Uma figura central na construção da arte brasileira, mas desconhecida do grande público. Um clichê, ainda mais se tratando de um personagem negro. É no processo de ampliação do panteão de heróis nacionais que se encaixa o espetáculo “Benjamim – O filho da felicidade”. Nesta sexta-feira, 05/04, a apresentação será no Teatro Municipal de Santos-SP, às 19h.
“Vejo que estou no meu lugar por ser negra e contar uma história real com um elenco negro. É saber o seu lugar de pertencimento. Se nós não contarmos a história da nossa gente quem o fará”, indaga a diretora Miriam Vieira, responsável pela montagem.
Benjamin de Oliveira é considerado o primeiro palhaço negro do Brasil. Ele nasceu em 1870, em Minas Gerais, e foi ainda ator, autor, compositor, ensaiador, figurinista, malabarista e produtor, além de um dos criadores do circo-teatro brasileiro. A obra apresenta um recorte de sua história para falar sobre a afirmação da identidade negra no país.
“Foi um artista completo. O homem que levou o circo para o teatro e o teatro para o circo, fazendo tudo isso no final do século XIX e meados do XX, imagina só! Usamos uma frase no texto que define ele e nós: “Nomear é fazer existir”. É importante dar nome aos que de verdade construíram uma trajetória da arte neste país”, afirma a diretora, que comanda a companhia Cena Preta.
A obra foi concebida no projeto Manufatura de Monólogos, do SESC Santos, onde ocorreram as primeiras apresentações (em fevereiro de 2019). A equipe é composta por pretos e não pretos, contudo é destacado que o protagonismo é preto. A trupe tem marcadas passagens para Cubatão-SP e São Paulo-SP, seguindo aberta a novos convites “onde quer que o espetáculo se fizer necessário”.
“As pessoas não conhecem a sua história e ficam emocionadas. Precisamos quebrar os padrões que a nós foi impostos, barrar o círculo vicioso a que nos relegaram há séculos. Somos muito mais que meros coadjuvantes, somos e seremos protagonistas da nossas ações”, salienta Miriam Vieira.
Para contar a história de um artista multifacetado como Benjamim de Oliveira, a encenação não poderia ser trivial. Desta forma, Jair Moreira, Hugo Henrique, Kevelin Santos e Emanuella Alves atuam mesclando teatro e circo para construir o diálogo com o público. “Olha, é muito louco porque embora seja tudo artes cênicas, o time é outro. Procurei fazer de cada cena um número circense. E de cada número uma cena teatral. Deu certo”, analisa ela, que também assina a cenografia.
BATE-PAPO 4P COM MIRIAM VIEIRA
NOTÍCIA PRETA: Como a história de Benjamin de Oliveira chegou até você?
MIRIAM VIEIRA: Eu estava montando um espetáculo chamado “Geração Trianon” nos anos 1990 e estudava o teatro brasileiro. Neste contexto, o nome dele aparecia muito fortemente. Fiquei com este projeto anos na cabeça e ano passado surgiu a oportunidade de montagem. Tudo que sabemos é baseado em pesquisas, embora tenha livro que conte a história dele, temos também que aproximá-lo o máximo possível da realidade de hoje. É enriquecedor demais.
NOTÍCIA PRETA: É uma preocupação sua abordar a temática negra em suas realizações?
MIRIAM VIEIRA: Sim, hoje mais que nunca. Dirijo a Cia. Cena Preta, que discute e encena temas relacionados a nós pretos e pretas. Há em vários estados grupos e coletivos também se organizando em torno da discussão do papel da dramaturgia e da cena negra.
NOTÍCIA PRETA: Qual o papel da arte e do teatro no combate contra o racismo e contra as desigualdades no Brasil?
MIRIAM VIEIRA: É fundamental. Temos muitos talentos em todas áreas de atividades artísticas, que hoje discutem e abortam o racismo. O racismo está diretamente ligado a desigualdade social. Temos que combater em cena e fora dela. É nosso dever.
NOTÍCIA PRETA: Como você encaixa esta obra na linha do tempo de suas produções anteriores?
MIRIAM VIEIRA: Para mim cada obra é uma obra. Mas o que me aproxima do Benjamin é a história de vida dele, é contar essa história para pretos e não pretos.
BENJAMIN – O FILHO DA ESPERANÇA
Direção: Miriam Vieira
Dramaturgia: Ronaldo Fernandes
Atuação: Jair Moreira, Hugo Henrique, Kevelin Santos e Emanuella Alves
Orientação: Nelson Baskerville
Preparação Corporal e assistente de direção: Emanuella Alves
Preparação vocal: Anderson Avelino
Desenho Técnico do Cenário: José Murilo
Cenografia: Miriam Vieira
Visagismo: Anderson de Oliveira
Figurino: Cida Ferreira e Simone Lopes
Maquiagem: Jair Moreira e Danny Pereira
Iluminação: Juliana Sousa
Trilha e pesquisa: pesquisa coletiva
Aderecista: Rodrigo Caesar e Wagner Galdino
Produção de Bonecos: Márcia Alves
Áudio e Visual: Fabiano Keller
Preparador circense: Fausto Franco
Assistentes de Produção: Danny Pereira, Lucas Magalhães, Amauri Alves e Caio Xavier
Produção Visual: Betinho Neto