O escritor Renato Cafuzo lança, no próximo dia 11 de março, o livro infantil “Moleque Piranha”, na Biblioteca o complexo de favelas da Maré. Além disso, também será lançado na Biblioteca Comunitária Maria Lina, em Nova Iguaçu, no dia 16, e dia 22, na Biblioteca Parque, no Centro.
Desenhista desde criança, o autor nos lembra como a arte pode ajudar a (re)escrever memórias. Em uma narrativa onde todos os personagens são negros – e apenas dois são adultos – grande parte da história se passa na escola. Revisitando sua própria trajetória, Cafuzo traz nos versos a potência das infâncias negras e a importância da educação como forma de criar outras possibilidades de futuro.
Enxergando cada criança como um mundo em expansão, o autor nos mostra como ser parte e ser visto por uma comunidade, expande as nossas possibilidades de ser e existir com humanidade.
“Não acho que seja fantasioso contar uma história bonita na favela, mas quando faço é na esperança que tenhamos mais dias assim. E demonstrar que isso é possível pras nossas crianças é importante! Alguns traços do racismo partem basicamente do que você pode ou não pode fazer. E isso, numa fase de desenvolvimento como a infância, se traduz em como você pode ou não pode se desenvolver”, reforça o autor.
O livro ainda irá compor o acervo de 20 bibliotecas comunitárias da Baixada Fluminense, e de mais de 50 escolas no Complexo da Maré. Além disso, como forma de ampliar a acessibilidade e a experiência do público com a obra, uma versão gratuita em audiolivro, com audiodescrição, também será lançada no dia 11 de março, e ficará disponível no canal do autor no Youtube.
A narração será feita pelo artista circense Vicente Barbosa, de 6 anos. Ele faz parte da terceira geração de palhaços de sua família, e integra a Chirulico, companhia de Palhaçaria e Arte Pública criada por seus pais, Anthony Brito e Aline Barbosa. A partir desta mesma data, o livro poderá ser adquirido no site da editora Oriki.
Quem é o “Moleque Piranha”?
“Uma expressão da rua para a própria rua”, é como o autor define o “moleque piranha”, personagem que dá nome à narrativa.
O desenho teve como influência os cartoons, e à medida que a relação do autor com a cidade ia mudando, o “moleque piranha” também se adaptava em suas diferentes expressões. Foi no trajeto da Zona Oeste à Zona Sul do Rio de Janeiro, há quase uma década, que a caminho do trabalho, Renato, que à época tinha acabado de se tornar pai, aproveitava o percurso para se expressar pela cidade adesivando o desenho pelas ruas.
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Consciente ou inconscientemente, a figura dá forma a uma lembrança da infância do autor, que começou a desenhar por influência do pai que trabalhava em uma gráfica. Entre os brinquedos favoritos, blocos de papel estavam no topo da lista. Era o que o seu pai mais levava pra casa.
“Lembro dele com um bloco desenhando um toco de árvore e no toco desenhava um rosto. Esperou até ver minha cara confusa com o desenho e soltou: ‘esse é o cara-de-pau’. É impressionante notar a similaridade da construção dessa piada com a do personagem que eu colo por aí hoje em dia”, relembra Renato, que hoje continua utilizando o desenho como intervenção artística em diferentes espaços urbanos através da colagem de adesivos.
Então, se você mora no Rio, possivelmente já viu o “moleque piranha” por aí, que inclusive também circula pelas ruas fora do Brasil. A arte ganhou um contexto coletivo quando amigos do autor a fizeram circular por diferentes lugares, nos lembrando como as ruas podem expressar e guardar memórias e seus diferentes significados.
Homenagens
Duas grandes homenagens compõem a narrativa. Uma para o amigo de adolescência do autor, o cineasta Cadu Barcellos, e outra para a vereadora Marielle Franco. Assim como Renato, ambos são crias do Complexo da Maré, e marcam a história do conjunto de favelas com uma trajetória de luta contra o racismo, dando voz às narrativas que definem as periferias como um lugar onde os sonhos são possíveis.
Três dias após a primeira data de lançamento do livro, completa meia década do assassinato de Marielle Franco. E uma pergunta segue atual: “quem mandou matar Marielle?”. Como “cria não morre, vira lenda”, Cadu e Marielle, na história, Carlinhos e Tia Mari, ficam eternizados na memória através dos traços e narrativas de Renato Cafuzo.