A tradicional Festa Literária Internacional de Paraty chega neste ano a 20ª edição trazendo pela primeira vez uma mulher negra como a principal autora homenageada. Em 2022, a escritora, professora e abolicionista maranhense Maria Firmina dos Reis será a autora homenageada.
A festa que chegou a homenagear como autores principais um escritor considerado difusor de estereótipos danosos contra mulheres negras como Gilberto Freyre, em 2010, tinha, até esse ano, apenas quatro mulheres entre as principais homenageadas. Dentre outros autores negros já homenageados, todos homens, estão Machado de Assis, em 2018 e Lima Barreto, em 2019. O primeiro autor a ser homenageado pela Flip em 2003 foi o poeta Vinicius de Moraes. Em 2017 a autora Conceição Evaristo encerrou a festa conduzindo a última mesa.
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Neste ano, a escritora maranhense, Maria Firmina dos Reis recebe o lugar de destaque no evento internacional que em sua última edição presencial em 2019 chegou a reunir 8,6 mil pessoas na tenda principal onde se concentram as discussões e palestras. A feira está prevista para acontecer entre os dias 23 e 27 de novembro de 2022.
Maria Firmina dos Reis: heroína antiescravagista e a primeira escritora brasileira
De acordo com o levantamento da Biblioteca Nacional o romance “Úrsula” nomeado como “romance original por uma maranhense”, foi anunciado em um jornal pela primeira vez em 1860. As pesquisas revelam que o livro tenha sido escrito e publicado um ano antes, em 1859, ou seja, dentro do período escravocrata brasileiro que teve fim em 1888.
A historiadora Leliane Amorim Faustino, pesquisadora da trajetória de Maria Firmina dos Reis, recorda que a história da escritora maranhense foi recuperada depois de um longo período de esquecimento através do esforço de pesquisadoras e pesquisadores como Régia Agostinho da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e Luciana Diogo da Universidade de São Paulo (USP). Faustino ainda destaca a importância de se falar sobre Maria Firmino principlamente no bicentenário da autora.
“Uma mulher negra, descendente de pessoas escravizadas. Através de seu engajamento político, que
se realizava no plano literário, a autora se posicionou de forma abolicionista e antirracista em
seus escritos, denunciando os cenários da escravidão em seu contexto e centralizando suas
personagens negras, que falavam por si nas tramas” exalta a historiadora.
No prólogo do livro a autora já antevia o esquecimento da obra que voltou a ser conhecida apenas recentemente, em 2017: “Sei que pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de educação acanhada e sem trato e a conversação dos homens ilustrados, que aconselham, que discutem e que corrigem…”, lembra Reis mas diz que ainda assim o publica como tentativa.
Devido a publicação dessa obra considerada um romance antiescravagista Maria Firmina é considerada a primeira escritora brasileira. A maranhense ainda coleciona outros títulos como a primeira professora a fundar uma sala de aula mista, onde podiam estudar meninos e meninas, o que era incomum para a época. E a primeira mulher a ser aprovada em um concurso público no interior do Maranhão, quando ela conquistou o direito de exercer a profissão dedicada ao ensino. A autora morreu aos 95 anos na cidade de Guimarães onde morou durante toda a vida.
Ainda para a historiadora Leliane Amorim Faustino outras muitas homenagens e ações inspiradas por Maria Firmina precisam circular pelo país e pelo mundo. A pesquisadora convida que neste ano celebremos “a grandeza, o patrimônio cultural e intelectual do nordeste brasileiro e reivindiquemos o direito à educação e à literatura. Viva Maria Firmina dos Reis!”, finaliza.
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