Nas últimas semanas, a procura pela Defensoria Pública em casos de pensão alimentícia aumentaram pelo país, impulsionado por uma cena da novela Vale Tudo da TV Globo, que fez acender uma discussão sobre a vulnerabilidade das mães solo no Brasil, em sua maioria mulheres negras. Segundo um estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), entre as 11 milhões de mães solo no país, 7 milhões são negras.
De acordo com a Defensoria do Rio de Janeiro, houve um crescimento de 300% em relação à média habitual de acessos por minuto no aplicativo após a novela. Já a Defensoria Pública de São Paulo registrou um crescimento de 50% no número de pedidos de pensão alimentícia na última semana, após a exibição da novela no último dia 13. Na trama, Lucimar, uma empregada doméstica interpretada pela atriz Ingrid Gaigher, contou com a ajuda de uma estudante de Direito vivida por Jéssica Marques, e entrou com pedido de pensão alimentícia no aplicativo da Defensoria Pública.

Segundo a pesquisa da FGV de 2023, enquanto o número de mulheres negras que cuidam dos filhos sozinhas cresceu na última década, a situação para mães brancas e amarelas permaneceu relativamente estável no mesmo período.
A pesquisa, que conta com dados disponibilizados pelo último Censo do IBGE, mostra que, entre os anos de 2012 e 2022, o número de domicílios com mães solo cresceu 17,8%, passando de 9,6 milhões para 11,3 milhões. Esses dados revelam que, ocorreu um incremento de 1,7 milhão de mães solo em dez anos, entre elas, 1,5 milhão de mães negras.
De impacto real e significativo na sociedade brasileira, o debate da ficção traz a tona o questionamento: Quem são as mulheres que mais precisam recorrer a justiça para dividir a responsabilidade financeira da criação de seus filhos?
Além de ser a maioria entre as mães solo, os dados revelados pela FGV também apontam que é a mãe solo negra a que mais enfrenta desigualdade de renda e exclusão no mercado de trabalho brasileiro, fatores que a torna o perfil mais vulnerável economicamente e com maior dificuldade de superação de pobreza.
A pesquisa mostra que, no quarto trimestre de 2022, o rendimento mensal de uma mãe solo foi de R$ 2.105,00, valor consideravelmente desigual se comparado ao de homens casados com filhos (R$ 3.438,00, 39% menor) ou de uma mulher casada com filhos (R$ 2.626,00, 20% menor). Porém, dentro do próprio grupo de mães solos, a situação de mães negras é ainda mais preocupante. O rendimento de mulheres negras que cuidam sozinhas de seus filhos foi de R$ 1.685,00, 39,2% a menos que outras mães na mesma condição de maternidade.
Segundo a economista e autora da pesquisa Janaina Feijó, a situação se explica pelo nível de escolaridade e pela idade que mulheres negras têm seus filhos. De acordo com a pesquisa, somente 9% das mães solos negras possuem ensino superior. “As mães negras tendem a ter filhos mais cedo, e isso retroalimenta a situação desfavorável no mercado de trabalho. Consequentemente, vai repercutir no nível salarial”, afirma Feijó.
É importante reforçar que a pensão alimentícia é um direito da criança, regulamentada pelo Código Civil e garantido para assegurar bem-estar, vestuário, alimentação, moradia, saúde, educação e lazer do menor.
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