Um milhão e meio. Essa foi a quantidade aproximada de pessoas negras, levadas de África, que desembarcaram no Cais do Valongo como escravizadas. Localizado na zona Portuária do Rio de Janeiro, a região hoje conhecida como “Pequena África” possui não só o Sítio Arqueológico do Valongo, mas uma série de pontos históricos e importantes para a cultura afro-brasileira.
A partir da Lei Municipal de Incentivo à Cultura (Lei do ISS) a L’Oréal Brasil se tornou parceira do Circuito de Oficinas de História e Cultura Afro-brasileira do Instituto Pretos Novos (IPN). Para destacar a colaboração, a L’Oréal convidou o Notícia Preta para percorrer uma parte do circuito na última terça-feira (06), na companhia de duas mulheres negras referências de empoderamento e beleza e de fortalecimento de narrativas negras, as atrizes Taís Araújo e Zezé Motta.
Circuito pela Pequena África
O tour teve início próximo ao Cais do Valongo, com um bom samba e aos pés de um Baobá, uma espécie típica do continente Africano, que foi plantado como parte do movimento de preservação da região. De acordo com o professor de história responsável, Alcino Amaral do Projeto RioMemóriaAção, o circuito começa neste lugar porque o Baobá é considerada uma árvore que nutre física e culturalmente as comunidades em África.
Posteriormente, já à beira do Cais do Valongo, o circuito continua destacando que neste lugar funcionou o maior porto de desembarque de escravizados das Américas. De acordo com o professor Alcino, o lugar construído com dinheiro público, representa a participação ativa do estado no comércio de pessoas escravizadas, até mesmo depois de se tornar ilegal.
Além disso, ele reforça a importância de preservar esses lugares, mas também relembra a dor que ele provoca. “Estamos falando de um processo que foi traumático para as sociedades africanas. Estamos falando de famílias que foram destruídas, de uma história de destruição e violência”, contou o professor.
Para o Notícia Preta, a atriz e cantora Zezé Motta disse que o circuito é muito importante para se refletir sobre o passado, e sobre a sua associação com a situação de pessoas negras ainda nos dias de hoje.
“É importante para que a gente se debruce mais tempo nesta reflexão,e é necessário se dar um prazo para fortalecer a luta e tentar uma virada. E esse é o tipo de atividade que precisa ser divulgado”, explicou Zezé.
Dando seguimento ao circuito, a próxima parada foi a famosa Pedra do Sal, considerada um dos berços do samba carioca. Por isso, com uma apresentação musical descontraída dos parceiros do professor Alcino, os músicos Thiago Sereno, Gláucia Maciel e Caio Henrique, foi possível entrar no clima do que a Pedra do Sal representa.
Segundo o professor Alcino, antes conhecida como Pedra da Prainha, recebeu o nome atual por ter sido utilizada por trabalhadores de um Trapiche de Sal da região, para descansar as sacas de sal. Durante esse período, aproveitavam para trocar experiências e se mobilizar política e culturalmente, tornando-se ao longo dos anos um exemplo de quilombo urbano frequentado por grandes nomes da resistência contra o racismo, como João da Baiana e Tia Ciata.
O tour termina no Museu Memorial – Instituto Pretos Novos, com um acervo impactante e emocionante da cultura afro-brasileira, e com os restos mortais de pessoas trazidas como escravas para o Brasil, encontradas pela equipe arqueológica do IPN. Após explicações sobre o surgimento do museu, a emoção aparente foi seguida por um momento de silêncio.
Muito comovida, a atriz Taís Araújo confessou que o ambiente lhe causa um certo incômodo. “É muito desconfortável estar nesse lugar, mas ao mesmo tempo, é extremamente importante e fundamental!”, enfatiza. Mas para Taís, a dor pode ser utilizada como força para mudar as violências que a população sofre ainda hoje.
“Mas aí eu penso…tá bom, vou chorar, ficar de luto. Mas para além do meu choro, da minha dor e do meu sofrimento, o que eu posso fazer? E aí vem uma força gigante que reafirma o meu trabalho. Eu saio daqui muito sensibilizada e também muito mais forte”, explicou Taís.
Após o final do tour, Zezé Motta, que acompanhou todo o percurso com muita atenção, explicou como o aprendizado da história contada por meio dos lugares visitados não só pode como deve ser conhecida não só por pessoas negras, já que o racismo estrutural é uma questão que envolve toda a sociedade.
“Eu gosto muito de ver pessoas brancas envolvidas nessa causa, participando, pois isso não pode ser apenas uma questão do negro, é uma questão nacional”, finalizou.
Oficinas
Como parte da parceria, serão oferecidos mais de 45 cursos imersos na temática racial e na cultura negra, de forma totalmente gratuitas e online. Os cursos que contam com tradutores de libras, se comprometem em transmitir de forma acessível, conhecimento e aprendizado sobre a história e os trabalhos desenvolvidos na Zona Portuária , e na Pequena África mais especificamente.
As oficinas são ministrados por historiadores, sociólogos e jornalistas, com duração de 12 meses. Para se inscrever, clique aqui.
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