Quase trinta anos separam o lançamento de “They Don’t Care About Us” — traduzida como “Eles Não Se Importam Conosco”e a operação policial mais letal da história do Brasil. Ainda assim, a canção de Michael Jackson continua soando como um espelho da realidade. A faixa foi lançada em 1996, e parte de seu videoclipe foi gravado na favela Santa Marta, no Rio de Janeiro, e no Pelourinho, em Salvador, dois lugares simbólicos da resistência e da cultura negra no país.
A música nasceu da revolta de Michael diante da brutalidade policial e do racismo. Em 1991, o espancamento de Rodney King, homem negro agredido por quatro policiais brancos em Los Angeles, foi o estopim. Mesmo com as imagens registradas em vídeo, os responsáveis foram absolvidos, o que gerou uma onda de protestos nos Estados Unidos. Dois anos depois, o próprio Michael seria alvo de uma batida policial humilhante em sua casa. Na época, ele afirmou que o episódio foi marcado por preconceito racial e decidiu transformar sua indignação em arte.
O resultado foi um dos protestos mais contundentes de sua carreira.
“Eu sou vítima da brutalidade policial agora”, canta Michael, em um verso que, quase três décadas depois, poderia facilmente ecoar nos becos e vielas do Rio.
“Estou cansado de ser vítima do ódio. Você me arranca meu orgulho. Oh, pelo amor de Deus.”
Essa denúncia ganha um novo peso diante da megaoperação realizada nesta terça-feira (28) nos complexos da Penha e do Alemão. A ação, que deixou 121 mortos, entre eles quatro policiais, superou o massacre do Carandiru e se tornou a mais letal da história do país, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Na época, autoridades brasileiras tentaram impedir as gravações sob o argumento de que a produção poderia prejudicar a imagem do país. Mesmo assim, as cenas gravadas no Brasil se tornaram um dos registros mais icônicos da carreira do cantor.
Quase três décadas depois, a mensagem de “They Don’t Care About Us” permanece atual. Em um país onde operações policiais seguem resultando em dezenas de mortes, a letra de Michael Jackson continua ecoando como um grito de resistência e denúncia: eles ainda não se importam conosco.
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