O uso do branco em velórios é uma tradição das religiões de matriz africana, como o candomblé, e carrega um significado espiritual profundo. Essa simbologia chamou a atenção no velório da cantora Preta Gil, realizado nesta sexta-feira (25), no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Diferente do preto, que costuma representar luto na cultura ocidental, amigos e familiares da artista escolheram vestir branco para a despedida.
Para entender o motivo, o Notícia Preta conversou com o babalorixá Márcio de Jagun, autor de oito livros sobre crenças afro-brasileiras e coordenador de Diversidade Religiosa do Rio de Janeiro. Segundo ele, a escolha está ligada a uma compreensão de vida e morte diferente da visão ocidental.
“O branco, a partir da cultura Yorubá, que se reflete no candomblé de tradição Nagô, é a cor do luto. Mas, para essa cultura, o luto não é triste, não é pesaroso, não indica a finitude da vida. Pelo contrário, ele significa transição”, afirma Jagun.

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Essa transição, explica o sacerdote, ocorre em vários momentos da existência. “Transição de etapas na vida e transição de etapas pós-vida. Não por acaso, o mesmo branco é a cor de Oxalá, a divindade que rege o início e o final de todos os ciclos”, completa.
Por essa razão, o branco também é usado em ritos de passagem dentro do candomblé, como no início da vida religiosa. “Quando iniciamos a nossa trajetória espiritual no candomblé, nosso traje é branco. Da mesma forma, nas cerimônias fúnebres também usamos branco, exatamente para refletir a transição de uma nova etapa”, explica.

O ritual funerário do candomblé é chamado de axexê e, nele, o branco simboliza a continuidade. “O branco é a cor da transição de etapas”, reforça Jagun.
Assim, a cor escolhida para o velório de Preta Gil não foi apenas uma questão estética. Representa uma visão espiritual na qual a morte não é um fim, mas uma passagem para outro ciclo.