Em uma decisão histórica, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) reconheceu a responsabilidade do Estado brasileiro por falhas na investigação, responsabilização e punição de atos de racismo cometidos contra duas cidadãs brasileiras, Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes, no trabalho. A decisão foi divulgada na última quinta-feira (20).
O caso tratou de episódios de discriminação racial ocorridos em 1997 e 2003, que evidenciaram a negligência das autoridades brasileiras em garantir proteção e justiça às vítimas. A sentença determinou que o Estado adote medidas reparatórias e estruturais, incluindo a criação de mecanismos eficazes para prevenir e investigar crimes motivados por discriminação racial.
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“O Tribunal determinou que os atos e omissões das autoridades judiciárias e do Ministério Público reproduziram o racismo institucional contra Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes. Isto resultou na sua revitimização e contribuiu para perpetuar os elevados índices de impunidade da discriminação racial contra a população afrodescendente, num contexto de discriminação estrutural“, diz a decisão.
Em 2007, o caso que corria na justiça teve uma ação por reparação de danos rejeitada, que fez com que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos apresentasse ambos os casos à Corte, em 2021. Mas a decisão só foi emitida em 2025.
Antes disso, em 2023, o Estado Brasileiro reconheceu pela primeira vez o caso de discriminação racial, de maneira formal perante à CIDH, afirmando que houve violação de direitos de Neusa e Gisele.
De acordo com o relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o caso destaca o contexto geral de discriminação e a falta de acesso à justiça da população negra no Brasil, especialmente das mulheres.
Convergência com ações do CNJ
As determinações da Corte IDH reforçam medidas já implementadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como a Resolução nº 496/2023, que tornou obrigatória a inclusão de conteúdos de Direitos Humanos e combate à discriminação racial nos concursos públicos para a magistratura em todas as esferas judiciais.
O CNJ também está criando protocolos para o julgamento com perspectiva interseccional de raça e gênero.
Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial
Com a Unidade de Monitoramento e Fiscalização das Decisões da Corte IDH (UMF/CNJ), responsável por acompanhar a implementação das decisões internacionais relacionadas ao Estado brasileiro, foi desenvolvido o Painel de Monitoramento das Decisões da Corte IDH e o Painel de Tutelas de Urgência do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, ferramentas que centralizam e facilitam o acompanhamento das obrigações internacionais assumidas pelo Brasil.
Esses mecanismos permitem uma fiscalização mais eficiente das medidas adotadas em cumprimento às decisões da Corte IDH, além de promoverem a transparência e o acesso à informação sobre as ações do Estado em matéria de direitos humanos.
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