A obra autoral QUASEILHAS estreia nesta quarta-feira (10), no Mercado Iaô, em Salvador. O espetáculo é o primeiro brasileiro no idioma yorùbá e tem concepção e direção de Diego Pinheiro, que busca estabelecer e renovar conexões em mergulhos profundos. Essas memória, que parecem isoladas em uma ilha, estão conectadas por algo invisível.
Em QUASEILHAS memória e ancestralidade não são considerados como passado, mas sim como presente. “Quando as pessoas falam de ancestralidade é ligado sempre ao passado, como algo que já foi. Na minha casa, família, há um entendimento que é algo presente e que também tem essa necessidade de tecer coisas futuras. Então, é um entendimento também de que é corpo, DNA. Minha vó, por exemplo, vê todos os ancestrais nascerem de novo”, explica Diego.
A obra cênica integralmente em yorùbá, por meio da literatura do oríkì, – gênero que se faz vivo quando declamado ou cantado -, é uma realização da Plataforma Araká, rede de conexão para a arte negra contemporânea criada por Diego Pinheiro e Laís Machado.
O espetáculo tem a performatividade inspirada na teatralidade yorùbá, por meio dos alárìnjó’s, arte que reverencia os ancestrais e data do século XVII, sempre envolvendo o uso de máscaras, a manipulação de instrumentos musicais, virtuose física e a circulação pelos territórios, para contar histórias e nasce do culto aos Egunguns.
O cuidado para a composição começa desde a escolha do local, que está na Península Itapagipana, bairro da Ribeira, na capital baiana. A região já foi famosa pelas palafitas que abrigavam famílias em situação de vulnerabilidade social. Com esse peso histórico, o Mercado Iaô traz a concepção de centro de artes, entretenimento e economia criativa.
A busca de QUASEILHAS é importante a nível ético. A obra também se preocupa em criar, preencher as lacunas das memórias familiares, uma vez que esses espaços vagos existem por conta de uma política eugênica, de exclusão, que ocorre desde a travessia atlântica e se torna incisivo após o golpe militar de 1889. Além das demandas de um sistema político, social e de mercado.
“Eu acho que o tema é facilmente assimilado no processo capitalista e sendo assimilado ele cria uma demanda que é superficial, em que as pessoas se sentem no direito de assumir alguns discursos. Isso é uma demanda que é de cima e usurpa uma demanda que é de baixo. Esse processo ao meu ver se torna nocivo”, pontua Diego Pinheiro.
Já o uso de oríkì vem para ser uma tentativa de conexão com esses vazios, por meio dos sentidos, das vibrações melódicas existentes neles, por mais que sejam cantadas em outra língua. “O oríkì é uma espécie de identidade em literatura oral que conta a história de um povo, um acontecimento, uma comunidade, uma pessoa, um ancestral, uma família, etc”, exemplifica o diretor.
“Se dizia que um yorùbá ao se apresentar para alguém cantava um oríkì dele ou da família. No Brasil, o oríkì é mais conhecido pelas músicas das divindades. Mas, ele ultrapassa isso e existem vários tipos e classificações. Em Quaseilhas a maior parte são de tradição, chamados oríkì-orinlé; subdivididos entre míticos, geográficos e familiares”, detalha.
A fundadora da Araká, Laís Machado, acrescenta que o oríkì tem um aspecto místico. “Independentemente da língua que estamos usando, existem vibrações que são comuns e captadas, que vão ativar memórias que tem a ver com essa vibração”.
A obra também fala do povo Ijexá – etnia que a família Araúja de Diego Pinheiro pertence, que tem uma quizila com o mar, mas foi obrigada a viver em cima dessas águas paradas. Nas pesquisas, Diego não conseguiu somente informações a respeito da própria família, mas do movimento da península de maneira geral.
Serviço:
O quê: QUASEILHAS – obra cênica de Diego Pinheiro
Quando: 10 de abril a 04 de maio – quarta, às 20h, e quinta a sábado, às 19h
Onde: Mercado IAÔ – Praça General Osório, 33, Final de Linha da Ribeira – Ribeira
Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia) – Bilheteria do Evento ou www.sympla.comm.br