A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou nesta terça-feira (30), o novo Atlas dos Conflitos no Campo, revelando que, entre 1985 e 2023, foram registradas 50.950 ocorrências de violência e disputas no meio rural brasileiro. Segundo o levantamento, 80% dos conflitos foram provocados por fazendeiros, empresários, grileiros e o próprio Estado, enquanto apenas 20% estiveram ligados a ações de movimentos sociais, como ocupações e acampamentos. O estudo expõe um cenário de aumento histórico da violência no campo, que cresceu 444% em quase quatro décadas.
Conflitos pela terra dominam registros
Do total de ocorrências, 41.109 (80,8%) foram disputas por terra. Dentro desse grupo, 31.013 casos (60,9%) envolveram violência contra ocupações e posse, e 10.096 (19,9%) corresponderam a ações diretas dos movimentos sociais, como 8.944 ocupações e 1.152 acampamentos.
A CPT ressalta que não há separação entre conflitos por terra, água, fauna ou flora, já que todos estão ligados à sobrevivência das comunidades rurais. Ainda assim, os conflitos por água representaram 6,8% (3.485 casos), evidenciando a disputa por recursos naturais.
Trabalho escravo ainda marca o campo
Outro dado alarmante é a permanência de condições degradantes de trabalho. Desde 1985, a CPT contabilizou 4.332 ocorrências de trabalho escravo, envolvendo mais de 191 mil trabalhadores, além de 807 casos de superexploração laboral. Juntas, essas situações representaram 10,1% dos conflitos totais.

O papel dos agentes hegemônicos
Ao excluir disputas metodologicamente secundárias, como garimpo e políticas agrícolas, o Atlas aponta que 38.798 ocorrências foram de violência direta do poder público e privado, enquanto 10.103 vieram de ações dos movimentos sociais. Assim, quase oito em cada dez conflitos (79,4%) resultaram da ofensiva de agentes hegemônicos.
Fazendeiros apareceram como os principais violadores, sendo responsáveis, em média, por 47% das ocorrências no período inicial. Em alguns anos, como 1985 e 1989, superaram 80% dos registros.
Picos de violência e mudanças políticas
A evolução histórica dos conflitos mostra como a violência no campo se relaciona a conjunturas políticas e econômicas.
- Anos 1980: logo após a redemocratização, os conflitos dobraram em dois anos, impulsionados pela pressão por reforma agrária e pela repressão de fazendeiros e do Estado. Foi nesse contexto que surgiu a União Democrática Ruralista (UDR), organizada para conter ocupações e reivindicações.
- Década de 1990: o governo FHC registrou a média de 1.097 conflitos anuais, com destaque para a força das ocupações lideradas pelo MST, que chegaram a representar mais de 40% das ações em alguns anos.
- Anos 2000: houve aumento expressivo, chegando a 1.838 ocorrências em 2005, recorde até então. O período coincidiu com o crescimento do agronegócio e o aumento do preço das commodities.
- Período 2015-2023: chamado pela CPT de “ruptura política”, foi o mais violento. Durante o governo Bolsonaro, os conflitos chegaram ao maior nível da série, com 1.962 ocorrências em 2019. O Estado voltou a atuar como protagonista da repressão, chegando a responder por 36% das ações de violência em 2020.
Tendência de alta e dispersão territorial
No balanço histórico, os conflitos no campo cresceram 444% desde 1985. Houve momentos de refluxo, mas o Atlas aponta que, desde os anos 2000, o Brasil vive em um patamar mais elevado e persistente de violência no campo, com dispersão territorial e aumento da presença de agentes privados armados.
Para a CPT, os números evidenciam que a violência não é episódica, mas um traço estrutural da formação social brasileira, ligado à concentração de terras e à ausência de uma reforma agrária efetiva.
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