“Boi Mansinho e a Santa Cruz do Deserto”: espetáculo entra em cartaz no Espaço Clariô (SP)

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O Grupo Clariô de Teatro apresenta o espetáculo “Boi Mansinho e a Santa Cruz do Deserto”, sob direção de Cleydson Catarina e Naruna Costa. Serão 12 apresentações gratuitas até o dia 11/12 (de quinta a domingo), no Espaço Clariô, sempre às 20h.

A montagem é baseada na história do massacre da Irmandade Caldeirão da Santa Cruz do Deserto (Crato – CE). A comunidade autossustentável, liderada pelo beato José Lourenço, foi dizimada no primeiro bombardeamento aéreo das Forças Armadas Brasileiras, na primeira metade do século passado.

Foto: Sérgio Fernandes

O início da irmandade da Santa Cruz tem marco em 1921, quando o industrial Delmiro Gouveia dá a Padre Cícero – de quem José Lourenço era discípulo – um Boi de raça Zebu,  que diziam ser tratado como santo, tamanha era sua brandura. Os inimigos de Padre Cícero espalharam boatos a respeito da adoração do boi e, por conta disso, o animal foi morto.

“O afeto da comunidade por esse boi, preto, tal qual o Beato Lourenço, instigou os poderosos de alpendre, farda e batina, a iniciarem ações explícitas de ataque à identidade simbólica daquele povo”, conta Cleydson Catarina.

No espetáculo, o Grupo Clariô faz um paralelo entre a perseguição à irmandade liderada por Zé Lourenço e a narrativa de uma fictícia comunidade de Boi Bumbá, formada na periferia de SP dos tempos atuais, por um dos últimos sobreviventes do Caldeirão, o Mestre Joaquim.

Esta comunidade também é atacada pelo Estado e impedida de colocar o Boi na rua. Em uma narrativa alegórica que segue a estrutura da “liturgia do Boi” (nascimento, batismo, morte e ressurreição), o espetáculo tece encontros entre o passado e o presente, com histórias de lutas que se repetem ao longo do tempo.

O ator, diretor, mascareiro, bonequeiro e aderecista Cleydson Catarina e Naruna Costa, premiada pelo APCA na direção de “BURAQUINHOS – ou – O Vento é inimigo do picuma”, em 2018, dirigem em parceria o espetáculo, cuja dramaturgia é assinada pelo dramaturgo cearense Alan Mendonça com a colaboração do poeta paulista Ubere Guelé.

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“Apesar de toda tragédia anunciada, a peça tem uma encenação recheada de profunda beleza: carrega cantorias, bonecos e muitas cores, inspiradas na riqueza da cultura popular de um povo plural e místico, amparado pelo sagrado e pela força do trabalho. Que ousou formar uma comunidade solidária e autônoma, inspiradora, como tantos outros quilombos Brasil afora”, revela Naruna Costa.

O massacre de Caldeirão de Santa Cruz do Deserto, com ecos vivos do massacre de Canudos, ainda repercute hoje, embora sob alguns disfarces: autocracias, racismo religioso, disputa ideológica, intervenção militar, especulação imobiliária  e genocídio negro.

A história não é linear: ela conta e se reconta o tempo todo. “Boi Mansinho e a Santa Cruz do Deserto” desata o nó sobre essa ferida brasileira e propõe pelo teatro o caminho curativo que vai dar no renascer desse povo.

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