Por Siron Nascimento
Após a surpresa de alguns (inclusive minha) quanto a eleição de Bolsonaro para presidente, além de articular a resistência, mais efetiva do que discursos e denúncias, aos retrocessos que serão impostos, é urgente tentar vislumbrar quais serão os próximos passos da infante democracia brasileira.
O Brasil vive uma grave crise econômica, em cenário internacional de progressivo fechamento de fronteiras, aumento de protecionismo e desvalorização dos Direitos Humanos. Das crises migratórias – seja a que a Europa sofreu (e ainda sofre, com a fuga de sírios e africanos em busca de sobrevivência no Velho Mundo), seja a caravana dos refugiados que atravessa o México em direção aos EUA, seja a entrada massiva de venezuelanos em Roraima – e da guerra comercial encabeçada por EUA e China, o que se pode concluir é que o mundo está cada vez menos solidário, tornando a máxima “farinha pouca, meu pirão primeiro” regra universal. O esgarçamento do tecido social atinge níveis alarmantes nas sociedades capitalistas ocidentais, com ascensão da extrema-direita nos quatro cantos do mundo.
Sem poder contar com grandes investimentos estrangeiros e nem contar com o boom das comodities exportadas pelo Brasil, a geração de riqueza e emprego no país torna-se tarefa árdua. Pior ainda quando somamos a essa equação um parque industrial defasado e em decadência, uma educação pública que resiste em melhorar mesmo com o robusto aumento de investimentos desde 2002, um aparelho estatal custoso e ineficiente, uma dívida pública que ameaça a saúde econômica do Tesouro e impede os investimentos do estado em áreas como infra-estrutura, por exemplo.
A solução apontada por Paulo Guedes, de privatização das empresas estatais, diminuição de encargos trabalhistas (menos direitos), racionalização dos impostos para o setor produtivo (resta saber quais), não parece estar à altura dos desafios a serem superados. Pelo contrário, a vida do povo pode piorar com a retirada de direitos e privatização de serviços essenciais.
Caso os bons frutos dessa temerosa política econômica não apareçam, a ebulição social tende a aumentar; Bolsonaro já demonstrou inúmeras vezes sua incapacidade de acalmar os ânimos, enquanto líder. Aliás, seu crescimento deveu-se justamente por sua qualidade oposta: botar lenha na fogueira.
Ademais, parece que o presidente eleito focará seu governo na pauta dos costumes, com um viés conservador, revertendo os avanços que as minorias conseguiram nos últimos 20 anos.
A criação de um Ministério da Família, que será chefiado pelo extremista religioso Magno Malta, é somente um indicativo do que está por vir. O reflexo no atendimento à mulher na saúde pública, no tratamento dispensado aos usuários de drogas, na garantia de direitos humanos para a população mais vulnerável, no casamento entre pessoas do mesmo sexo, será quase imediato a partir de janeiro de 2019. Ou seja, vai ficar ainda pior para a mulher, pro preto e pros LGBTs.
Resta saber como se comportarão as instituições quando e se o povo for pra rua, como aconteceu em 2013 ou 2015/16; como o triunvirato juízes-militares-evangélicos lidará com manifestações massivas contrárias ao governo Bolsonaro. A verificar.