Viver em cidades marcadas por episódios recorrentes de violência não prejudica apenas quem presencia diretamente esses eventos. O ambiente urbano como um todo acaba funcionando como um fator permanente de tensão. Segundo o psiquiatra Dr. Ricardo Patitucci, diretor da unidade Gávea do grupo ViV Saúde Mental e Emocional, o corpo humano responde a sensações de ameaça ativando mecanismos fisiológicos de defesa, mesmo quando o perigo já passou.
O especialista explica que, quando essa ativação “de emergência” se prolonga por dias ou semanas, começam a surgir sinais típicos de desgaste emocional: dificuldade para dormir, irritabilidade, lapsos de memória, problemas de concentração e aumento da ansiedade. Trata-se de uma resposta natural do organismo, mas que pode levar ao adoecimento quando se torna contínua.

Pesquisas reforçam essa percepção. Um estudo realizado com 1.686 adolescentes do Rio de Janeiro, publicado na revista BMC Psychiatry, mostrou que jovens que vivem em áreas mais violentas têm de duas a três vezes mais chances de apresentar transtornos mentais comuns, como ansiedade, depressão ou sintomas físicos sem causa orgânica. Esse aumento é medido pelo indicador estatístico chamado odds ratio, que compara o risco entre grupos expostos e não expostos.
Outra pesquisa, também publicada na mesma revista, acompanhou servidores civis ao longo de vários anos e identificou que quem sofreu violência repetidas vezes teve um risco cerca de 2,1 vezes maior de desenvolver sofrimento psicológico significativo.
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Diante desse cenário, reconhecer sinais de alerta é essencial. Mudanças persistentes no sono, sensação constante de ameaça, tensão muscular e dificuldade de relaxamento indicam que o corpo permanece em hipervigilância. Pequenas rotinas ajudam na regulação emocional: manter horários regulares, reduzir a exposição a notícias estressoras, praticar atividade física e fortalecer laços de apoio.
O especialista alerta que, quando esses sintomas começam a limitar a vida cotidiana, como evitar sair de casa, ter crises de ansiedade ou recorrer a substâncias para aliviar o estresse, é hora de buscar acompanhamento profissional. Para Patitucci, cuidar da saúde mental em cidades violentas deve ser visto como uma questão coletiva, não apenas individual, já que o impacto se espalha por comunidades inteiras.










