Cantora e compositora desmonta estereótipos da “mulher forte” e defende um caminho próprio de bem-viver, em entrevista ao Notícia Preta
Para Luedji Luna, a voz que navega entre a ancestralidade africana e a contemporaneidade da MPB, o sucesso não se mede pela métrica alheia. Nascida em Salvador e que carrega no nome a força dos orixás (Luedji, de Inhansã, e Luna, de Oxum), reflete sobre as armadilhas dos ideais de produtividade e a importância de honrar a própria humanidade em entrevista exclusiva ao Notícia Preta e à Revista Marie Claire.
“Muitas pessoas me colocam nesse lugar de diva, de deusa, só que Deus não morre, Deus não adoece, entende? A humana sim”, pontuou, desconstruindo a imagem sobre-humana e inatingível frequentemente atribuída a artistas negras bem-sucedidas.
Esta fala sintetiza o cerne do pensamento de Luna, que vai além da música e adentra uma crítica social profunda. Com dois álbuns aclamados: “Um Corpo no Mundo” (2017) e “Bom Mesmo é Estar Debaixo D’Água” (2021), ela conquistou projeção nacional e internacional com letras que falam de afeto, diáspora, racismo e cura. Seu trabalho é um farol para a cultura preta brasileira, mas a trajetória é marcada por uma consciência aguda dos perigos de internalizar as demandas de um sistema opressor.
“Desde sempre, somos ensinados a agir como máquinas. E essa figura que a gente cria da mulher empoderada, poderosa, profissional, muitas vezes entra em uma lógica capitalista e adoecedora, que nos faz negligenciar valores como a família e a própria vulnerabilidade”, analisa.
A cantora aponta como o conceito de “empoderamento” pode ser cooptado por uma narrativa neoliberal, que sobrecarrega ainda mais as mulheres, em especial as mulheres negras, historicamente vistas como hiperssuficientes e resistentes a qualquer custo.

É contra essa régua imposta, que ignora as especificidades e as dores do corpo negro, que Luedji ergue sua filosofia pessoal e artística. “Mas nossa régua nunca pode ser a mesma da branquitude”, sentencia, com a clareza de quem encontrou um eixo interior. “Estou bem, tenho uma carreira frutífera e, mesmo no meu tempo, só avanço, cada dia coloco mais um bloco no meu castelo.”
Aqui, o “tempo” de Luedji não é o tempo acelerado do mercado e das redes sociais. É um tempo orgânico, de processo, de escuta do corpo e da comunidade. É o tempo necessário para construir algo sólido e verdadeiro, um “castelo” simbólico que a abrigue em sua totalidade, artista, mulher, negra, humana.
Sua fala é um antídoto contra a autoexploração e um convite para que pessoas negras, especialmente as mulheres, redefinam suas próprias medidas de felicidade e realização, longe dos padrões de desempenho herdados de uma branquitude que nunca levou em conta suas vidas.
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