Quinze novos alunos pretos ou pardos poderão entrar na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) para o curso de medicina, a partir de uma determinação judicial. A medida é resultado de recomendação do Ministério Público Federal e da conclusão, em processo administrativo, de que 15 alunos ocuparam indevidamente vagas destinadas a pretos e pardos. As vagas serão específicas e temporárias.
O caso começou em 2018, quando a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão enviou recomendação às quatro universidades públicas do Rio de Janeiro, para que adotassem mecanismos de controle dos requisitos para a entrada no ensino superior por meio das cotas raciais, com adoção prioritária do critério do fenótipo, ou seja, da aparência. Após isso, a Unirio criou os mecanismos de verificação da legalidade dos pedidos de cotas necessários, sendo então constatadas irregularidades: a universidade descobriu que 15 alunos não se encaixavam nos critérios e que ocupavam as vagas indevidamente.
Segundo o procurador da República Julio José Araujo Junior é necessário buscar medidas de reparação, tanto da universidade quanto dos alunos que foram beneficiados indevidamente. “O Ministério Público analisa várias frentes, várias formas de reparação e eventual cancelamento de matrícula daqueles que ingressaram indevidamente”, afirma. “Em relação à universidade cobrou que ela efetivamente destinasse essas vagas novamente a pessoas negras, e foi o que aconteceu”.
Em nota, a Unirio ressaltou que assim que foram verificadas as ocupações indevidas, decidiu-se por vagas específicas e temporárias, como resgate histórico aos cotistas pretos ou pardos, com renda per capita igual ou inferior a 1,5 salário mínimo.
Casos como esse não estão isolados. No ano passado, por exemplo, o Ministério Público Federal também conseguiu decisão judicial que condenava nove pessoas acusadas de fraudar o sistema de cotas da Universidade Federal do Cariri, em Juazeiro do Norte, Ceará. Com a sentença, foram anuladas as matrículas de três estudantes que ingressaram também no curso de medicina.
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O historiador e professor de história do Instituto Federal do Paraná Jorge Santana explica como deve ser realizado o processo de seleção de estudantes para cotas raciais
“O exame de cotas é realizado em duas modalidades. Uma é a comissão de heteroidentificação. É essa comissão que afere se a pessoa tem as características, os traços negros, que deve ser uma comissão que tenha a participação de pessoas negras, de pessoas que estão envolvidas cotidianamente no debate racial, como também aferição se a pessoa está dentro dos critérios econômicos”.
Ele também destaca que, em relação aos inúmeros casos de fraude, falta uma atitude mais social por parte dos estudantes.
“Falta consciência, mas também têm muito nessas pessoas que fraudam um apego a sua individualidade e aos seus objetivos, ignorando uma política pública social como são as cotas raciais”.
As novas vagas para cotas raciais na Unirio serão disponibilizadas pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) durante três semestres consecutivos, sendo cinco vagas a cada semestre.
Tal como nesse caso da Unirio, se fosse feita uma busca minuciosa em outras universidades do país, certamente muitos outros casos de fraude do sistema de cotas seriam descobertos. Algumas universidades não têm nem mesmo comissão para avaliar e selecionar estudantes negros com direito a cotas.
Na maioria das vezes, o fraudador apenas apresenta um termo em que se autodeclara negro ou pardo, e a universidade, com base nesse termo, concede-lhe a vaga sem verificar com os devidos métodos e técnicas mais rigorosas se a pessoa realmente é negra ou parda, prejudicando assim aqueles que realmente têm direito ao benefício das cotas raciais.