A vida de Vítor Santiago mudou completamente há oito anos, quando foi baleado por um militar do Exército dentro do complexo de favelas da Maré, zona Norte do Rio de Janeiro. Depois de tomar dois tiros, o morador ficou paraplégico e teve uma perna amputada. Após 98 dias internado, Vítor conseguiu na Justiça o direito de ser indenizado pelo estado, mas ainda não recebeu o dinheiro.
Atualmente ele recebe uma aposentadoria do INSS por invalidez, e como forma de assistência, ele tem sido atendido no Hospital Central do Exército e recebe alguns insumos, como gazes, luvas e sondas. Mas as cadeiras de roda que ele teve, que não o atendiam, chegaram a partir de doações, e para ter uma mais adequada teve que pagar R$ 7 mil para comprá-la. Vítor a usa até hoje, mas ela precisa ser trocada.
Para ele, a lembrança do dia em que sua vida mudou ainda é bastante vívida. “De repente eu voltei para casa com uma perna a menos, com uma lesão medular, voltei tendo que aprender a fazer tudo de novo, voltei usando fraldas, voltei um bebê”, disse ao G1. A mãe dele, Irene Santiago, se reveza entre o apoio nas tarefas diárias e na luta por justiça pelo filho.
“A gente tinha uma vida estável, né? Pra quem mora na comunidade, todo mundo trabalhava, e eu tive que largar tudo pra cuidar dele e buscar a justiça por ele”, também explica ela ao G1.
Durante os 98 dias que ficou internado, Vítor foi intubado, recebeu transfusões de sangue, fez hemodiálise, cirurgias e fisioterapia. Os custos com remédios e transporte para as consultas chegam a R$300 por mês, ou até mais. Por isso ele destaca a importância da indenização.
“Eu deixei uma profissão pra trás. Eu toco cavaquinho, eu sou músico desde os 13 anos, parei de fazer isso. Hoje, assim, eu não posso sair a hora que eu quero, voltar a hora que eu quero, eu perdi um pouco da minha privacidade, eu sempre tenho que ter alguém pra me ajudar em alguma coisa. E é isso, falta essa reparação, uma indenização”, diz Vítor.
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Entenda o caso
O morador da Maré levou dois tiros – um na perna e outro na coluna – durante uma operação realizada na comunidade, em fevereiro de 2015. Vítor estava no carro com outros quatro amigos, quando os militares do Exército alvejaram o carro, afirmando que ele teria furado o bloqueio. Mas segundo Vítor, não havia bloqueio nenhum.
“O cara que tava dirigindo, ele ia deixar cada um no seu ponto, porque era caminho da casa dele. Cerca de 15 minutos depois, dentro da comunidade, em outro ponto, a gente foi alvejado por soldados. Não tinha cone, não tinha jipe, não tinha pit-stop, não tinha absolutamente nada”, afirmou na época.
A Justiça Militar absolveu o cabo Diego Neitzke, em 2020, após ele dizer em depoimento que mirou “sempre nos pneus, jamais nos ocupantes do veículo”, mesmo que os tiros tenham atingido a parte superior do carro. Já a indenização foi determinada há cinco anos pela 5ª Vara Federal do Rio, mas o caso ainda tá sendo julgado em segunda instância.
O Comando Militar do Leste informou, em nota, que não comenta decisões da Justiça, e que foi prestado apoio médico, psicológico e de assistência social ao Vítor. Já o Governo do Estado informou que não é parte do processo.
