Um estudo mostra avanços e conquistas em cidades brasileiras que aplicam a Lei 10.639/03. A pesquisa inédita publicada em fevereiro deste ano, é uma parceira do Geledés Instituto da Mulher Negra e o Instituto Alana, e mostra que com as aulas de letramento étnico-racial em Diadema (SP), houve um aumento da autodeclaração como preto ou pardo entre os adolescentes. subir de 39% para 65,7%.
De acordo com a fase qualitativa do estudo “Lei 10.639/03 na prática: experiências de seis municípios no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira“, a autodeclaração subiu de 39% para 65,7%, registrando um aumento de 26%. A pesquisa traz exemplos de como a aplicação da lei funcionou em Belém (PA), Cabo Frio (RJ), Criciúma (SC), Diadema (SP), Ibitiara (BA) e Londrina (PR).
O aumento da autodeclaração de adolescentes como pessoas negras em Diadema se deve a implementação e promoção do ensino de cultura e história africana e afro-brasileira, para a analista de políticas públicas do Instituto Alana, Beatriz Benedito.
“À medida que aprendem sobre si, eles ganham referências de personalidades negras e passam a se sentir representados, o que reduz a discriminação racial dentro das escolas, melhorando o relacionamento entre os estudantes. Muitos deles passam a ter mais ferramentas e condições de combater o racismo e podem identificar e denunciar casos de bullying e violência racial nas escolas“, disse.
Na etapa anterior, lançada em abril de 2023, a pesquisa quantitativa revelou que 71% das Secretarias Municipais de Educação — ou seja, 7 em cada 10 — descumprem a principal lei de combate ao racismo nas escolas.
Uma professora da rede municipal de Ibitiara (BA) conta que a educação antirracista contribui no fortalecimento da autoestima das crianças da escola. ”Eu percebo crianças mais felizes, interagindo mais e melhor com o outro, respeitando mais seu coleguinha. Hoje, por exemplo, é comum a criança chegar com seu cabelo afro e cacheadinho solto na escola e ninguém fazer chacota”, afirma.
Entre os principais destaques de cada município, apontados pelo estudo, para a promoção de uma educação antirracista, estão os seguintes:
Belém (PA):
- Criação de uma coordenadoria especializada;
- Elaboração de um diagnóstico da rede de ensino;
- Plano de ação organizado com o compromisso antirracista;
- Formação continuada e específica para diferentes equipes;
- “Censo da negritude” para orientar os professores e trabalhar temas como a influência negra no bairro ou na cidade;
- Reconhecimento da matriz de saberes quilombola, que foi considerada na alimentação da escola.
Cabo Frio (RJ)
- O professor está no centro do projeto, e a cada ano um docente é convidado pela secretaria para ser o “dinamizador de rede” responsável pelas ações de educação antirracista;
- As escolas e professores são protagonistas e têm autonomia na elaboração de projetos que façam sentido para as suas comunidades;
- As redes estabelecem parcerias com universidades para a formação continuada de seus docentes;
- São feitas constantes parcerias com outras instituições, como museus e centros culturais, para organizar visitas de alunos.
Criciúma (SC)
- A diversidade e inclusão estão na base das diretrizes curriculares da educação infantil e ensino fundamental;
- Há uma planilha para as escolas da rede registrarem as ações desenvolvidas que serão realizadas ao longo do ano, que devem ser apresentadas à coordenadora do Programa Municipal de Educação para Diversidade Étnico-Racial (PMEDER), para facilitar o acompanhamento;
- Diferentes parcerias com museus e instituições, para a realização de atividades como visitas, palestras e oficinas em lugares como museus e quilombos;
- A Escola de Pais, que ocorre semestralmente e traz as famílias para perto da discussão na comunidade e na escola.
Diadema (SP)
- Criação do Dandara e Piatã, programa oficial específico da prefeitura para seleção de professores de história e cultura africana, afro-brasileira e indígena;
- Investimento em material didático específico, de alta qualidade e caráter artesanal, com apoio de entidades negras do município;
- Utilização de jogos de tabuleiro, como o africano Mancala Awelé e o indígena Jogo da Onça, de forma integrada às atividades escolares;
Ibitiara (BA)
- Promove formação continuada de educadores;
- Planejamento anual construído de forma coletiva durante a Jornada Pedagógica para orientar as ações de educação antirracista;
- Diversos projetos realizados durante o ano: peças teatrais feitas a partir de lendas africanas, valorização de personalidades negras inspiradoras, estudos sobre as conexões atuais e históricas entre o Brasil e a África.
Londrina (PR)
- Comissões anuais de diversidade nas escolas, cuja função é garantir a presença de profissionais das escolas — um coordenador pedagógico, um diretor e um professor — nas formações disponibilizadas pelas secretarias, para que as experiências sejam replicadas;
- Atuação estreita do movimento negro junto à secretaria, para manter as equipes engajadas, e por meio de constantes rodízios, para que todos os profissionais atuem nos projetos;
- Trabalho com receitas tradicionais de comunidades quilombolas do estado e visitas a hortas comunitárias;
- Mostra de trabalhos escolares sobre a questão racial em espaços públicos da cidade, como rodoviária, biblioteca pública e centro de atenção ao idoso.
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