Em 20% dos municípios brasileiros, estudantes do 5º ano do ensino fundamental da rede pública têm dificuldades em habilidades matemáticas básicas, como somar moedas de R$ 0,50 ou converter uma hora em minutos. Os dados são do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2023, cujas notas foram divulgadas pelo nesta quarta-feira (14). As regiões Norte e Nordeste do país são as mais afetadas.
O levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostra que, em cerca de 1.137 municípios, os alunos alcançaram, no máximo, 200 pontos na avaliação de matemática, situando-se no nível 3 de uma escala de 10 níveis de proficiência.
Esse desempenho evidencia que esses estudantes conseguem realizar apenas tarefas muito simples, como subtrair números decimais ou reconhecer formas geométricas básicas, mas falham em operações mais cotidianas, como calcular a duração de eventos ou identificar quadriláteros.
Por outro lado, o cenário é ainda mais preocupante nas regiões Norte e Nordeste, onde a maioria desses municípios de baixo desempenho está localizada. Capitais como Natal e Porto Alegre também aparecem entre as cidades com os piores resultados, apesar de serem exceções entre os grandes centros urbanos.
Gabriel Corrêa, diretor de Políticas Públicas da ONG Todos Pela Educação, ressalta a gravidade dos resultados, apontando que a baixa prioridade dada ao ensino de matemática desde o início da trajetória escolar contribui para esse quadro crítico, que tende a se agravar nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.
“Os resultados de aprendizagem de matemática no Brasil merecem destaque, porque são muito críticos. Já no 5º ano, vemos resultados muito fracos, que transbordam e se ampliam nos ensinos finais do fundamental e no ensino médio”, destacou.
Leia também: Nordeste possui as únicas escolas com nota 10 do Ideb nos primeiros anos do fundamental
A pandemia de Covid-19 também é apontada como um fator que agravou as deficiências no aprendizado. Katia Smole, diretora executiva do Instituto Reúna e ex-secretária da Educação Básica do MEC, destaca a necessidade de políticas educacionais bem planejadas para recuperar o aprendizado perdido durante o período de fechamento das escolas. Ela enfatiza que não basta retomar as aulas presenciais; é importante implementar ações sistemáticas que permitam aos estudantes recuperar o que não foi aprendido.
“Não basta retomar as aulas, em especial para os alunos do 5º ano. As redes precisam criar ações muito bem planejadas e sistêmicas para que os estudantes aprendam o que perderam durante a pandemia. Parte do motivo de os resultados não terem voltado, e olha que já não eram bons, vem daí”, disse Katia.
A expansão descontrolada do ensino à distância (EAD) é citada como um fator que prejudica a formação de professores. De acordo com especialistas, muitas dessas graduações são oferecidas a baixo custo e com pouca interação direta entre professores e alunos, o que rebaixa o nível de preparação dos futuros docentes, e por consequência, no ensino da disciplina.
Esses desafios estruturais se somam à desigualdade econômica, que afeta diretamente a qualidade do aprendizado. O processo de escolarização no Brasil é relativamente recente, e a história de exclusão social e econômica ainda pesa sobre muitas comunidades, dificultando o acesso a uma educação de qualidade.
O Saeb, que avalia os alunos do 2º, 5º e 9º ano do ensino fundamental e do 3º ano do ensino médio, é uma ferramenta essencial para medir o desempenho educacional no Brasil. Diferente do Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira (Ideb), que combina as notas do Saeb com os índices de aprovação/reprovação dos alunos, o Saeb foca nas competências em português e matemática, além de, em alguns casos, ciências da natureza e ciências humanas.
Leia também: MPF solicita reposição de aulas perdidas por operações policiais no Rio