manjericão e um toque de pimenta da Jamaica, o drink Oxum celebra a maternidade e é inspirado na orixá do ouro e da fertilidade. O coquetel cítrico e refrescante, criado por Rochelly, garantiu o primeiro lugar no Bar Aberto.
Com as cores da bandeira trans e muito glitter comestível, Marsha foi o coquetel escolhido para celebrar a diversidade em junho, Mês do Orgulho LGBT. Homenageando Marsha P. Johnson, travesti e ativista norte-americana que foi uma das principais figuras da Rebelião de Stonewall, em 1969, o drink leva vodka, goiaba, suco de hibisco e espuma de gengibre. Para Rochelly, a homenagem é uma forma de lembrar a luta de trans e travestis contra o preconceito.
Símbolo antirracista e antissexista no Brasil, Glória Maria é também uma das homenageadas. A primeira repórter a entrar ao vivo e a cores na TV brasileira, em uma época em que poucas eram as mulheres pretas a terem espaço no jornalismo, ganha um drink com seu nome, feito com vodka, ramazzotti rosato, jaca, maracujá, limão e angostura. A jaca, responsável por trazer doçura para o coquetel, foi escolhida por sua importância cultural, sendo muito utilizada na alimentação de famílias da região nordeste do país, especialmente Pernambuco, Ceará e Bahia.
Essa mulher é incrível. Não se desconecta das suas raízes e leva consigo o sentido de resistência, sobrevivência e vitória. Não à toa, brilha por onde passa. E hoje, 26 de Junho, é dia dela brilhar recebendo convidados em um evento intimista para lançar seus drinks no Hilton Copacabana.
Axé, irmã!