“Eu preciso me escutar antes de me colocar em novas relações”: especialista explica por que mais mulheres estão priorizando o autocuidado

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O Notícia Preta conversou com a psicóloga e terapeuta Letícia Alvarenga sobre um fenômeno cada vez mais comum entre as mulheres: a escolha pela solitude e o autocuidado em vez de se envolver em relacionamentos amorosos.

Nos últimos anos, o número de mulheres que decidem viver períodos mais longos sozinhas tem crescido. Essa escolha, antes vista com estranhamento, hoje é entendida por muitas como uma forma de amadurecimento e cuidado com a própria saúde emocional. O caso recente de Khloé Kardashian, que revelou estar há quatro anos sem relações sexuais desde o término com Tristan Thompson, pai de seus filhos, trouxe o tema novamente ao debate. A empresária contou que, apesar do constrangimento inicial, esse tempo tem sido fundamental para se reconectar consigo mesma, repensar prioridades e fortalecer o vínculo com os filhos.

Para Letícia Alvarenga, esse movimento é reflexo de uma sobrecarga emocional e física que atinge muitas mulheres. “Os dados do IBGE mostram que, mesmo quando trabalham fora, elas ainda realizam quase o dobro de tarefas domésticas em relação aos homens. Essa rotina exaustiva gera cansaço e faz com que muitas sintam a necessidade de se recolher para se escutar”, explica a psicóloga. Segundo ela, a solitude pode representar um espaço de reorganização e recuperação de energia. “É um movimento de responsabilidade consigo. É dizer: ‘eu preciso me escutar antes de me colocar em novas relações’.”

Psicóloga Letícia Alvarenga Foto: Arquivo Pessoal

A terapeuta também lembra que, para muitas mulheres negras, o descanso e o silêncio podem ter um significado ainda mais profundo. “Historicamente, foi esperado que elas sustentassem tudo e todos. Então o descanso não é apenas um desejo — é uma reconstrução de dignidade”, afirma.

Mas será que preferir ficar sozinha é sempre um sinal de amadurecimento? Letícia explica que depende. “Pode ser um reflexo de trauma, uma defesa ou um sinal de crescimento emocional. Quando há medo de reviver uma dor, o distanciamento funciona como proteção. Mas quando existe clareza sobre os próprios limites e leveza nas escolhas, aí estamos falando de amadurecimento”, analisa.

A psicóloga alerta, no entanto, que há um limite tênue entre solitude e isolamento. “Estar sozinha é saudável quando há conexão com o mundo, com o trabalho, com os amigos e com os próprios sentimentos. Ela se torna isolamento quando é movida por medo, desistência de si ou quando a pessoa se fecha completamente para o afeto.”

Segundo Letícia, a sociedade ainda associa a felicidade feminina à presença de um parceiro, o que torna esse movimento de autonomia um ato político. “Muitas mulheres ainda sentem culpa por escolherem estar sozinhas. A pressão social é forte, e no recorte racial isso é ainda mais profundo, porque as mulheres negras enfrentam barreiras estruturais na forma como são vistas e desejadas. Reconhecer isso é essencial para não transformar a solidão em culpa individual.”

Para ela, ficar sozinha não é abrir mão do amor, mas redefini-lo. “Amor também é descanso, autocuidado, limite e coerência. A autora bell hooks lembra que o amor começa dentro e se expande para o mundo. Quando uma mulher aprende a não se abandonar, ela passa a construir vínculos mais recíprocos e saudáveis”, conclui.

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