A prisão temporária de Davi de Oliveira Fernandes, 37 anos, e Valdir Bispo dos Santos, 49 anos, seguranças que chicotearam um jovem negro dentro do supermercado Ricoy, na zona sul de São Paulo, foi decretada nesta quarta-feira (04), pela juíza Tatiana Saes Valverde Ormeleze. Os torturadores foram identificados pela Polícia Civil a partir de depoimentos da própria vítima, do gerente do estabelecimento e outras testemunhas. A magistrada também autorizou buscas e apreensões contra os investigados pelo crime de tortura.
Valdir e Davi são funcionários de uma empresa privada de segurança que prestava serviços para o estabelecimento, e agrediram o garoto de 17 anos com um chicote, nas dependências do supermercado. O menino é acusado de ter furtado uma barra de chocolate.
A juíza ressalta que “há fortes elementos ligando os representados à autoria do crime de tortura, tanto que foram divulgadas gravações do ofendido sendo açoitado pelos seguranças”. “Ademais, o relato da vítima é detalhado em apontar como ocorreram as agressões”.
E continua: “Evidencia-se, ainda, a imprescindibilidade da segregação para o sucesso da persecução penal, garantindo a serenidade e efetividade da atuação policial: há necessidade da custódia para fins de proceder ao reconhecimento pessoal, viabilizar a identificação e individualização da conduta de todos os coatores, intentar obter informações para a localização da arma utilizada e do aparelho celular utilizado para a gravação da conduta delituosa, isso sem prejuízo dos demais atos de polícia judiciária”.
O delegado Pedro Luis de Souza, titular do 80º Distrito Policial de São Paulo, também pediu na tarde desta quarta-feira a prisão temporária dos seguranças torturadores. O delegado solicitou que seja realizada busca e apreensão no supermercado, para buscar acesso a imagens de câmeras do sistema de segurança do estabelecimento.
A tortura é crime hediondo no Brasil, com penas que variam de 2 a 8 anos de prisão. “Os seguranças usaram violência desmedida contra o garoto. Este evento me remeteu à época da escravatura, quando negros eram açoitados em praça pública” disse o delegado responsável pela investigação do caso, que também é negro.
Chocante é o apoio à tortura de quem furta chocolate”
advogado Ariel de Castro Alves
Para o advogado Ariel de Castro Alves, conselheiro do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos) que acompanha o caso, a reação de parte dos brasileiros é espantosa.
“O mais chocante é o apoio de parte da sociedade brasileira à tortura de quem furta um chocolate. Uma boa parte da sociedade. Em comentários e mensagens que recebemos, várias pessoas dizem que foi pouco. Acham que quem comete um furto, mesmo que famélico (furto para saciar necessidade urgente, como matar a fome), merece chicotadas. Merece pena de morte. E acham que quem fez isso merece ser homenageado, e não punido”, avalia.
Em nota, o supermercado Ricoy admite ter havido tortura em seu estabelecimento, diz que os funcionários terceirizados foram afastados e afirma que presta suporte ao jovem. “Ficamos chocados com o conteúdo de uma tortura gratuita e sem sentido em cima do adolescente vítima”, diz a nota. “O Ricoy já disponibilizou uma assistente social para conversar com a vítima e a família. Daremos todo o suporte que for necessário.”