“É uma história de autodescoberta”, diz escritora Yara Nakahanda Monteiro sobre livro ‘Essa dama bate um bué’

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A escritora Yara Nakahanda Monteiro, nascida em Angola, lançou seu livro ‘Essa dama bate um bué’ e estará na Bienal do Livro, no Rio de Janeiro, em setembro deste ano, para entrar em contato com os leitores e falar sobre a obra. O livro, que fala sobre negritude e vozes que foram silenciadas e que precisam ser ouvidas, segundo a autora, que começou a escrever quando começou a se conectar com suas raízes africanas.

Em entrevista exclusiva ao Notícia Preta, a autora que aos dois anos de idade mudou-se para Portugal, e que adulta morou no Brasil, fala sobre a motivação para escrever a obra, a importância de abordar a questão racial e sobre a história retratada no livro, que na tradução seria “Essa dama é show de bola”, já que bué significa ‘show de bola’.

Yara diz que a ideia de escrever o livro, sobre essa história, surgiu a partir de inquietações que teve enquanto morava no Brasil.

Sobre o que significava para mim ser mulher, ser uma mulher africana e ser mulher com descendência negra. E, foi nesse processo de autodescoberta e de conexão com a minha história pessoal e a História coletiva de Angola e Portugal, que eu comecei a procurar o meu lugar na história e a instigar esse lugar. Nessa busca deparei-me com a História de Angola contada no feminino e na importância das mulheres na luta da independência do país“.

Escritora angolana Yara Monteiro, autora do livro ‘Essa dama bate um bué’ /Foto: Divulgação

Já sobre os temas abordados, Yara Monteiro diz que a história tem haver com autodescoberta. “É uma história de autodescoberta tanto a nível sexual quanto de identidade, que engloba também a história da Angola a partir de um olhar feminino“, diz a autora, que ainda detalha outras questões abordadas no livro.

Considera ainda os processos de desconstrução familiar resultantes dos conflitos armados. Essa rupturas foram herdadas pelas gerações seguintes. A história de Vitória retrata o regresso de uma jovem mulher a Angola em busca de sua mãe. E mãe, aqui, significa a mátria. ‘Essa dama bate um bué’ é uma história de amor e também de guerra, um conto contemporâneo que lida com o passado, um chamado à independência das mulheres como seres políticos. E de seus próprios corpos em busca de liberdade“.

O processo de se reconectar com suas raízes africanas e colocar isso em sua obra, segundo Yara, foi o que a possibilitou o desenvolvimento do livro. “Me reconectei com as minhas raízes africanas no Brasil, onde encontrei a força dos movimentos negros e deparei-me com a escrita de pensadoras e escritoras negras, como Conceição Evaristo, Ana Maria Gonçalves e Bianca Santana. Foi-me possível identificar-me com as suas histórias e palavras negras“, explica a autora, que reforça que tudo começou com a sua chegada no Brasil.

É importante mencionar não ter ocorrido em Portugal. Note-se que no sistema de educação escolar oficial, a África surge, ainda, como “descoberta” pelos europeus.

Por conta disso, sua conexão com o Brasil foi determinante para sua autodescoberta. “Para mim o regresso ao Brasil será o culminar de um ciclo, um marco bastante importante, pois não mais regresso ‘estrangeira’ no meu corpo e na minha existência, mas certa da minha voz africana“.

Capa do livro que será lançado em setembro, na Bienal do Livro do Rio, pela editora Todavia.

Como em seu livro Yara afirma romper com o silenciamento de pessoas negras, a autora acredita que a história que ela conta, não pertence somente à ela. “A história é sempre coletiva, mas é feita de histórias individuais, e é importante manter-se plural. Todas as vozes silenciadas têm o direito de contarem a sua versão e “ocuparem” a Historia oficial de uma nação. Existe em nós a urgência de resgate das nossas narrativas e perspectivas“, destaca.

Com a chegada da Bienal do Rio, Yara Nakahanda Monteiro conta quais são as suas expectativas sobre o impacto do livro em pessoas negras:

Eu espero que o livro desperte questionamentos. Espero também que o Brasil possa conhecer melhor a Angola. Não só as histórias de sofrimento e de corrupção, mas também que aprenda sobre a sua cultura, sobre a sua história e isso através de um olhar feminino“.

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Bárbara Souza

Bárbara Souza

Carioca da gema, criada em uma cidade litorânea do interior do estado, retornou à capital para concluir a graduação. Formada em Jornalismo em 2021, possui experiência em jornalismo digital, escrita e redes sociais e dança nas horas vagas. Se empenha na construção de uma comunicação preta e antirracista.

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