O número de denúncias de racismo e injúria racial em ambientes digitais vem crescendo ao longo do tempo. O ano de 2024 registrou o maior volume de relatos desde 2011, com 452 casos reportados ao Disque 100, de acordo com a mais nova pesquisa desenvolvida pelo Observatório Racismo nas Redes, realizada pelo Aláfia Lab.
O estudo, intitulado “Brasil mostra tua cara”, buscou compreender o avanço desses crimes no ambiente online, identificar o perfil das vítimas e dos agressores, além de evidenciar os desafios na responsabilização dos autores das violações.

De acordo com o estudo, a maioria dos casos registrados, em que o gênero e a cor foram declarados, têm mulheres como vítimas (61%). Os homens representam 37% dos denunciantes. A cor da pele é outro elemento-chave: 90% das vítimas se autodeclararam negras, sendo 66% pretas e 24% pardas.
Esses dados sugerem a atuação de um padrão de colorismo, indicando que pessoas de pele mais escura são mais vitimadas nas redes. Nos registros em que as vítimas informaram o perfil dos agressores, a predominância foi de pessoas brancas (70%) e do gênero masculino (55%).
A maioria dos suspeitos têm entre 25 e 40 anos, o que aponta para uma concentração dos autores dos crimes entre adultos economicamente ativos, com forte presença em redes sociais e espaços públicos. A pesquisadora responsável pelo mapeamento e análise de casos, Letícia Alcântara, pontua que entender as denúncias do canal é fundamental para ter uma visão concreta e nacional do racismo online.
“Muitas vezes, o debate sobre o racismo online fica restrito a casos pontuais que ganham repercussão na mídia, mas o banco do Disque 100 mostra a dimensão real e cotidiana dessa violência”, argumenta.
O Disque 100 é um canal de denúncias gratuito, sigiloso e disponível 24 horas por dia, mantido pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, conforme previsto no Decreto no 10.174, de 13 de dezembro de 2019. Por meio dele, qualquer pessoa pode relatar casos de violações de direitos humanos, inclusive crimes de racismo e injúria racial cometidos em ambientes digitais.
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Uma das dificuldades apontadas na pesquisa é a identificação dos suspeitos. Grande parte das vítimas não informa dados sobre os agressores, como cor, idade e gênero. Essa lacuna revela uma característica dos crimes cometidos em ambientes digitais, nos quais os denunciados se aproveitam do anonimato para escapar da responsabilização. Por isso, a ausência dessas informações compromete o aprofundamento das análises e evidencia a urgência de mecanismos que melhorem a identificação dos autores das violações.
“Tornar visíveis as formas e estratégias do racismo online é condição para neutralizar o mascaramento, fortalecer os mecanismos de combate e garantir que a punição seja não apenas possível, mas efetiva. Ao retirar o véu da ambiguidade, combatemos não só a distração imposta pelo racismo, mas também seu poder de se reproduzir impunemente”, aponta Letícia.