Cresce o número de resgate de trabalho doméstico análogo à escravidão

Um levantamento do Ministério Público do Trabalho (MPT), realizado a partir de dados do Ministério do Trabalho o Previdência Social, revela que o número de resgates de trabalho doméstico análogo à escravidão cresceu nos últimos anos e, somente em 2021, 31 pessoas foram resgatadas pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho.

6 milhões de pessoas trabalham como domésticas no Brasil -Foto: Getty Images

A promotoria do MPT revelou que resgatou mais de 58 mil pessoas em situação análoga ao trabalho escravo em fazendas, na derrubada de mata nativa, na produção de carvão para siderurgia, na extração de minérios, na construção civil e até em fábricas, no entanto, a fiscalização em residências é menos pontual por não haver denúncias.

Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 6 milhões de brasileiros e brasileiras são trabalhadores domésticos e 92% desse contingente é formado por mulheres. na maioria negras, de escolaridade e renda baixas. “Mais de 90% das pessoas resgatadas no Brasil desde 2013 foram homens. Quer dizer que, provavelmente, as formas de exploração do trabalho da mulher têm sido ‘invisibilizadas’ pela fiscalização. O trabalho escravo doméstico é uma delas”, afirma a coordenadora nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do MPT, Lys Sobral Cardoso, em entrevista ao Estadão.

Como é o caso de Yolanda Ferreira, de 89 anos. Trabalhou mais de 50 anos na casa de uma família, em um prédio de alto padrão, em Santos, Litoral Paulista. A família a mantinha sem salário e sem sair de casa e foi vítima de abusos físicos e verbais por parte da patroa e de uma das filhas, segundo ação do MPT na Justiça, revelado pela reportagem do jornal Estadão, publicada nesta segunda-feira (27).

Yolanda foi resgatada após a denúncia de uma vizinha nova no condomínio, que não entendia o motivo da empregada dos vizinhos não sair de casa e quando saía, sempre de cabeça baixa e não cumprimentava. A neta de Yolanda, Marcella Cunha, disse que, após o resgate, ela começou a desfrutar de simples prazeres. “Levamos na orla da praia, para tomar água de coco. Fomos ao shopping fazer compras e, pelo que ela disse, nunca tinha ido antes”, revela.

Mais de 58 mil brasileiros foram resgatados de trabalho escravo – Foto: Getty Images

Viviane Cunha, outra neta de Yolanda, conta que a mãe, Elaine, faleceu em 2015, sem saber o paradeiro da mãe e que sempre esteve perto, mas não se encontraram devido ao estilo de vida da avó. “Desde que me conheço por gente, ela procurava pela mãe. Sempre vivemos em Santos e nunca tivemos nenhuma pista dela porque simplesmente ela não tinha vida social, celular. Minha mãe dizia sentir que a mãe dela, Yolanda, estava viva. Achávamos que tinha morrido, pois ninguém vive assim, sem dar notícias”, comenta.

O MPT de Santos entrou com uma ação trabalhista contra a família e pediu indenização por danos morais contra os herdeiros da mulher que contratou Yolanda. Ao todo, a juíza Juliana de Moraes, da 2.ª Vara da Justiça do Trabalho, condenou os herdeiros a pagarem R$ 670 mil à vítima. Além disso, a justiça também condenou a família a pagar um salário mínimo mensal e custear o plano de saúde de Yolanda.

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Procurada pelo Estadão, a família disse que não iria se pronunciar sobre o caso e no processo, os advogados disseram que, a princípio, Yolanda “foi acolhida recebeu salário, mas depois se tornou um membro da família e deixou de trabalhar como doméstica”. No despacho, a juíza ressalta que ainda que a patroa tenha dado casa e comida, “a ausência de pagamento de qualquer salário cerceou a possibilidade de Yolanda seguir outros rumos, causando situação de dependência econômica forçada, que a constrangeu a permanecer sendo explorada por décadas”. A defesa da família também disse que vai recorrer da sentença.

Igor Rocha

Igor Rocha

Igor Rocha é jornalista, nascido e criado no Cantinho do Céu, com ampla experiência em assessoria de comunicação, produtor de conteúdo e social media.

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