“Minha escola, minha faculdade e meu pós-doutorado” diz William Reis sobre sua trajetória no AfroReggae

IMG-20220818-WA0000.jpg

“O AfroReggae foi a minha escola, minha faculdade e meu pós-doutorado”, é assim que o coordenador executivo da Organização Não Governamental (ONG) AfroReggae, William Reis, define sua trajetória pela ong, fundada em 1993 com o objetivo de promover justiça social através da cultura afro-brasileira e educação. 

William é o coordenado executivo da ONG – Foto: Acervo Pessoal

Filho de mãe nordestina, pai capixaba e criado no Complexo do Alemão, William é formado em educação física e se dedica a vários projetos, sempre levando a questão racial contigo. Para começar a falar um pouquinho sobre sua atuação com a temática, é preciso voltar em 2009, momento em que sua história com o AfroReggae começa, após conhecer o fundador, José Júnior, em uma academia onde estagiava. Seu contrato acabou e ele foi convidado para trabalhar como assistente de coordenação de esportes da ong. 

Ao entrar, foi conhecendo outras áreas, criou um núcleo dentro do AfroReggae para trabalhar especificamente com a questão racial e, em 2017, entrou para a coordenadoria executiva, liderando ações de empregabilidade para egressos do sistema prisional, oficinas culturais na favela de Vigário de Geral e na criação do primeiro centro de E-sports numa favela do mundo, o AfroGames.  

Com o núcleo de palestras, auxiliou grupos artísticos e começou a palestrar sobre a temática racial, se tornando palestrante oficial do AfroReggae, rompendo, inclusive, as barreiras do Rio de Janeiro  e chegando a outros estados e países.  

Suas palestras chegaram, também, até umas 30 escolas públicas do Rio de Janeiro para educar as crianças sobre o racismo. Por ter estudado em escola pública, William decidiu montar um circuito de palestras, em 2012,  nas escolas por entender que é importante a informação chegar até estes estudantes. “Falar sobre a tematica racial é de extrema importância, ainda mais quando voce lida com a maioria de crianças e jovens negros de favela, onde não chega essa informação completa. Eles nem sabem o que é isso, em grande maioria. A gente que é consciente racial no país é uma bolha, a grande massa que está dentro das favelas ainda não está se conscientizando sobre porque não chega informação. Quis começar pelas escolas para que as crianças não passassem pelo o que eu e meus amigos passaram”, declarou. 

Assim como ele busca fazer com as crianças para quem palestra, William conta que já precisaram mostrar a ele algumas questões sobre o racismo. A sua trajetória com a questão racial foi sinuosa. Cria de favela, com muitos familiares e amigos brancos, ele precisou correr atrás da informação para poder entender melhor sobre a temática. 

Sobre este processo de politização racial tardia- como acontece com muitos negros no país -, William credita seus agradecimentos principalmente para o fundador do AfroReggae. “Eu ri de uma piada racista que fizeram comigo e ele mandou eu estudar sobre isso”

E foi nas páginas de duas biografias, a de Malcom-X e Martin Luther King, que ele entendeu melhor a vivência dos negros em uma sociedade racista. “O que me fez renascer foi a biografia do Malcom-X. Você lê e vê que por muito tempo você é enganado e entende que as coisas não acontecem ao seu redor porque você é negro”, comentou. 

Embora William acredite que “tudo na sua vida é militância” e tenha a questão racial muito presente em seus projetos, ele entende e reforça que não é feito só disso. Ele também pode ser definido como um bom apreciador de samba, daquela resenha com os amigos, de assistir um filminho e de mergulhar nas páginas de biografias que tanto ama ler. 

Aliás, por entender bem que um negro não deve ser conhecido apenas pela questão racial, quando foi convidado para ser colunista na Veja Rio fez um pedido: não escrever somente sobre a temática racial. 

“As pessoas ficam muito neste lugar, sendo que esquecem que tem caras negros que são bons em direito, que são incríveis na medicina, em arquitetura… A gente tem que falar sobre outras coisas também”, afirmou. 

Dentre um de seus trabalhos como colunista, já produziu textos que envolvem a temática de Covid-19 e movimentos sociais. Mas quando comenta sobre esse projeto seu, se diz feliz por sua série de matérias sobre como surgiram as favelas no Rio de Janeiro serem referência para estudos. Seu objetivo com essa série é “falar das favelas, mas não só sobre violência”.  

Ainda na literatura, William contou a sua trajetória no livro “Pretagonismos”, que reúne histórias de personalidades pretas que  narram suas trajetórias. 

O AfroGames é o primeiro Hub de games dentro de uma favela no mundo – Foto: Arquivo Pessoal

Para os próximos meses, pode-se esperar mais algumas movimentações do coordenador executivo do AfroReggae. Alguns projetos citados por ele envolvem a expansão do AfroGames para Niterói, criação do AfroKids e de um dos melhores estúdios de música do Brasil para artistas pretos de periferia lançarem suas músicas, colocarem em plataformas digitais e terem uma assessoria de plano de carreira. O estúdio será feito através de parceria que o AfroReggae fechou com com a Universal Music e Virgin Music. 

Primeiro E-Sports em favelas do mundo

Dentre as suas realizações enquanto participante ativo do AfroReggae, William foi um dos idealizadores do primeiro centro de E-Sports em favelas no Brasil. A ideia surgiu depois que foi convidado a integrar o mundo dos games e perceber a falta de negros neste espaço. Mas, para muito além de ser um centro de E-Sports, o AfroGames profissionaliza os jovens oferecendo aulas de inglês, programação e criação de trilha sonora. 

Leia também: “A missão é honrar nossos ancestrais”, diz a primeira mulher a assumir a gestão do Museu da Cultura Afro-Brasileira

“O AfroGames é o encontro do empresário com o social. Ele tem a visão de colocar um dos mercados que mais crescem no mundo dentro das favelas. A gente percebeu que o projeto cresceu muito além disso, e no caso estávamos trazendo uma cidadania digital para estes jovens que não tinham e-mail, nenhuma plataforma digital. Estávamos combatendo, também, a desnutrição digital que assolava estes jovens”, comentou. 

Atualmente, o projeto está em três comunidades do Rio, conectando jovens do Vigário Geral, Nova Holanda e Morro do Timbau. Até o final do ano, é esperado atender cerca de 500 jovens a partir de 12 anos. Outro diferencial do AfroGames é que ele possui um time para campeonatos com os melhores alunos, que recebem salários e acompanhamento psicológico. Além disso, os participantes já criaram dois aplicativos sobre a temática racial que podem ser baixados pela população. 

Laura Abreu

Laura Abreu

Laura Abreu é jornalista recém-formada pela universidade pública e, atualmente, trabalha como redatora. Durante a graduação e início da carreira, passou por veículo de comunicação regional e se envolveu com projetos de comunicação voluntários.

0 Replies to ““Minha escola, minha faculdade e meu pós-doutorado” diz William Reis sobre sua trajetória no AfroReggae”

Deixe uma resposta

scroll to top