Secretaria de Segurança de Minas não divulga dados sobre letalidade policial: especialista cobra transparência

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UPP officers Nova Brasilia make a foray in the community this morning, April 28, 2014, in the German Favela, suburb of Rio de Janeiro, southeastern Brazil. Photo: FABIO MOTTA/ESTADAO CONTEUDO (Photo by FABIO MOTTA / ESTADAO CONTEUDO / Agência Estado via AFP)

No final do mês de setembro deste ano, a Agência Minas, site de notícias do Governo de Minas Gerais, divulgou uma notícia intitulada Dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública colocam Minas como o estado mais seguro do país. 

No levantamento, realizado pelo Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), foram apurados dados sobre a ação dos agentes de segurança pública nos 27 entes federados e o estado lidera, com os menores índices de criminalidade, segundo o levantamento.

No início de outubro, o presidente da Cufa BH foi vítima de violência policial no Alto Vera Cruz, zona Leste da Capital Mineira – Foto: Rede Globo

Porém, a Sejusp disponibiliza alguns dados em detrimento de outros, conforme relata Rafael Rocha, pesquisador do Instituto Sou da Paz e do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG. Segundo ele, a posição da Sejusp em relação à disponibilização dos dados é dúbia. “Por um lado, alguns dados de crimes violentos, como estupros, roubos e homicídios, são disponibilizados mensalmente no site da secretaria. Por outro, qualquer outro dado além destes disponibilizados no site da Sejusp são de difícil acesso. Entre eles se encontram, principalmente, os dados sobre a letalidade e a vitimização policial, assim como o perfil racial das vítimas de crimes, sobretudo dos homicídios, essenciais para que possamos analisar a dinâmica destes assassinatos”, afirma.  

LAI e os dados da PM 

Um caminho para conseguir dados sobre a atuação das polícias é a Lei de Acesso à Informação (LAI), porém, de acordo com Rafael, falta clareza em relação aos procedimentos adotados pela Sejusp e pelo Observatório de Segurança Pública Cidadã (OSPC), órgão da secretaria responsável por sistematizar esses dados. “A meu ver, em acessar dados de segurança pública por meio da LAI em Minas Gerais, o estado vai na contramão de diversas secretarias de segurança do país. A Sejusp nega fornecer informações básicas, como os bairros em que foram cometidos os crimes, principalmente os homicídios, que como sabemos, se distribuem de forma desigual pelas cidades mineiras”, analisa.

Os estados do Rio, SP e ES estão muito além na divulgação dos dados – Foto: Fábio Motta / Agência Estado

Rafael ressalta também que não existe disponibilização de dados quando se trata das ações policiais, envolvendo mortes de agentes ou crimes cometidos por eles. “Apesar do Observatório de Segurança Pública Cidadã (OSPC) ser o órgão encarregado de sistematizar e analisar as estatísticas e dados oficiais de violência e criminalidade do estado, o OSPC e a Sejusp respondem a esses pedidos negativamente, alegando que as informações relativas à morte em decorrência de intervenções policiais, bem como as mortes de policiais, são competência da Polícia Militar de Minas Gerais e da Polícia Civil de Minas Gerais”, lamenta o pesquisador. 

Registros policiais

Em uma postagem do Notícia Preta na página do Facebook, um policial militar comentou que a própria PM não registra a etnia/raça do abordado. Segundo ele, “em 13 anos de polícia, nunca registrou a raça do abordado, isso pra nós é irrelevante”. De acordo com Rafael Rocha, esta é uma amostra de que a segurança pública em Minas tem retrocedido em relação à transparência nos dados. “Quando comparamos com os demais estados, Minas Gerais certamente se destaca pela falta de transparência dos dados de segurança pública, sendo um dos poucos estados brasileiros que não fornece dados acerca da letalidade e vitimização policial, aspecto central para a compreensão de como tem sido conduzida a política de segurança do estado. Na região sudeste, por exemplo, Minas Gerais é o único estado que não disponibiliza esses dados para a população”, ressalta. 

Um policial comentou na postagem que a própria polícia não registra a etnia/raça dos abordados – Foto: Redes Sociais

Comunicação 

Para o pesquisador Rafael Rocha, é de suma importância que a informação chegue à população e os veículos de comunicação são centrais para a disseminação e debate acerca da segurança pública no Estado. “Mas antes disso, é essencial que o governo de Minas Gerais, por meio da Sejusp, disponibilize de maneira ampla e completa os dados de segurança pública do estado, no modelo de transparência ativa, ou seja, abertos a toda a população, sem a necessidade de pedidos via LAI ou acessos privilegiados (como às vezes ocorre com a grande mídia ou centros de pesquisa). Mais uma vez, nossos vizinhos do RJ, SP e ES têm dado ótimos exemplos de como fazer isso”, pontuou.

Rafael finaliza lembrando que, além da disponibilização dos dados, que é o primeiro passo, a Sejusp precisa adotar a transparência não apenas como uma ferramenta discursiva, mas de forma prática. “A postura de negar o acesso a dados que deveriam ser públicos não contribui para a construção de uma política de segurança participativa e cidadã, pelo contrário, reforça a ideia que segurança é um assunto apenas de polícia e que não deve ser discutido pela sociedade como um todo”, conclui.

Posição do Estado

Em nota, a Secretaria de Justiça e Segurança Pública informou que “em Minas Gerais os dados de letalidade e vitimização policial são de responsabilidade de cada uma das instituições policiais, separadamente. Dados de letalidade e vitimização de policiais militares devem ser solicitados à Polícia Militar e, dados de letalidade e vitimização de policiais civis, com a Polícia Civil”. Até o fechamento desta matéria, as polícias Civil e Militar ainda não haviam respondido os questionamentos.

Igor Rocha

Igor Rocha

Igor Rocha é jornalista, nascido e criado no Cantinho do Céu, com ampla experiência em assessoria de comunicação, produtor de conteúdo e social media.

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