São Paulo celebra os 40 anos de tombamento do Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho

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A comemoração do marco histórico e cultural terá exibição do filme “O Corpo da Terra”, de Day Rodrigues, performance de dança para Ṣàngó, com Cibelle de Paula e homenagem ao Terreiro com a
presença de lideranças da Casa Branca e de personalidades religiosas de São Paulo

O evento celebra os 40 anos do tombamento do Ilé Àṣẹ Ìyá Nasò Ọka, popularmente conhecido como Terreiro da Casa Branca, que é o primeiro estruturado de culto aos Òrìṣà de forma institucional e é referência do candomblé no país. Localizado em Salvador, Bahia, o Terreiro é reconhecido como primeiro Monumento Negro e foi tombado como Patrimônio Histórico Nacional, pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 1984.

Em homenagem a esse legado histórico e cultural, no dia 05 de novembro, a partir das 19h30, o Sesc
Pompeia recebe uma celebração à Casa Branca com a Ìyálòrìṣà Neuza Cruz e Èkejì Sinha, ambas do
terreiro homenageado, e contará com falas do Bàbálòrìṣà Alabiy Ifakoya, do Ilê Àṣẹ Ifá Gbemiga
Ajagùnà Ọlà́Fàdákà, Bàbá Gill Ominirò, da Ìwé Ìmọ̀e da Ẹgbẹ Ominirò Láàlú àti Ọ̀ṣùn, Dr. Hédio Silva
Jr., advogado, doutor em direito pela PUC-SP, fundador do JusRacial, do Idafro e Ọ̀gá, e da arquiteta e
urbanista Gabriela de Matos. A mediação será da Ìyálòrìṣà Luciana de Ọya, do Ilé Ọba Àṣẹ Ògòdò e o
evento contará com performance de dança para Ṣàngó, com Cibelle de Paula.

Sobre a relevância da celebração na capital paulistana, o antropólogo da Ìwé Ìmọ̀: Candomblé,
Conhecimento e Tradição, Bàbá Gill Ominirò, comenta: “no meu entendimento, toda as Capitais
brasileiras deveriam celebrar os 40 anos de tombamento da Casa Branca, porque ele foi essencial para
a solidificação da cultura negra, afro-brasileira, enquanto instituição protegida pelo Estado. É a
celebração do início de um processo de valorização, ainda que tardiamente.”

Crédito: imagem da Ìyálòrìṣà Neuza Cruz, do Terreiro da Casa Branca, em Salvador. Frame do filme
“O Corpo da Terra”, de Day Rodrigues.

A programação integra a comemoração das quatro décadas do tombamento do terreiro e marca a
memória daquele território sagrado e da cultura afro-brasileira como um todo, além de enfatizar a
preservação ritualística do candomblé. Por meio de práticas de enfrentamento ao racismo no Engenho
Velho, na capital baiana, projetos comunitários são realizados, como a Feira de Saúde, com atendimento básico à população, e iniciativas de economia criativa e de proteção ambiental.

E mesmo diante de iniciativas coletivas locais, o Terreiro da Casa Branca ainda enfrenta desafios, Bàbá
Gill chama atenção para a resistência constante, assim como em outros espaços afro- brasileiros em
Salvador, que no século XIX eram bairrosinteiros e, com o tempo, foram diminuindo. Para ele, “mesmo
com uma rede de proteção, a violência institucional ainda é um problema, assim como a violência no
bairro. E isso tem a ver com a falta de políticas públicas para melhorar a qualidade de vida da
população local.”

Outra adversidade está ligada à especulação imobiliária. De acordo com o antropólogo, “há pouco
tempo, uma construção erguida atrás de uma das casas sagradas ameaçava de destruição o espaço.
Foi preciso fazer uma intensa campanha, com Ministério Público, Prefeitura, e até o IPHAN. Por fim,
com muita cobrança, a obra foi demolida.”

Inclusive, a dimensão arquitetônica do Terreiro da Casa Branca é reconhecida como precursora na
arquitetura afro-brasileira. Conforme pontuam os arquitetos Gabriela de Matos e Paulo Tavares, o
Terreiro baiano “serviu de modelo para outros em Salvador e no Brasil”.

Ambos foram curadores da exposição “Terra”: Pavilhão brasileiro na 18a Mostra Internacional de Arquitetura de Veneza, premiada com o Leão de Ouro – inédito no país. Gabriela e Paulo reforçam que, “o mato faz parte da espacialidade típica dos Terreiros, sinalizando uma relação com a terra.”

A relação com a terra, aliás, é o mote do filme “O corpo da terra”, dirigido pela cineasta Day Rodrigues.
O curta-metragem revela a relação da preservação territorial, do meio ambiente, das simbologias,
rastros e historiografias com o pensamento da arquitetura afro-brasileira, a partir das experiências do
solo sagrado e do candomblé do Terreiro Casa Branca. Para Day, “sem folha não há orixá, logo, o
candomblé ensina a conexão com a preservação dos rios e das matas e as arquiteturas da terra, como
pertencimento e a possibilidade de cultivo em comunhão com a vida humana e não- humana.”

A linha narrativa do filme reverbera as vozes de mulheres negras que apresentam um projeto de
continuidade pelo legado fundado há quase dois séculos e, no fim, influenciam o resgate de um
conhecimento e humanidade, historicamente negados. O curta-metragem, também exibido na 18a
Mostra Internacional de Arquitetura de Veneza, no Laboratório do Futuro, ainda aponta as
dificuldades e propõe diálogo para que as novas gerações saibam das ameaças à continuidade do
candomblé e construam repertório crítico, político e afetivo visando a construção da identidade cultural do Brasil, seja na arquitetura, na relação com o meio ambiente e a espiritualidade afro-brasileira.

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