“O Projeto Consciências tem compromisso de tornar a temática racial uma agenda sistemática”, afirma Adriano Rocha, Analista de Educação do Sesc RJ

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Em mais uma ação voltada para a luta contra o racismo, o Projeto Consciências, criado pela área de Educação do Sesc RJ, é uma iniciativa que, por meio de uma série de ações, promove a discussão e a reflexão em relação aos problemas relacionados à questão racial que atinge a população negra e o racismo entranhado na estrutura brasileira.

A partir desse debate e reflexão, o Projeto Consciências impulsiona mudanças de comportamento na sociedade, posicionando-se como agente promotor de uma educação antirracista. Em entrevista ao Notícia Preta, Adriano Rocha, Analista de Educação do Sesc RJ, que está à frente da iniciativa, explica detalhadamente o Projeto Consciências.

Adriano Rocha, Analista de Educação do Sesc RJ, ao lado de uma peça da exposição Afrofuturismo Ancestral e o Mundo 3d. /Foto: Acervo Pessoal.

Segundo ele, a iniciativa funciona em consonância à Lei Federal 10.639/03. Sendo assim, o Projeto Consciências reconhece que essa é uma luta de todos e, por isso, busca estender essa discussão a todos e valorizar a identidade negra, ressaltando a importante contribuição dos povos africano e afro-brasileiro para o país. Com isso, a redução de posturas e atitudes racistas é uma das metas dessa iniciativa do Sesc RJ, que, se empenha em disseminar conteúdos de referência na área.

Também faz parte do Projeto Consciências articular uma grande rede de apoio com pessoas e instituições reconhecidas por sua atuação antirracista, a fim de fortalecer o desenvolvimento desse trabalho. Adriano Rocha, pedagogo, formado pela Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), e Mestre em Relações Étnico-raciais pelo Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ), fala sobre os desdobramentos do projeto.

Notícia Preta: Como surgiu o Projeto Consciências e qual a importância dessa iniciativa do Sesc RJ, diante de uma sociedade que ainda tem muito a mudar para que seja construído um país justo e igualitário, dando fim a toda forma de discriminação?

Adriano Rocha, Analista de Educação do Sesc RJ: Comecei a idealizar o Projeto Consciências, em 2020, quando eclodiu o movimento Black Lives Matter e, ao mesmo tempo, assistíamos, aqui no Rio de Janeiro, notícias quase diárias de mortes de crianças e jovens nas áreas periféricas do Rio de Janeiro. Naquele ano, o Sesc RJ se posicionou e realizou ações virtuais de combate ao racismo e ao letramento racial. Propus um manifesto que falava um pouco da história do Movimento Negro e sua resistência ao racismo estrutural brasileiro. Em 2022, já de forma presencial, lançamos o projeto em três Unidades Sesc RJ: Madureira, Ramos e São João de Meriti. Anteriormente, o Sesc RJ realizava ações de combate ao racismo de forma pontual. O Projeto Consciências surge com o compromisso de tornar a temática da questão racial uma agenda sistemática. Então, realizamos ações educativas ao longo de todo o ano, já que o racismo é manifestado de forma perene nas relações sociais brasileiras. Dessa forma, o Sesc RJ, por meio do Projeto Consciências, chegou a lugares periféricos, com alta vulnerabilidade social, levando ações educativas, letramento racial, ações de positivação e valorização da identidade negra, contribuindo, assim, para a formação e a inclusão de pessoas negras e periféricas. Com isso, o Projeto Consciências assume seu papel propositivo e educador, fomentando o bem-estar social. E, com racismo, não há bem-estar social.

NP: Como o Projeto Consciências atua para alcançar esse objetivo? Quais as ações planejadas e o objetivo delas?

Adriano Rocha: Este ano, estamos presentes em nove Unidades Sesc do estado, com uma capilaridade enorme. Ano passado, por exemplo, realizamos o curso preparatório para mestrado e doutorado para pessoas negras e periféricas, no qual sete dos participantes conseguiram ser aprovados em processos de seleção para mestrado e doutorado. Além disso, atuamos também em escolas municipais da capital e de outros municípios do Rio. Realizamos trabalho de formação com alunos da rede estadual, sobretudo, para estudantes de formação de professores. Entendemos que a Educação é uma das ferramentas para superação do racismo. Para isso, planejamos ações em três grandes eixos: valorização da identidade negra, denúncia do racismo estrutural e responsabilização, trabalhando o conceito de branquitude. Temos ainda a preocupação de promover a representatividade. Isso importa e muito! Por essa razão, os profissionais parceiros, que atuam na execução das atividades do projeto, são, em sua maioria, pessoas negras.

