Fonte: AFP
O governo sudanês declarou persona non grata o enviado da ONU, o alemão Volker Perthes, a quem acusa há semanas de ser o responsável pela guerra no país, onde os combates continuam nesta sexta-feira (9) perto do maior complexo militar sudanês.
“O governo da República do Sudão notificou o secretário-geral das Nações Unidas que declarou Volker Perthes (…) persona ‘non grata’ a partir de hoje”, disse o Ministério das Relações Exteriores em um comunicado na quinta-feira.
Esta decisão foi tomada “porque (Perthes) se aliou a alguns partidos políticos e insistiu que a vida política inclui apenas alguns partidos e exclui outros”, disse à AFP uma fonte do governo, que pediu anonimato.
O governo “pediu às Nações Unidas” que Perthes “fosse substituído” e diante de sua recusa, “não houve outra opção a não ser tomar essa decisão”, acrescentou.
O chefe do exército sudanês, general Abdel Fatah al Burhan, havia exigido a demissão de Perthes, acusando-o de ser o responsável pelo conflito ocorrido em 15 de abril com os paramilitares do general Mohamed Hamdan Daglo.
LEIA TAMBÉM: Combates se intensificam no Sudão e trégua de uma semana é acordada
Nessa carta dirigida à ONU, o general Burhan acusava Perthes de ter “ocultado” em seus relatórios a situação explosiva em Cartum antes do início das hostilidades.
Sem essas “mentiras”, o general “Daglo não teria lançado suas operações militares”, afirmou.
Os confrontos começaram no dia em que foi marcada uma reunião entre os dois generais rivais para negociar a integração das Forças de Apoio Rápido (FAR) paramilitares ao exército regular, como a ONU vinha exigindo há semanas.
Embora muitos observadores tenham previsto um fracasso para a reunião, Perthes expressou “otimismo”. Após a eclosão da guerra, ele reconheceu que foi pego de surpresa.
Quando o general Burhan enviou sua carta acusatória, Perthes estava em Nova York. E desde então, as autoridades não emitiram mais vistos para estrangeiros.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, manifestou então sua “total confiança” em seu enviado.
Mas no início de junho, a missão da ONU no Sudão, chefiada por Perthes, foi prorrogada por apenas seis meses e não por um ano, como acontecia desde sua criação em 2020 para apoiar a transição democrática após a ditadura de Omar al Bashir.
– Combates –
No terreno, os confrontos continuam nesta sexta-feira entre militares e paramilitares nas imediações do maior complexo militar do Sudão, a fábrica de armas Yarmouk, em Cartum, disseram testemunhas à AFP.
Na madrugada de quarta para quinta-feira, testemunhas relataram um grande estrondo e um incêndio, após a explosão dos depósitos da instalação petrolífera de Al Shajara, perto de Yarmouk.
Os combates duram mais de 48 horas, segundo testemunhas.
As FAR anunciaram na quarta-feira “uma nova vitória com a tomada do complexo de Yarmouk e dos seus depósitos de munições” e asseguraram a retirada dos soldados do exército, abandonando grandes quantidades de equipamento e viaturas militares.
As colunas de fumaça na capital são visíveis a mais de 10 km. Os bairros do leste foram bombardeados nesta sexta-feira, segundo moradores.
A guerra atual já causou mais de 1.800 mortes, segundo a organização ACLED, especializada na coleta de informações em zonas de conflito.
Quase dois milhões de pessoas deixaram suas casas e 25 milhões dos 45 milhões de habitantes precisam de ajuda humanitária, segundo a ONU.
A situação está estagnada, com múltiplas tréguas que não foram respeitadas. Uma tentativa de mediação dos Estados Unidos e da Arábia Saudita foi cancelada em 1º de junho.
Os hospitais das zonas de combate funcionam apenas parcialmente e a crise pode agravar-se com a chegada das chuvas, sinônimo de malária, insegurança alimentar e desnutrição infantil.