UECE elimina estudante de vestibular após considerar que ele não é pardo para cota: ‘não entendo os critérios’

whatsapp-image-2021-09-08-at-14.44.15.jpeg

Sâmulo sempre se apresentou como pardo, inclusive já tendo cursado uma universidade nesta condição. — Foto: Arquivo pessoal

O estudante Sâmulo Mendonça, de 27 anos, prestou o vestibular 2021.1 para medicina da Universidade Estadual do Ceará (Uece), passando em quinto lugar nas vagas destinadas para cotas de pardos. A Comissão de Heteroidentificação da Instituição, entretanto considerou que Sâmulo não é pardo. O jovem, já tinha entrado como cotista por este critério em engenharia elétrica, na Universidade Federal do Ceará (UFC).

Mesmo após recurso apresentado à comissão, o jovem foi considerado como não cotista no último dia 3 de setembro e, por isso, eliminado do vestibular.

“É muita injustiça, muita mesmo. Só olhando pra mim, é obvio que você me considera uma pessoa parda. Não entendo os critérios que eles utilizaram, porque lá diz que o critério é o fenótipo”

afirmou o estudante.

Para a eliminação do estudante colegiado, formado por dois professores da Uece e um membro externo da Universidade, considerou características fenotípicas. O fenótipo é um conjunto de características visíveis do genótipo de um ser humano. O genótipo é o conjunto de genes que identifica, por exemplo, se determinada pessoa é preta ou parda.

Leia também: Eliminado por fraudes nas cotas, candidato branco ganha causa e é nomeado diplomata numa vaga para negros

O edital do certame determina que sejam analisados como características fenotípicas: cor da pele, textura do cabelo e formato do rosto, sobretudo do nariz e dos lábios.

Segundo o edital, essas características, “combinadas ou não, permitirão validar ou invalidar a condição étnico-racial afirmada pelo candidato autodeclarado negro”. A comissão afirmou que Sâmulo não tem cor da pele correspondente, nem textura dos cabelos e nem fisionomia de uma pessoa parda.

Em nota, a Uece disse que não tem “conhecimento de qualquer reprovação injusta” e que “todas as solicitações recursais foram atendidas e os candidatos recorrentes reavaliados por nova comissão de heteroidentificação”. 

Sâmulo sempre se apresentou como pardo, inclusive já tendo cursado uma universidade nesta condição. — Foto: Arquivo pessoal

Leia a nota pública sobre a Comissão de Heteroidentificação da Uece:

A Universidade Estadual do Ceará (UECE) visa, em primeiro lugar, garantir que grupos historicamente discriminados e com pouco acesso ao ensino superior ampliem o seu ingresso no ensino público, gratuito e de qualidade, tomando como princípio o entendimento já exarado pelo Supremo Tribunal Federal via análise fenotípica (mesma análise considerada na Resolução Nº 1657/CONSU). E, em segundo lugar, a instalação das comissões de heteroidentificação na UECE busca coibir eventuais fraudes no ingresso de estudantes nos cursos de graduação por meio de cotas raciais. Todo esse processo é regulado pela Resolução Nº 1657/CONSU, de 1º de abril de 2021.

Assim, conforme se depreende da normativa mencionada todos os candidatos não só ao vestibular, mas a qualquer seleção ou concurso onde sejam ofertadas vagas para cotas étnico-raciais deverão passar pelas comissões de heteroidentificação constituídas para esse fim, conforme Portaria Normativa 04/2018 do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão/Secretaria de Gestão de Pessoas – MPOG.

Essas comissões são constituídas por pessoas capacitadas de acordo com artigo Art. 6º “O procedimento de heteroidentificação será realizado por comissão criada especificamente para este fim.”

Em seu § 1º A comissão de heteroidentificação será constituída por cidadãos: III ‐ que tenham participado de oficina sobre a temática da promoção da igualdade racial e do enfrentamento ao racismo com base em conteúdo disponibilizado pelo órgão responsável pela promoção da igualdade étnica previsto no § 1º do art. 49 da Lei n° 12.288, de 20 de julho de 2010; e IV ‐ preferencialmente experientes na temática da promoção da igualdade racial e do enfrentamento ao racismo” da referida Portaria Normativa.

O artigo 9º informa que a Comissão de Heteroidentificação da UECE, nos processos de verificação e de validação de que trata esta Resolução, considerará:

I. o teor da autodeclaração assinada e entregue pelo candidato por ocasião de sua inscrição;
II. a análise de documentos complementares solicitados pela CHET/UECE;
III. as características fenotípicas do candidato, observadas durante procedimentos conduzidos e registrados pela Comissão de Heteroidentificação.

1º. O critério de ancestralidade/ascendência não será considerado em nenhuma das situações expressas nos incisos I, II e III deste artigo.

A comissão avaliadora foi composta por 3 integrantes, sendo 2 docentes da UECE e 1 representante da comunidade externa vinculados a outras instituições de ensino superior e/ou a organizações sociais. Todos os membros avaliadores participaram de treinamento, além de já serem estudiosos da área.

Por fim, todos os candidatos submetidos à Comissão que tiveram classificação como “Não cotista” tiveram prazo para interposição de recurso, possibilitando a esses candidatos uma nova avaliação. Não temos conhecimento de qualquer reprovação injusta. No caso específico do concurso vestibular 2021.1, todas as solicitações recursais foram atendidas e os candidatos recorrentes reavaliados por nova comissão de heteroidentificação.

Fonte: G1

Deixe uma resposta

scroll to top