Um levantamento realizado pelo Painel de Monitoramento de Mortalidade Materna do Brasil revela que a grande maioria das vítimas de violência obstétrica no Brasil são as mulheres negras. A pesquisa foi feita com base nos dados do Ministério da Saúde e mostra que 61,3% das vítimas são as gestantes negras.
Ainda de acordo com o levantamento, esses números chegam perto dos dados da década de 1990, o que demonstra um retrocesso nas políticas públicas de atendimento às gestantes. Atualmente, o Brasil registra uma taxa de mortalidade materna de 107,5 a cada 100 mil nascidos vivos. Em países desenvolvidos, esse número é, em média, 12 12 mortes por 100 mil nascimentos, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).
“Não dá para chegarmos a 2022 com tanta morte materna e com mulher sendo tratada com violência. Existem vários protocolos e, ainda assim, os óbitos têm aumentado. É preciso lançar luz sobre essa questão, que fere, frontalmente, o direito das mulheres, principalmente as negras e trans. O aumento das estatísticas não ocorre à toa. Tanguá, por exemplo, não tem maternidade e as mulheres precisam se deslocar para o parto. A obra do Hospital Estadual da Mãe de São Gonçalo segue parada. A gente precisa entender como ocorre esse processo social para avançar no debate”, afirmou a Enfermeira Lúcia*
Legislação falha
Uma situação que dificulta a queda dos números de mortes e violências contras as mulheres durante o parto é a falta de uma legislação nacional que possa regulamentar o parto humanizado. Atualmente, 18 estados e o Distrito federal possuem legislações próprias sobre o tema. São 8 contra violência obstetrícia e 10 sobre parto humanizado.
A falta de regulamentação nacional faz com que casos como o do médico Giovanni Quintela, que abusou sexualmente de uma gestante durante um procedimento de cesárea, sejam recorrentes. Por não fazer parte do Código Penal Brasileiro, as leis estaduais não preveem, por exemplo, prisão do agressor. A legislação paranaense prevê multa de até R$ 100 mil.
Existem projetos em tramitação na Câmara dos Deputados e o mais recente é assinado por 13 deputados de diversos partidos diferentes. “A necessidade de punibilidade é urgente. Violência obstétrica é crime e precisa estar prevista na legislação federal. É um crime de violência que ainda ‘dialoga’ com o crime de gênero”, afirma a coordenadora de educação, serviço e legislação da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras (Abenfo), Kleyde Ventura de Souza, em entrevista ao G1.
Leia também: “Não é convencional sedar gestante”, afirma Thelminha sobre conduta de anestesista
Kleyde ressalta ainda que, no caso do anestesista Giovanni Quintela, as profissionais da saúde tiveram um papel fundamental para a prisão médico, produziram provas para que fosse feito o flagrante. “Há de se exaltar a importância que este grupo de mulheres teve para que a punição, neste caso, fosse realizada. Foram assertivas e fundamentais. Até para que o tema de violência obstétrica fosse retirado de debaixo do tapete”, disse.
No Brasil, o Distrito Federal e Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rondônia, Santa Catarina e Tocantins possuem legislações que citam explicitamente o termo violência obstétrica. Já os outros dez legislam sobre o termo parto humanizado.
Desde 2005, a Lei 11.108 dá direito às gestantes de terem um acompanhante durante o parto e pós-parto imediato em todas as unidades do Sistema Único de Saúde (SUS), de rede própria ou conveniada.
*O nome da fonte é fictício para protegê-la de possíveis retaliações.
0 Replies to “Violência obstétrica: 61% das vítimas são mulheres negras”