Aos 23 anos, a bióloga Mariana Nascimento, moradora de São Mateus (ES), utiliza o Sistema Único de Saúde (SUS) e enfrenta as mesma dificuldades que milhares de brasileiros que contam apenas com o SUS quando necessitam de Atenção Primária à Saúde (APS): o acesso a um atendimento digno.
Assim como Mariana, 69% dos 17,3 milhões de usuários adultos que procuraram algum serviço da Atenção Primária à Saúde (APS) do SUS, são mulheres. Destas, 60,9% são negras, conforme revela o segundo volume da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), publicado na última quarta-feira (21) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para a bióloga, além do tempo de espera, o despreparo dos profissionais brancos quando precisam atender um paciente negro também é um problema:
“Infelizmente estamos acostumados com a demora do atendimento, mas da última vez que eu precisei, fiquei muito chateada. Um médico branco, já idoso, expôs o resultado do meu exame neurológico em um corredor lotado de pacientes. Ele disse que ‘não ia precisar abrir minha cabeça’, de forma muito arrogante, para todos ouvirem”, explica a jovem.
A pesquisa do IBGE teve início em agosto de 2019. Um questionário foi aplicado aos moradores com 18 anos ou mais de idade que tiveram pelo menos dois atendimentos com o mesmo médico em Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou Unidades de Saúde da Família (USF) nos últimos seis meses anteriores à data de entrevista. Além de cor ou raça, foram investigadas características como sexo, grupos de idade, estado conjugal, ocupação e renda dos usuários dos serviços.
Os resultados apontaram que 53,8% dos usuários de APS não tinham emprego e 64,7% tinham renda domiciliar per capita inferior a um salário mínimo. Em relação à idade, 35,8% tinham entre 40 a 59 anos e 65,0% eram cônjuges. Cerca de 94,4% dos usuários analisados não tinham plano de saúde.
O questionário aplicado também solicitava atribuição de notas ao atendimento que os pacientes receberam. Os valores foram usados para calcular o Escore Geral da APS, que varia de 0 a 10. O Escore Geral da APS do Brasil, obtido na pesquisa, foi de 5,9 – número abaixo do escore que indica excelência na atenção à saúde (6,6).
A qualidade do atendimento pode ser algo determinante na frequência dos pacientes às unidades de saúde. A última experiência de Mariana Nascimento por exemplo, deixou-a traumatizada. “Eu fiquei sem entender o tratamento que tive. Mesmo estando na frente de outras pessoas, bastava o médico dizer que estava tudo bem comigo. Desde então não retornei lá”, finaliza a bióloga.
Ainda de acordo com a pesquisa, homens e mulheres têm uma percepção semelhante em relação ao atendimento do serviço oferecido pelo SUS, com notas de 5,9 e 5,8 respectivamente. Assim como os usuários brancos (5,9) e os negros (5,9). Sob a perspectiva da faixa etária, a maior nota foi dada por pessoas idosas, aquelas que têm 60 anos ou mais de idade (6,1), em contraposição à nota dada pelos jovens entre 18 e 39 anos (5,6).
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