Na década de 60, três mulheres negras norte-americanas romperam barreiras e chegaram à NASA (agência espacial norte-americana), contribuindo para as realizações da época. Mais de 50 anos depois, foi a vez de uma jovem negra e brasileira também dar sua contribuição para a ciência. A astrônoma e pesquisadora Carolyne Santos de Oliveira, de 27 anos, fez um estágio de três meses, em Greenbelt, no estado americano de Maryland. Moradora de Duque de Caxias, município da Baixada Fluminense, a estudante do Mestrado em Astronomia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) acaba de voltar dos Estados Unidos. Foi uma das duas alunas do curso selecionadas para a viagem.
Atualmente, Carolyne é a única aluna negra de mestrado no Observatório do Valongo, unidade acadêmica dentro da UFRJ. Na própria instituição onde cursa o mestrado, a pesquisadora convive com o preconceito: “O preconceito na universidade existe, mas ele é muito bem disfarçado. Ninguém nunca me disse que ali não era o meu lugar. Entretanto, já vi professores dizendo que a gente não precisava discutir questões raciais porque não tínhamos esse problema no nosso instituto, mesmo eu sendo a única aluna negra na sala naquele momento. Para uma instituição que compartilha do nome do Cais do Valongo, onde os escravos chegaram no Rio de Janeiro no período da escravidão, esse assunto deveria ser mais abordado”.
Na Nasa, sua função consistia em criar algoritmos pra analisar os dados, que estão em formas de tabelas ou imagens. Mesmo durante seu estágio, ela não teve nenhum contato direto com pesquisadores negros. Mas isso, segundo ela, não deve ser um impedimento: “Eu, particularmente, só conheço uma professora negra em Astronomia, a Dra. Denise Gonçalves. Apesar de ser uma pessoa muito tímida, sei que tenho de mostrar para as meninas negras, que estão pensando em qual curso escolher na universidade, que elas podem escolher algo na ciências exatas e se sentirem representadas”.
Filha de uma revendedora de produtos de beleza e de um militar aposentado, Carolyne lembra que passou por dificuldades financeiras na graduação. Seus pais se separaram, quando ela ainda estava no ensino fundamental. “A escola era paga com a pensão do meu pai e minha mãe teve que ter dois empregos durante essa época para pagar o restante das contas”, lembra a jovem.
Na faculdade, Carolyne entrou, aos 17 anos, para o curso de Matemática. Acabou trocando para Física e, durante a disciplina Fundamentos de Astronomia, decidiu que mudaria novamente, mas para Astronomia. A decisão de mudar de curso também acentuou as dificuldades, já que Astronomia tem muitos livros em inglês.
“Os livros universitários são muito caros. Raras as vezes eu conseguia comprar um. No início da graduação foi pior porque a maioria dos livros disponíveis na biblioteca eram em inglês e eu não sabia nada na época. Então, quando eu recebi a minha primeira bolsa de iniciação científica (R$360 na época), gastei toda ela com um curso de inglês”, relata a pesquisadora.
Para o futuro, Carolyne pensa em seguir a carreira acadêmica, inclusive com planos de tentar o doutorado fora do país. Ela reconhece as oportunidades que teve e acredita que ainda há um longo caminho para que outros negros tenham as mesmas chances: “Consegui vir até aqui com o apoio de muitas pessoas que criaram muitas oportunidades ao longo do meu caminho. A maioria dessas oportunidades foram criadas com dinheiro, o que muitas pessoas negras não têm. Se o nosso país pudesse criar mais oportunidades em educação e investir mais nas que existem, sei que iríamos longe”.