NP: Sabemos que o racismo faz parte do processo da formação da sociedade brasileira. Qual seria o caminho para uma sociedade livre da discriminação?

Adriano Rocha: Uma das formas de combater efetivamente o racismo é investir em práticas e leis que buscam a equidade racial, ampliando a participação de negros nos diferentes espaços sociais. A partir do momento que entendemos que o racismo é uma estrutura de poder, ele precisa ser combatido nos ambientes de poder. É preciso questionar e romper com o modus operandi que, historicamente, marginaliza a população negra e privilegia a branca. Temos que garantir e criar condições para que todos tenham as mesmas oportunidades, direitos e acessos. O conhecimento liberta, então, é possível conhecer a história e a cultura africana e afro-brasileira, reconhecendo que a história do povo negro não começa e não termina na escravização. Esse processo de conhecimento desconstrói estereótipos e preconceitos. A sociedade brasileira precisa conhecer e valorizar a história e a contribuição social dos negros. O povo negro, com suas tecnologias, contribuiu profundamente para a formação e construção do nosso país.

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NP: Dados do Atlas da Violência de 2020 reafirmam a gravidade do preconceito racial no Brasil. Em 2018, 75% das vítimas de homicídio eram negras. Em dez anos, as taxas de homicídios tiveram aumento de 11,5% para os negros. Como o Projeto Consciências crê ser possível romper essa estatística perversa?

Adriano Rocha: Historicamente, o Movimento Negro atua tensionando o Estado brasileiro em relação ao racismo estrutural e toda a violência que o racismo produz. O mais chocante é que são dados que parecem não incomodar a população brasileira. Diariamente a vida de jovens negros é ceifada e não há sentimento algum de empatia. É preciso conscientização de todos para o combate ao racismo, às práticas racistas e ao racismo recreativo. É necessário que toda a população tensione o Estado brasileiro para a efetividade das leis de combate ao racismo e punição, bem como, a ampliação de políticas afirmativas que visem, de fato, o bem-estar e a inclusão da população negra nos lugares de poder social. Nesse contexto, o Projeto Consciências atua no fomento à conscientização e na promoção da educação antirracista.

NP: Como você analisa os dois anos de ações do Projeto Consciências?

Adriano Rocha: Em dois anos de projeto, conseguimos diversos feitos positivos: ampliamos parcerias com instituições importantes na luta antirracista, aumentamos a nossa capilaridade, realizamos centenas de atividades educativas e de letramento racial para público escolar e o público em geral, produzimos conteúdos de qualidade sobre temáticas raciais, contribuímos para inclusão de pessoas negras em cursos de pós-graduação etc. Estamos fazendo um grande movimento de envolver pesquisadores, artistas, cientistas, professores  – brasileiros e estrangeiros – e o grande público em um amplo e profundo debate sobre o racismo e a sua urgente superação.

NP: Que novidades vêm por aí? E quais as outras iniciativas o Sesc RJ tem para combater o racismo?

Adriano Rocha: Este ano já trouxemos algumas personalidades para palestrar, como a professora Nilma Lino Gomes, e a advogada Fayda Belo. Este mês, teremos uma palestra com o professor Renato Noguera, que vai abordar o amor a partir da filosofia africana. Outros nomes estão sendo pensados para o segundo semestre. O curso preparatório para mestrado e doutorado foi ampliado para quatro Unidades Sesc RJ. Esperamos contribuir para que mais pessoas negras e periféricas possam alcançar esse lugar – lugar de produção de conhecimento, portanto, um espaço de poder. Estamos planejando também a oferta de uma formação tecnológica para pessoas negras e periféricas. Além disso, nas Unidades Sesc em todo o estado, seguimos com programação em diversos formatos, tais como: oficinas, cursos, palestras, apresentações etc.

NP: Onde o leitor pode encontrar a programação completa de todas as ações do Projeto Consciências?

Adriano Rocha: Temos um Portal da Educação (https://portaldaeducacao.sescrio.org.br/), onde há informações sobre todas as ações da Gerência de Educação do Sesc RJ e também a programação completa do Projeto Consciências. Vale conferir!

Bárbara Souza

Bárbara Souza

Carioca da gema, criada em uma cidade litorânea do interior do estado, retornou à capital para concluir a graduação. Formada em Jornalismo em 2021, possui experiência em jornalismo digital, escrita e redes sociais e dança nas horas vagas. Se empenha na construção de uma comunicação preta e antirracista.

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