Um estudo realizado pelo Centro de Estudos Raciais do Insper analisou e destacou as disparidades raciais na abordagem policial em São Paulo, e na classificação de usuário e traficante. Segundo a pesquisa, de 2010 a 2020 a polícia enquadrou como traficante 31 mil negros, em situações semelhantes a que brancos foram tratados como usuários.
O estudo aponta que essas situações acontecem quando flagrados com pequenas quantidades de maconha. A análise sobre o porte da droga, inclusive, está sendo discutida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que retoma o julgamento sobre a diferenciação do porte para consumo próprio para o traficante, nesta terça-feira (25).
Os pesquisadores Daniel Duque, Michael França e Alisson Santos, que lideraram o estudo, concluíram que a probabilidade de indivíduos negros serem indiciados como traficantes é 1,5% maior do que a de brancos. Foram analisados 3,5 milhões de boletins de ocorrência feitos pela Polícia Civil de São Paulo, no período de uma década.
A maior diferença aconteceu em 2016, quando essa chance aumentou. “O estudo mostra como o viés policial no registro das ocorrências podem gerar discriminação racial, resultando em um aumento as chances de os negros serem enquadrados como traficantes do que brancos, variando o tamanho do coeficiente por tipo de substância e ao longo do tempo“.
A pesquisa também destaca uma mudança na legislação no período analisado. “No período contemplado pela nossa análise, houve uma alteração na lei de drogas, substituindo a Lei 11.343/2006 pela Lei 13.840/2019, que alterou aspectos importantes da legislação sobre o tema. A lei anterior estabelecia o conceito de usuário (portador) e comerciante (traficante), enquanto a nova lei buscou legislar sobre o tratamento para usuários e dependentes“.
De acordo com os dados, 80% das apreensões de drogas nos dez anos analisados acabaram em autuações por tráfico, sendo que a proporção de pessoas pretas nas ocorrências se manteve estável (7%). Já a de brancos caiu de 64,7% para 58, 3%, e a de pardos aumentou de 28% para 34,5%. E a maconha foi a substância mais apreendida, aparecendo em 65,2% dos casos de consumo, e 36,3% de tráfico.
O Notícia Preta entrou em contato com a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, que informou em nota que:
“A atuação das polícias de São Paulo com relação ao consumo e tráfico de drogas é baseada na legislação vigente, com critérios objetivos para diferenciar o usuário do traficante, independente da questão da raça, gênero, classe social, idade ou religião. A responsabilidade individual é um princípio jurídico fundamental, onde a punição e a classificação do crime são baseadas nas ações do infrator e não em estereótipos“.
E completou: “As forças de segurança estadual recebem treinamentos contínuos e têm seus procedimentos constantemente aprimorados considerando a política de Direitos Humanos. Por parte da Polícia Militar, as abordagens obedecem aos parâmetros técnicos disciplinados por Lei e são padronizadas por meio dos chamados Procedimentos Operacionais Padrão (POP). Ambas as polícias também possuem corregedorias, que não hesitam em punir seus agentes quando constatada qualquer irregularidade“.
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