Por: Jéssica Silva de Oliveira
Advogada Civilista
Quando eu vejo uma pessoa que não pertence a uma minoria, relativizando pautas sensíveis a grupos vulneráveis, taxando postulações legítimas como “mimimi”, só consigo pensar que, ou trata-se de uma pessoa que acredita ser uma espécie de cidadão de primeira classe e realmente não está disposta a abrir mão de seus privilégios, ou trata-se de uma pessoa ignorante, que não busca compreender a razão de determinados grupos estarem fadados a um contexto de desvantagens e exclusão social.
A questão é que, consciente ou não do impacto de uma fala que relativiza a violência sofrida por um indivíduo em situação de vulnerabilidade, essas pessoas têm em comum o fato de se beneficiarem de um sistema onde somente os seus pares conseguem exercer plenamente os seus direitos sociais, culturais, econômicos e políticos.
E por falar em direitos políticos, com a proximidade das eleições municipais e a recente decisão do STF que determinou a imediata aplicação da divisão proporcional do Fundo Eleitoral e do tempo de propaganda na TV e no rádio, entre candidatos negros e brancos, é possível avistar uma possibilidade de reversão da sub-representatividade da população negra na política, mesmo esta representando a maior parte da população brasileira.
Afinal, como construir uma sociedade verdadeiramente igualitária, quando, a exemplo das eleições de 2018, 75,6% dos deputados federais eleitos são brancos? Considerando que a principal função de um deputado federal é a elaboração de leis, a eleição de uma maioria esmagadora de candidatos de um grupo racial dominante revela muito sobre a dificuldade de aprovação e implementação de políticas públicas e privadas (alô, Magazine Luiza!) voltadas para a população negra.
Nesses tempos sombrios de fortalecimento do populismo autoritário, aumento da militarização da segurança pública e protagonismo de grupos conservadores, principalmente nos poderes executivo e legislativo, é preciso muita união entre os nossos e consciência sobre o poder do voto enquanto ferramenta estratégica de mudança desse cenário tenebroso.
Mas aqui vai um lembrete: voto em preto não significa necessariamente votar em qualquer candidata ou candidato só por ser uma pessoa negra. Mas, sim, votar em uma pessoa preta ou parda verdadeiramente comprometida com a luta contra as desigualdades, as políticas excludentes, a seletividade penal, o genocídio da juventude negra, dentre outros tantos fatores que colocam a população negra em situação de vulnerabilidade. Caso contrário, corremos o risco de viabilizar a manutenção de privilégios daqueles que, conscientes ou não, relativizam a nossa dor.