Por Casa das Pretas*
Conhecer a história e analisar fatos que pontuam as campanhas de engajamento nas perspectivas de desenvolvimento sócio político, é ponto de partida para efetivar o processo de humanização de qualquer povo. Questões relativas ao racismo, que ainda precisam ser muito debatidas, têm a mesma intenção em todo mundo.
Práticas racistas diferem de lugar para lugar e a maneira como vai incidir na vida de cada pessoa, vai variar de acordo com a posição geográfica que ela ocupa, suas histórias, seu desenvolvimento e entendimento estrutural, consequentemente determinará a característica de cada nação.
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Enquanto isso no Brasil…
O Brasil é um país de altíssimo índice de práticas racistas, todavia com uma população que pouco assume atitudes de preconceito racial e outros ainda demonstram não compreender de fato a dimensão do problema.
Fato histórico mais do que sabido, é que esta nação de matas verdejantes, de águas límpidas e um povo abençoado e feliz poeticamente cantado em verso e prosa, foi a última a abolir o processo de escravização de pessoas. Isso depois de longos 388 anos.
A crença de ser um país no qual se habita em um “paraíso racial” onde é possível viver plenamente a diversidade, as tradições culturais e religiosas é uma forma de ignorar a presença cotidiana de um conjunto de crenças que negam a hierarquização racial e os sistemas de opressão.
Neste sentido, conflitos raciais e, consequentemente, os efeitos concretos do racismo se evidenciam nas relações pessoais, nas instituições e na própria estrutura de Estado.
A lenda da Democracia racial, baseada em um cenário de Casa Grande e Senzala, idealizado e, até mesmo acreditado, por Gilberto Freyre, é uma estrutura que sustenta a sociedade brasileira e que exerce práticas segregatórias de exclusão e invizibilidados sob sua égide.
Assim, destila de forma silenciosa (talvez nem tanto nos últimos tempos de tecnologias avançadas) e muito perversa essa mazela, fazendo com que as pessoas diversas duvidem da própria percepção de que determinadas situações, nas quais estão inseridas, nada mais são do que práticas sutis do racismo.
O discurso falacioso dessa tal “Democracia Racial” brinda um ideal de igualdade de oportunidades onde reside uma possibilidade de amenizar a responsabilidade pelas desigualdades, evitando discutir as inúmeras dimensões de privilégio do branco, ou mesmo a herança simbólica e concreta, que foi fruto da apropriação de quatro séculos do trabalho de outro(s) grupo(s).
Declarações meritocráticas das possibilidades de existência compactuam com as desigualdades e as injustiças. Em uma sociedade racista, é preciso discutir as regras que a regem e não basear a sua construção nas exceções.
O mito da democracia racial no qual o Brasil se ancora e nega as suas estruturas racistas, cria conceitos e procedimentos que intentam na manutenção da hierarquização de pessoas negando suas existências.
A exemplo disso, fala-se de colorismo, que de acordo com pesquisadora Alessandra Devulsky, é, “basicamente, um conceito, uma categoria, uma prática, mas sobretudo é uma ideologia na qual hierarquizamos as pessoas negras de acordo com o fenótipo que têm”
Neste campo de hierarquização e exclusão, baseada no preconceito racial, nesta escala cromática, “quanto mais se aproxima daquilo que é branco, mais as pessoas passam a ser vistas como humanas, menos pretas, menos selvagens, menos tribalizadas, atrasadas e primitivas”, segundo Messias Basques, doutor em antropologia pelo Museu Nacional.
É como se fosse uma paleta de cores a ser seguida como um procedimento classificatório na tentativa de diferenciar as tonalidades da pele e atribuir graus de existências.
Fática é a ideia de que é preciso entender, estudar, discutir e assumir posições de interesses de forma orgânica nas problemáticas raciais que pontuam e incidem contundentemente nas relações pessoais estruturante do cenário atual, fomentando um movimento de força contra os ideais de retrocesso que ainda vigoram. Estudo, informação e conhecimento salvam nações e promovem a humanização.
*Casa das Pretas é um espaço de afetos e aconchegos, além de práticas e orientações jurídicas, fundada por Cristina Tadielo, Advogada, Educadora e Pesquisadora; Luísa Helena, Advogada e Doula; Záira Pereira, Advogada e Professora; e conta com a colaboração de Tatiana Pauline, que também é Advogada.
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