Reportagem: Murillo Otavio
O ator, cantor e compositor Seu Jorge falou sobre a resistência negra existente no filme Medida Provisória, durante a coletiva de imprensa do lançamento oficial em São Paulo, na última segunda-feira (28). O longa é o primeiro filme dirigido por Lázaro Ramos, e estreia nos cinemas brasileiros em 14 de abril, depois de entraves com a Ancine para o lançamento nos cinemas brasileiros.
Seu Jorge (André), Taís Araújo (Capitú), Alfred Enoch (Antonio), interpretam, respectivamente, um jornalista, uma médica e um advogado. O elenco ainda é composto pelas atrizes Adriana Esteves e Renata Sorrah, além da estreia do rapper Emicida como ator. O filme é baseado na peça “Namíbia, não!”, do dramaturgo Aldri Anunciação. O autor participou da adaptação para o cinema, ganhou Prêmio Jabuti de Literatura, com a peça em formato de livro.
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Lázaro Ramos traz aspectos da negritude e a relação com brancos na luta antirracista. A resistência através da ancestralidade ganha força entre a população negra contra a repressão do Estado dentro do filme. A temática acontece num regime autoritário, onde o carnaval é proibido e não existem mais livrarias na cidade. Embora o filme retrate o Brasil, as filmagens foram feitas apenas no Rio de Janeiro.
“Essa obra retrata a violência que os negros sofrem no Brasil. Como essa sociedade nos corrompe, afinal, os personagens são felizes, vivem com sorriso e, depois da medida, passam a ser violentos por instinto de defesa. Isso acontece no Brasil da realidade”, afirma Seu Jorge durante a entrevista coletiva.
Durante a trama, antes da medida provisória entrar em vigor, o advogado Antonio, interpretado pelo ator Alfred Enoch, trava na justiça uma disputa por reparações financeiras pelos longos anos de escravidão em terras brasileiras. Uma mulher idosa seria a primeira a receber pelo sistema de escravidão, mas a transação não se concretiza. A reparação financeira na justiça era desacreditada, o assunto não tinha apelo popular, porém, quando a medida é aprovada, o cenário muda.
Com a medida vigente após votação no congresso – evento que faz alusão a votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff –, o tema ganha notoriedade sobre quais negros eram aptos para migrar e como ficaria a sociedade sem a metade da população. O governo autoritário retratado no filme, então, impõem uma caça aos negros pela polícia. Para não incorrer no crime de invasão a domicílio, a polícia só pode capturar os indivíduos nas ruas. Numa sociedade com o armamento permitido, supremacistas brancos passam a ajudar as autoridades. Perseguidos, os negros promovem aquilombamentos, assim como ocorreu no Brasil na época da escravidão.
Há, no filme, a discussão de qual tipo de negro enquadraria no perfil para migrar ao continente mãe, abrindo o debate sobre o colorismo, termo sobre cores dentro de uma mesma raça. Além disso, o filme também aborda a relação entre etnias na luta anirracista, quando parte da população branca não concorda com a medida do Governo e, dentro do possível, ajuda os negros a fugirem em segurança.
Supremacistas brancos acreditam na ascensão do povo negro por meio de cotas, não por mérito próprio. Há quem diga que os negros estariam roubando postos sociais por essa reparação histórica. Os produtores de ‘Medida Provisória’ afirmaram que o processo para distribuição do filme nos cinemas brasileiros, que obrigatoriamente tem que passar pela Ancine, enfrentou entraves burocráticos desde novembro de 2020.
A obra tinha expectativa de ser lançada ainda em 2021, mas a exibição no circuito comercial foi adiada. A Ancine autorizou a exibição apenas no Festival do Rio, um dos principais eventos cinematográficos e audiovisuais do Brasil. “Medida Provisória” ganhou o Prêmio Especial do Júri. Durante seu discurso, Lázaro Ramos afirmou: “Censura nunca mais”.
A Ancine afirmou, ainda em 2021, que apenas estava seguindo os protocolos. “O filme ‘Medida Provisória’ recebeu para a sua produção o valor total de R$ 2,7 milhões, por meio do Fundo Setorial do Audiovisual. Atualmente o projeto encontra-se na fase de análise do pedido de investimento para a sua distribuição em salas de cinema. O projeto, portanto, segue o trâmite normal no âmbito da agência”, disse a Ancine na época.
“Este filme é sobre resistência negra às agressões físicas e psicológicas que sofremos. E, chega num momento oportuno politicamente para o combate antirracista”, conclui Seu jorge.
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