Alicia Dudy Muller Veiga, ex-aluna da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), que havia sido condenada por desviar recursos destinados à formatura de sua turma, obteve recentemente o registro profissional para exercer a medicina. O caso reacendeu debates sobre ética na profissão médica e o direito ao esquecimento.
No início de 2023, Alicia foi acusada de desviar R$ 927 mil que seriam utilizados nas celebrações de formatura. O montante, arrecadado entre os colegas, desapareceu, e investigações apontaram que Alicia teria utilizado parte dos recursos para despesas pessoais, incluindo viagens internacionais e compras de luxo. Ela foi condenada por apropriação indébita e estelionato, cumprindo pena em regime semiaberto.
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Após cumprir sua pena, Alicia solicitou e obteve o registro no Conselho Regional de Medicina (CRM), o que lhe permite exercer a profissão legalmente.
Em nota, a defesa de Alicia afirmou que ela não deve ser submetida a “linchamento público contínuo” e reforçou a necessidade de “direito ao esquecimento”. Também destacou que a “insistência na divulgação de informações antigas” impede “a reintegração social” da médica.
Este caso ocorre em um contexto de discussões mais amplas sobre representatividade racial na medicina brasileira. Dados recentes indicam que, apesar das políticas afirmativas, a presença de estudantes pretos nos cursos de medicina ainda é significativamente baixa. De acordo com levantamento coordenado pelo professor Mário Scheffer, da Faculdade de Medicina da USP, apenas 3,5% dos 266 mil alunos de medicina no país se declaram pretos, enquanto 68,6% se identificam como brancos.
A situação é ainda mais discrepante nas instituições privadas, onde apenas 2,2% dos estudantes de medicina são pretos, em contraste com 73,6% de brancos. Nas instituições públicas, esses números são um pouco mais equilibrados: 7,4% de pretos e 52,2% de brancos. Esses dados evidenciam a sub-representação de pretos e pardos na medicina, refletindo desigualdades persistentes no acesso ao ensino superior de qualidade.
O caso de Alicia Dudy Muller Veiga levanta questões sobre ética profissional, reintegração social de ex-condenados e as disparidades raciais no acesso à educação médica no Brasil. Enquanto alguns defendem o direito de recomeço após o cumprimento da pena, outros argumentam que a confiança necessária na relação médico-paciente pode ser abalada por antecedentes criminais, especialmente em casos que envolvem desvios éticos significativos.