Um levantamento, realizado pelo Sistema de Informação de Vigilância da Gripe (Sivep-Gripe) e compilados pelo Estadão, mostrou que 948 crianças de 0 a 9 anos morreram vítimas de Covid-19 no país desde o início da pandemia. Destas, 57% das crianças mortas eram negras (somatório de pretos e pardos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas – IBGE). O estudo mostra ainda que 21,5% das crianças que perderam a vida para a Covid-19 eram brancas e 0,9% dos óbitos foram de crianças mortas de origem asiáticas. Outro dado apontado pelo levantamento é que 16% das crianças não tiveram raça indicada.
As mortes de indígenas também chamaram atenção no estudo. Mesmo representando apenas 0,5% da população brasileira, 4,4% dos óbitos infantis por Covid-19 foram indígenas, um total de 42 vidas perdidas e a maioria em Mato Grosso e Amazonas, sendo 12 e 11 crianças mortas respectivamente.
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Para a epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Ethel Maciel, o fim do programa Mais Médicos é um dos motivos da quantidade expressiva de mortes das populações negras e indígena. “Não houve uma substituição dos profissionais. Os locais de mais difícil acesso, com população carente, enfrentaram dificuldades no atendimento médico”, afirma a epidemiologista em entrevista ao Estadão
Segundo lugar
Proporcionalmente, o Brasil fica atrás apenas do Peru em número de mortes de crianças de 0 a 9 anos por Covid-19. De acordo com os dados, a cada 1 milhão de crianças, 32 vieram a óbito, enquanto no Peru, este número chega a 41 mortes por milhão. Já a Argentina e Colômbia apresentaram 12 e 13 mostra por milhão, cada uma, respectivamente.
Se comparado à América Latina, a Europa registrou números extremamente baixos. O Reino Unido e França registraram 4 mortes de crianças de 0 a 9 anos. A Espanha foi o país europeu que mais registrou mortes de crianças pela Covid-19, com 3 óbitos a cada milhão de crianças, correspondendo a um décimo dos números brasileiros.
Para a epidemiologista Sênior da Vital Strategies, uma organização global de saúde pública, Fátima Marinho, o Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro tem estrutura para lidar melhor com a pandemia, diferente do Peru, que tem sérios problemas sanitários. “O México tem um plano popular de saúde, mas é muito restrito. Quem não paga pelo menos esse plano morre na calçada. Esses tipos de sistema de saúde são um desafio. Com exceção da Argentina, Chile e Uruguai, estávamos mais bem preparados que os outros países latinos”, afirma a epidemiologista em entrevista ao Estadão.
“O Estado brasileiro abandonou as crianças à própria sorte. Cortaram a escola e não deram outra alternativa”, finaliza Fátima Marinho, citando falta de coordenação nacional de políticas de enfrentamento à pandemia.
Ainda de acordo com o levantamento, 131 crianças perderam a vida em maio de 2020, seguido por abril deste ano, com mais 99 mortes. O estudo mostra também que os bebês de até dois anos são as maiores vítimas, totalizando 32,7% das vítimas fatais.
A análise considerou 11 países que registraram pelo menos mil mortes por milhão de habitantes e que possuem mais de 20 milhões de habitantes. Polônia e Ucrânia, que entrariam na lista, foram excluídas pela ausência de dados. O cálculo foi feito pelo Estadão com apoio de Leonardo Bastos, estatístico da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).