A Receita Federal atualizou o documento de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) no mês de abril. Com o principal tema abordado, a unificação dos tributos PIS/COFINS, o Órgão federal levantou a ideia da suspensão tributária das livrarias, interferindo no valor que é repassado ao leitor, podendo os livros ficarem mais caros. Segundo a Receita Federal, os livros são consumidos em sua maioria por compradores com perfil financeiro acima de 10 salários mínimos, ou seja, um valor de R$10.450,00. Com isso, segundo a Receita, não teria sentido manter suspensão tributária sobre as indústrias de livros e papel. A quantia que atualmente não é cobrada seria distribuída para outros setores como a saúde e educação, de acordo com a Instituição.
Não é a primeira vez que o assunto vem à tona, no ano passado o Ministro da Economia Paulo Guedes levantou a proposta da retirada do imposto sobre o mercado dos livros e papel como uma das mudanças da reforma tributária, porém não foi bem aceita pelo congresso sendo “esquecida” até pouco tempo, surgindo novamente com a equipe da Receita Federal que é responsável também pela reforma tributária.
Por que preocupar com alteração tributária
O Brasil, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, realizada em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) possui 10,1 milhões de pessoas que não completaram a educação básica, sendo 7,2 milhões negras, índice que com a instauração da pandemia houve aumento.
O Portal Notícia Preta entrevistou o professor e sociólogo Everton Pereira que revelou como essa decisão do Ministério da Economia pode afetar a sociedade, principalmente de estudantes das escolas públicas. “A tentativa de mudança tributária faz parte de um plano muito maior do que simplesmente o aspecto econômico. A verdade é que quando você muda essa relação de acesso aos livros por conta de valores, obviamente vai atingir com muito mais força as populações mais vulneráveis que já têm dificuldade de acesso a esse tipo de recurso, seja por questões financeiras e ainda mais ligado à questões de formação”, afirma.
Everton ressalta ainda que o aproveitamento do alunos também será comprometido com a medida. “Isso, para os estudantes, incide de maneira muito negativa porque eles não vão ter um aproveitamento necessário para chegar nesses recursos. É com muito espanto que a gente vê esse tipo de alteração e como isso penaliza de maneira exclusiva aqueles que já são penalizados pela realidade social das quais estão envolvidos”, alerta.
O Professor também falou como isso impactaria o desempenho dos estudantes que precisam ter um conhecimento amplo sobre diversas áreas e como a tecnologia ajuda, ao mesmo tempo que não é a solução viável por não contemplar todos que necessitam dessa busca por conhecimento de forma igualitária. “Parte de um pressuposto onde todos possuem acesso a este meio, porém essa não é a realidade. Fico perplexo por esse movimento vir da Receita Federal. Ao realizar essas modificações no mecanismo que tem muitas ramificações, ela nos dá a entender que isso faz parte de um projeto maior de alienação da população e de não busca por conhecimento”, enfatiza.
Elitização da leitura
Everton, além de professor, também é sociólogo e ressalta como essa medida pode mudar uma sociedade. “O grande problema dessa inclinação do Governo Federal é porque ele desvirtua exatamente a discussão de distribuição de renda, pois, quando falamos em taxar ou tributar pessoas mais ricas é por coisas que são de consumo e privilégio deles. Mas isso não é a realidade dos livros, a possível mudança de alteração da tributação, na verdade, é uma maneira de penalizar as classes mais vulneráveis, retirando o foco da discussão real sobre a redistribuição de renda, sendo o ponto mais agravante da situação social brasileira”, afirma. E concluiu informando que toda essa movimentação do Governo entra em um retrocesso sócio-político que incide diretamente no plano ultra neoliberal, elitizando o acesso à educação e busca pelo conhecimento, “contribuindo para desigualdade social e marginalização das pessoas que usam os livros como uma possibilidade de ascensão social, que em são membros de grupos sociais historicamente excluídos”, finaliza.
Projetos sociais e mudança de realidades
A taxa de abandono escolar, de acordo com PNAD de 2019, de adolescentes com idade até 13 anos é de 8,1%, quando se fala de crianças negras vai para 8,6%. Com isso, os projetos sociais detém um papel importante na busca por mudanças dessas realidade através da leitura e arte, porém eles também seriam afetados com essa mudança de lei, já que tem como principal meio de arrecadação a doação de livros e, com o aumento nos preços, essa atitude sofreria redução.
Gláucio Ramos é idealizador do projeto social Leitura na Esquina, iniciado em 2017 e, desde então, já alcançou mais de quinze mil crianças e jovens com atividades de empréstimo e doação de livros, contação de história, concurso de poesia e já beneficiou duas escolas públicas na cidade de Paulista (PE) com bibliotecas completas.
Ao Notícia Preta, Gláucio falou como seria afetado pela suspensão da tarifação tributária no mercado do livro e papel proposta pelo Governo Federal. “É efeito cascata: se os livros aumentam, e eles já são caros, haverá menos consumo e por sua vez menos doações. Nesse percurso, ficaremos impossibilitados de renovar o acervo e atender às crianças e jovens das escolas públicas e periferias“, afirma.
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Segundo o idealizar do Leitura na Esquina, no Brasil, apenas 2,4 livros são lidos por ano, por pessoa, e projetos sociais como o deletem o objetivo de mudar esta situação. Para saber mais informações e para doações, basta entrar em contato pelo telefone (81) 9 8727-0222 ou no clicando aqui.
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