O Brasil entrou de cabeça no estágio de elogio da ignorância e o fazer artístico é um dos principais alvos dos novos donos do poder. Entender que não apenas as mãos controlando a caneta oficial constroem narrativas é fundamental para mantermos nossa pluralidade respirando.
Inicialmente, é fundamental entender: se a correlação de forças mudou, o modo de jogar também. Produtores, criadores e fazedores sabem que há público, mas não conseguem se comunicar com ele. Por outro lado, as verbas para viabilizar produtos até existem, mas rareiam e são direcionadas a conteúdos cada vez mais simplórios.
Parece ser imperativo mudar o paradigma: a audiência, por uma série de questões, não está indo ouvir o que se quer dizer para além das cortinas de fumaça; logo, é preciso descer do palco e ir atrás das pessoas. “Se Maomé não vai até a montanha, a montanha vai a Maomé”; ou, talvez: “todo artista tem de ir aonde o povo está”.
Há um discurso político-moral de desvalorização da arte como um bem nacional. Ele ganhou o último processo eleitoral em suas diversas instâncias. Reconectar o povo com sua identidade é missão e necessidade. Para tal, faz-se dever de casa descer das Torres de
Marfins e entender culpas, omissões e preconceitos que a classe ajudou a fomentar.
Cultivar o próprio umbigo é prazeroso, mas o espelho – mesmo em contos de fada – nunca será janela. Que tal ouvir antes de dialogar? Ou apreender ao invés de levar o roteiro pronto? Quem sabe encenar comunitariamente se sobreponha a pensar na política de preço de ingressos? Ou ainda o assunto seja mais prioritário que a forma?
Exibições em praças, em barracos, em avenidas, em casas, em transportes públicos, no mundo virtual, nas redes sociais… Repensar modelos… Ser menos estrela e mais real. Assim como o custo e a distância, a opressão arquitetônica e a roupa a se usar não podem ser empecilho para se chegar ao espetáculo. Se antes eram detalhes, hoje são pontos que fazem a diferença.
A riqueza estética está em atingir e fazer pensar. Todo cânone se tornou um por ir ao particular e falar sobre questões universais. Shakespeare fala tanto para Altamira, quanto para Lagarto, ou para Dourados, ou ainda Porto Alegre e também para o Cesarão.
Que nos reencontremos com o Brasil que podemos ser nas caravanas Rolidei que ainda há de pintar por aí.